Teto de gastos ameaça propostas na saúde de candidatos em Porto Alegre

Flávio Ilha

Colaboração para o UOL, em Porto Alegre

  • Arte UOL

    O atual vice-prefeito, Sebastião Melo (PMDB), à esq., e o deputado federal Nelson Marchezan Jr. (PSDB) disputam a Prefeitura de Porto Alegre

    O atual vice-prefeito, Sebastião Melo (PMDB), à esq., e o deputado federal Nelson Marchezan Jr. (PSDB) disputam a Prefeitura de Porto Alegre

Os dois candidatos que disputam o segundo turno das eleições para a Prefeitura de Porto Alegre, favoráveis à implantação do teto para gastos públicos que consta na PEC 241, vão ter dificuldades para financiar as propostas na área da saúde que constam em seus programas. 

Nelson Marchezan Júnior (PSDB), que lidera a disputa segundo o Ibope, participou da sessão de votação da PEC na última segunda-feira (10) em primeiro turno e votou favoravelmente à proposta. Segundo o candidato, que é deputado federal, a emenda é necessária para combater a "grave crise fiscal" do país.

"O limite é necessário diante do aumento acelerado das despesas e da queda na arrecadação. Não há previsão de perda de direitos nem de congelamento de recursos para a saúde e a educação, embora possa haver algum impacto num primeiro momento", diz.

O candidato reconhece que a situação financeira do município deve se deteriorar no próximo ano, em função do teto nos gastos públicos. Mas que as soluções para a área da saúde deverão ser de gestão. "Conseguiremos melhorar os serviços com transparência e combate à corrupção, mas sem irresponsabilidade com o dinheiro público", afirma.

A principal reclamação das comunidades periféricas de Porto Alegre é o horário limitado de atendimento das unidades básicas de saúde --o município conta atualmente com uma rede de 141 postos de atendimento, que abrem de segunda a sexta-feira entre 7h e 18h. A promessa do tucano é a abertura de oito postos de saúde da capital até as 22h. 

Marchezan disse que os recursos para garantir o funcionamento dos postos virão do corte de cargos de confiança (CCs) que, segundo ele, consomem mais de R$ 150 milhões ao ano dos cofres públicos. Segundo o candidato tucano, apenas 6% --ou cerca de R$ 9 milhões-- desse montante já garantem a abertura dos oitos postos.

Além disso, quer implantar o teleatendimento por especialistas para resolver até 70% das demandas no posto e na hora, sem encaminhamento para consulta especializada. Também pretende zerar as filas para consulta por especialistas e para a realização de exames por meio de mutirões e convênios com hospitais, com atendimento nos horários alternativos em que a rede privada se encontra ociosa.

O candidato à prefeitura pelo PMDB, o atual vice-prefeito Sebastião Melo, diz que os recursos para a saúde poderão ser afetados pela PEC 241. "O Estado brasileiro é uma coisa gigantesca. A população não aguenta mais pagar tanto imposto por serviços de péssima qualidade."

Para ele, a proposta "é equivocada" do ponto de vista dos serviços municipais. "Equilíbrio fiscal é importante, mas não à custa do atendimento à população que precisa. Três em cada quatro brasileiros usam o SUS. Então essa conta vai ser paga pelas prefeituras", afirma.

Melo propõe "estudar a viabilidade" da ampliação dos horários nos postos. Segundo o programa de governo do peemedebista, a falta de recursos poderá ser contornada com gestão. 

Luiz Armando Vaz/Agencia RBS
Centro obstétrico fechado na região metropolitana de Porto Alegre
Críticas

Mas a conta, para o atual secretário municipal da Saúde, não fecha. Só em pessoal, de acordo com Fernando Ritter, a prefeitura teria de gastar mais R$ 6,7 milhões por ano para manter as unidades abertas até mais tarde. Isso sem contar as equipes de segurança e os custos com insumos, luz, telefone e medicamentos. "Não existe nenhuma possibilidade de viabilizar isso, não sem recursos de fora do orçamento. O que estamos tentando, neste ano, é justamente manter os serviços existentes", diz o secretário.

Ritter critica a proposta e diz que não existe necessidade de manter os postos abertos até mais tarde, a não ser em situações pontuais, porque eles não estão preparados para atender casos agudos. "As unidades básicas atuam principalmente na prevenção e na promoção da saúde. Elas não estão preparadas para emergências."

O presidente do Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers), Paulo de Argollo Mendes, também questiona a viabilidade da proposta. "Não temos apontamento de onde virão os recursos e de como se manteriam os postos abertos até mais tarde. O ideal seria equipar melhor os postos, pois do jeito que estão não servem à população. Quem precisa de atendimento prefere ficar dez horas na fila de uma emergência a ser atendido em um posto."

O sindicato informou que Porto Alegre perdeu 431 leitos hospitalares no período entre julho de 2015 e junho de 2016. Também apontou que 73% dos postos de atendimento não têm serviço de vigilância, o que tem aumentado a insegurança das equipes de saúde que atuam nesses locais.

'Acanhada'

Segundo Melo, "muitas coisas avançaram na área da saúde". "Metade das unidades foi reformada e todos os postos estão informatizados. Então, vamos focar nossos esforços na melhoria da gestão."

Mas afirma que os problemas estruturais são difíceis de serem resolvidos no âmbito do município. "Os problemas do SUS são os mesmos no Brasil, no Estado e na cidade. Precisamos melhorar a rede de atenção básica para reduzir a hospitalização."

A possibilidade de cortes no financiamento à saúde tornou "acanhada" a proposta do PMDB para o setor, segundo o Simers. Mendes lembrou que a aprovação da PEC deve projetar uma perda de R$ 438 bilhões ao SUS no prazo de 20 anos, segundo levantamento realizado pelo Conselho Nacional de Saúde.

"Como vão gerir um sistema que já é insuficiente com essa escassez de recursos, que implica superlotação, precariedade no atendimento e desvalorização dos profissionais? O financiamento da saúde deveria ser prioridade dos candidatos, mas o que vemos são só arremedos de proposta", critica.

Ele também pretende acelerar o processo de informatização da rede pública, para garantir mais integração dos pontos de atendimento, e fortalecer a atuação do Serviço de Atendimento Médico Unificado (Samu) para que seja um regulador de todos os serviços de emergência da cidade.

Outra proposta é ampliar as equipes do programa Melhor em Casa, para tratamento domiciliar de casos de menor complexidade, mas vai depender de recursos federais, como o Mais Médicos.

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