Mais curta e mais pobre, eleição de 2016 tem maiores mudanças em 22 anos

Felipe Amorim

Do UOL, em Brasília

Neste domingo (2), os brasileiros votam para prefeito e vereador numa eleição marcada por uma série de mudanças nas regras eleitorais. Será a primeira vez em 22 anos que as doações de empresas a políticos ficam proibidas, e o tempo de campanha foi o mais curto desde pelo menos 1989, quando foram realizadas as primeiras eleições para presidente após o fim da Ditadura Militar (1964-1985).

A proibição às doações de empresas fez secar o caixa das campanhas.

Em São Paulo, maior cidade do país, os cinco candidatos que aparecem na frente nas pesquisas conseguiram arrecadar juntos R$ 21 milhões de reais, segundo dados da Justiça Eleitoral consultados na quarta-feira (28). O valor corresponde à metade do arrecadado por apenas uma campanha, a que elegeu o atual prefeito, Fernando Haddad (PT), em 2012: R$ 42 milhões (R$ 56,3 milhões em valores corrigidos pela inflação).

As doações empresariais foram proibidas por decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) sob o argumento de que o poder econômico dos empresários traria desequilíbrio à disputa eleitoral. Em seguida, a então presidente Dilma Rousseff vetou trecho de um projeto de lei que permitia o financiamento privado, mantendo assim a proibição. 

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Juntos, candidatos de SP em 2016 arrecadaram R$ 21 mi; Haddad sozinho arrecadou R$ 42 mi em 2012

As doações oficiais de empresas foram autorizadas para a disputa presidencial de 1994, que elegeu pela primeira vez o presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). O caixa político foi aberto ao capital privado por uma lei do ano anterior.

Naquela época, a preocupação era com dar transparência às contribuições eleitorais, após o governo do presidente Fernando Collor (atualmente no PTC) ser fulminado na esteira de um escândalo que envolveu caixa dois operado pelo seu tesoureiro de campanha Paulo César Farias. Collor, hoje senador, sempre negou irregularidades.

Desde então, as empresas vinham sendo a principal fonte de financiamento das campanhas. Em 2014, ano em que foram eleitos presidente, governadores deputados e senadores, as pessoas jurídicas responderam por 70% de todas as doações de campanha realizadas.

Os parlamentares, no entanto, já articula no Congresso uma solução jurídica para que o financiamento empresarial seja retomado.

Criatividade e ilegalidade

A falta de dinheiro estimulou a criatividade dos candidatos. A pedido de partidos políticos, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) regulamentou as doações feitas com cartão de crédito. O objetivo foi dar segurança jurídica às operadoras das maquininhas dos cartões, que vinham se recusando a oferecer o serviço com medo de infringir regras eleitorais.

 

Alguns candidatos tiveram que tirar dinheiro do próprio bolso e até mesmo vender terrenos de família para fazer caixa, caso de Rafael Greca (PMN), candidato a prefeito de Curitiba. Levantamento feito pela "Folha de S.Paulo" aponta que os candidatos ricos já são os principais financiadores de campanha nestas eleições.

A ausência de doações de empresas, no entanto, não garantiu uma disputa sem irregularidades no financiamento das campanhas. Fiscalizações feitas pelo TSE, Procuradoria Eleitoral e TCU (Tribunal de Contas da União) identificaram suspeitas de irregularidades em uma a cada três doações. 

Uma das práticas que mais chamou a atenção das autoridades foram as doações feitas por beneficiários do programa Bolsa Família. Levantamento do TSE indica que 22,4 mil inscritos no Bolsa Família fizeram doações que somam R$ 21,1 milhões. Os casos podem indicar desde uma doação acima do teto legal de 10% da renda do ano anterior, até o uso do CPF do doador como um "laranja" para manter oculto o verdadeiro dono do dinheiro que originou a contribuição de campanha.

Campanha mais curta

Outra importante mudança nas eleições deste ano é a duração do tempo de campanha, que ficou menor. Esta será a campanha mais curta desde a eleição de 1989.

A mudança foi introduzida pela lei da minirreforma eleitoral, aprovada pelo Congresso no ano passado. 

A lei reduziu o tempo de campanha pela metade, de 90 para 45 dias. O tempo da propaganda na TV e no rádio também caiu, de 45 para 35 dias, e as inserções eleitorais se tornaram mais curtas. Os blocos do horário eleitoral gratuito, nas eleições para prefeito, tiveram o tempo de duração reduzido de 30 minutos para 10 minutos.

Desde as eleições de 1989 as campanhas tinham duração de 90 dias e a propaganda no rádio e TV já chegou a ser autorizada por até 60 dias.

Para o especialista em marketing eleitoral Emmanuel Publio Dias, professor da ESPM, a campanha mais curta e com menos dinheiro favorece a volta do "talento" à comunicação dos candidatos, que dessa forma precisam ser mais eficientes nas mensagens aos eleitores.

"O que essa campanha com menos recurso e menos tempo provocou foi o ressurgimento do talento, o que foi muito bom", diz.

O advogado especialista em direito eleitoral Anderson Pomini diz que o encurtamento das campanhas foi uma estratégia para tornar mais barata a eleição e uma opção para "poupar o eleitor" de um processo eleitoral mais longo, num momento de desgaste da imagem das instituições políticas. 

"Na minha opinião, o legislador reduziu o período [de campanha] em 50%, de 90 para 45 dias, em razão desses escândalos todos que ocorreram nesses últimos anos. E justamente no momento em que se debatiam essas reformas eleitorais, o país passava por uma crise aprofundada em todas as instituições políticas. Então, o legislador acabou sendo pressionado para reduzir esse período com o objetivo principal de incomodar o menos possível o eleitor."

Pomini e Publio Dias afirmam que a campanha mais curta não trouxe prejuízo para o eleitor conseguir conhecer os candidatos e definir seu voto, já que tradicionalmente o interesse do eleitor ocorre em maior intensidade apenas na reta final da disputa.

"Na prática não vejo prejuízo nenhum para o eleitor. As pesquisas comprovam que o eleitor, pelo menos uma maior porcentagem, vai decidir em quem votar nas últimas semanas", diz o advogado.

Para o professor de marketing político, um ponto negativo nessa eleição, possivelmente fruto da crise econômica, é o número menor de pesquisas públicas de intenção de voto. "A pesquisa é uma boa fonte de informação. Em algumas cidades as pessoas estão indo votar totalmente no escuro", afirma Dias.

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