OPINIÃO
Bukele e Tarcísio viram 'armas' de Marçal e Nunes na segurança
Matheus Pichonelli
Colunista convidado
06/09/2024 15h42
Segurança pública é a questão que mais preocupa a população de São Paulo, de acordo com o Datafolha. Dois em cada dez eleitores citam o tema como a pauta que deveria ser prioridade do próximo ou próxima prefeita.
Isso explica a ofensiva lançada nesta semana por três dos principais candidatos à Prefeitura de São Paulo.
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Ricardo Nunes (MDB) bombardeou as redes dele com vídeos sobre câmeras de segurança e levou para a TV o governador Tarcísio de Freitas —o chefe, vale lembrar, das polícias no estado.
"Eu sei que você está preocupado com a segurança e a solução é o prefeito e o governador trabalharem juntos. Eu tenho essa afinidade com o Ricardo (Nunes). Trabalhando juntos nós vamos botar os bandidos pra fora", promete Tarcísio, quase mostrando o distintivo de xerife.
Nunes também colocou em primeiro plano o coronel da PM Ricardo Mello Araújo (PL), ex-comandante da Rota e vice em sua chapa. Ele protagonizou nesta semana um vídeo prometendo pulso firme contra o crime na cidade —a começar com invasores de casas, em uma referência a Guilherme Boulos (PSOL) —que, aliás, mal tocou no assunto.
José Luiz Datena (PSDB) contra-atacou. Com o tema da segurança no centro da agenda desde sempre, ele foi para a Avenida Paulista propor soluções para roubo de celulares na região.
Antes, o apresentador do policial "Brasil Urgente" divulgou no Instagram um vídeo em que faz papel de ventrículo de um boneco dele mesmo em versão crochê.
"Vou resolver o problema da segurança, da educação e da cultura", diz o boneco, em tom de deboche, antes do turning point mais inesperado da eleição até aqui.
É quando a câmera volta para Datena e ele diz: "Não! Eu não sou boneco de ninguém. E sou contra a polarização. Isso não leva a absolutamente nada."
Se alguém entendeu, mande respostas inbox.
Mas quem deu a cartada mais arriscada até aqui é Pablo Marçal. O candidato do PRTB deu um tempo na campanha de rua na cidade onde pretende governar e foi viajar para El Salvador, onde promete fazer um intercâmbio com o presidente do país, Nayib Bukele, na questão da segurança.
Mal pisou no país e ele já divulgou nas redes um post anunciando uma agenda oficial para "conhecer os erros e os acertos que fizeram essa nação sair de um quadro de alta criminalidade para se tornar um dos países mais seguros do mundo".
Corta a cena para um vídeo de Bukele dizendo que não se importa com o que dizem os organismos internacionais sobre as inúmeras violações de direitos em El Salvador. "Sabe o que digo a eles? Que venham proteger nosso povo."
Aplausos.
O anfitrião de Marçal é tema de uma reportagem da revista "Time" deste mês. Ele é descrito como um presidente que desde 2022 governa sob poderes de emergência que suspenderam liberdades civis importantes, incluindo o devido processo legal —expressão usada por Marçal sempre que alguém se recorda de sua condenação por roubo a banco em Goiás.
O regime de El Salvador, classificado como uma autocracia eleitoral pelo Instituto V-DEM, da Universidade de Gotemburgo (Suécia), por não respeitar liberdade de expressão nem garantir eleições justas, tem carta branca para acessar comunicação de cidadãos sem aval da Justiça e prender pessoas sem mandados desde que elas tenham mais de 12 anos. Sim, 12 anos.
O resultado é um encarceramento em massa sem precedentes: atualmente, 2% da população de El Salvador está atrás das grades. É a maior taxa de encarceramento do planeta. Para se ter uma ideia, um único centro de detenção no país tem capacidade para 40 mil pessoas.
Os números oficiais da violência do país, dentro ou fora dos presídios (alguém quer mesmo contestar e correr risco e ser preso?), dão a Bukele o selo de estrela pop da nova direita global.
Sem apoio oficial de Tarcísio ou (por enquanto) de Jair Bolsonaro, Marçal certamente usará Bukele como escudo contra os disparos sobre sua ficha corrida e também a de seus aliados, suspeitos de envolvimento com o PCC.
A começar pelo presidente do PRTB, Leonardo Avalanche, por quem coloca a mão no fogo.
Marçal e seu fiador político ainda habitam numa cidade (e um país) onde, até o trânsito em julgado de qualquer ação, podem alegar inocência, buscar direito de defesa e até presidir partido político. Por enquanto.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL