Antigos aliados, candidatos escondem Cunha em eleições municipais no RJ

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, no Rio

  • Ueslei Marcelino/Reuters

    Isolado após a cassação do mandato, Cunha não participa das campanhas eleitorais de antigos aliados em cidades do RJ

    Isolado após a cassação do mandato, Cunha não participa das campanhas eleitorais de antigos aliados em cidades do RJ

Um reflexo da queda de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) pode ser observado nas eleições municipais no Estado do Rio de Janeiro. Antigos aliados, três candidatos a prefeito pelo PMDB --Helil Cardozo (Itaboraí), Fábio Silva (Seropédica) e Waguinho (Belford Roxo)-- abdicam em suas campanhas do apoio político do ex-presidente da Câmara, cujo mandato foi cassado em 13 de setembro.

Cunha segue escondido até agora, diferentemente do que havia ocorrido em pleitos anteriores, quando esteve presente na campanha de candidatos em cidades da região metropolitana fluminense.

Segundo especialistas ouvidos pelo UOL, as acusações contra Cunha e as denúncias de corrupção resultaram em um desgaste que inviabiliza a sua participação no processo eleitoral desse ano.

"Ele não tem o que oferecer. Se ele aparecer, pode mais atrapalhar do que ajudar. A imagem dele ficou realmente muito comprometida. Agora, a melhor coisa que ele faz é ficar recluso e se fingir de morto. Não tem mais condições de eleger ninguém", afirmou Geraldo Tadeu Monteiro, cientista político do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro) e autor do livro "O Manual do Candidato às Eleições".

"Apoiá-lo ou receber o apoio dele nas eleições seria somente por uma questão de lealdade, mas com um alto custo político. Nenhum candidato quer ser tachado de apoiado pelo Cunha. Isso geraria muitas críticas no atual contexto político. Eu realmente não consigo ver nenhum canal no qual o Cunha pudesse agregar nesta eleição", opinou Michael Mohallem, ex-assessor parlamentar e pesquisador na área de ciências políticas pela FGV (Fundação Getúlio Vargas).

Cunha tinha grande apoio em Itaboraí

Em Itaboraí, em 2014, Cunha obteve sua maior votação proporcional: 17% dos 117 mil votos válidos do município. O protagonismo eleitoral do ex-deputado federal nesta cidade de 230,7 mil habitantes está associado à aliança com o prefeito e candidato a reeleição, Helil Cardozo, também do PMDB. Desde o pleito de 2012, quando Helil venceu a disputa pelo Executivo municipal, eles estreitaram os laços eleitorais e políticos. Cunha é conhecido como padrinho político de Helil.

Há dois anos, o prefeito fez campanha para Cunha, enquanto o cacique peemedebista intermediou, em Brasília, acordos e incentivos para o município. Procurado pelo UOL, Helil reafirmou a amizade e a parceria com Cunha, mas negou que ele o tenha ajudado a ganhar votos em outras campanhas. Por esse motivo, argumentou, não haveria necessidade de usar a imagem do ex-presidente da Câmara no pleito deste ano.

Divulgação
Helil Cardozo (em pé) e Cunha (à direita), em 2012
"Não há absolutamente receio algum. Eu não usei a imagem do Cunha na minha eleição passada. Em placa nenhuma. Sim, o apoiei para deputado federal e aí, de fato, teve imagem minha com ele. Mas agora eu sou o candidato. Não vejo por que ter isso agora", declarou.

"Cunha continua sendo meu amigo, como sempre foi. (...) Eu nunca vou deixar de ser amigo dele. Ele continua me ajudando até hoje, em termos de Brasília, mas nunca teve campanha vinculada a minha. Ele sempre me ajudou com relacionamento em Brasília, abrindo portas para Itaboraí."

No entanto, uma foto publicada pelo site do diretório do PMDB fluminense, em 2012, mostra que Cunha estava ao lado de Helil quando este foi oficializado como pré-candidato a prefeito.

Semanas depois, ao fim da convenção partidária, Cunha afirmou: "Não adianta querer administrar a cidade de longe, o próximo prefeito tem que ter compromisso com o povo daqui. Helil irá cuidar das pessoas, da escola, do posto de saúde, do calçamento. E isso os forasteiros não vão fazer."

Reprodução/Facebook
Helil (à dir.) e Cunha (centro) foram juntos às ruas na eleição de 2014. A imagem foi publicada no Facebook do prefeito de Itaboraí. Na legenda, o peemedebista pede: "Para que este trabalho continue com toda força, precisamos eleger nossos candidatos"

Deputados e parceiros

Fábio Silva e Waguinho são deputados estaduais pelo PMDB que já tiveram participação de Cunha em suas campanhas. Hoje, respectivamente, concorrem em dois municípios da Baixada: Seropédica e Belford Roxo. Em uma simples busca por imagens da eleição de 2014, é possível encontrar placas e peças de campanha nas quais Cunha aparece lado a lado dos dois candidatos.

A relação entre Cunha e Fábio Silva é antiga. Durante anos, o cacique peemedebista apresentou boletins diários na rádio Melodia FM, emissora evangélica do qual era sócio e que consagrou o seu bordão e, posteriormente, slogan eleitoral: "Afinal de contas, o nosso povo merece respeito".

O pai de Fábio, Francisco Silva, era o proprietário da rádio. Foi ele o responsável por inserir Cunha na política, em 1994, quando se elegeu deputado federal e levou o pupilo para trabalhar em Brasília. A primeira eleição de Cunha ocorreria quatro anos depois.

Reprodução/Facebook
Em 2014, Waguinho (centro) posou para fotos ao lado de Cunha (à dir.) e do governador do RJ, Luiz Fernando Pezão. Na ocasião, a foto foi divulgada oficialmente nas redes sociais

Waguinho, por sua vez, ajudou Cunha a conquistar votos na Baixada Fluminense, especialmente em Belford Roxo, em 2014. Em um vídeo de campanha, o parlamentar evangélico chegou a afirmar: "Minha única dobrada no Estado do Rio de Janeiro para deputado federal é o nosso querido Eduardo Cunha. (...) É um deputado compromissado com a vida, com a família e é um grande defensor do Estado do Rio".

"Tem muita força no nosso país e no Congresso nacional e vai ser o futuro presidente da Câmara. Nele eu confio, nele eu acredito."

Nas redes sociais de Cunha, há diversas publicações que indicam a proximidade e a força da aliança entre eles, em especial no calendário eleitoral.

Em 2015, na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio), Cunha foi homenageado com a mais alta comenda do Estado, a Medalha de Mérito Tiradentes, por iniciativa de três deputados. Entre eles estão justamente Fábio Silva e Waguinho --o terceiro autor da proposta foi Domingos Brazão, também do PMDB.

O PSOL, com cinco dos 70 integrantes da Casa, foi o único dos 22 partidos com representantes na assembleia que se opôs à entrega da honraria.

Reprodução/Facebook
Ex-presidente da Câmara prestigiou o aliado Fábio Silva (à esq.) no lançamento da campanha dele para reeleição na Alerj, há 2 anos. Imagem foi publicada no Facebook de Cunha

O UOL tentou entrar em contato por diversas vezes com Fábio Silva e Waguinho. Em relação ao primeiro, a reportagem chegou a conversar com um de seus assessores sobre a possibilidade de uma entrevista, por telefone e troca de mensagens via WhatsApp. Na quinta-feira (22), às 14h, o assessor afirmou que o candidato não poderia conversar por telefone e solicitou que as perguntas fossem enviadas por e-mail.

Os questionamentos foram encaminhados no mesmo dia. Desde então, não houve mais retorno do assessor. O UOL voltou a tentar entrar em contato com ele, por telefone e troca de mensagens, e não houve resposta.

Quanto a Waguinho, o pedido foi recebido pelo seu assessor de comunicação, também por telefone e por meio do WhatsApp, na manhã de quarta-feira (21), e ninguém apresentou uma resposta desde então.

No primeiro contato, o assessor afirmou que o candidato estava realizando atividades diárias de campanha em Belford Roxo e que o sinal de telefone no município é ruim. O UOL insistiu durante a última semana, com vários telefonemas na quarta (21), na quinta (22) e na sexta (23), mas não houve mais resposta por parte da equipe do deputado.

Por meio de sua assessora de comunicação, Eduardo Cunha afirmou que não iria comentar o assunto desta reportagem.

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