Quais os argumentos dos ministros para recusar ou aceitar recurso de Lula?
Nathan Lopes
Do UOL, em São Paulo
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Arte/UOL
Nos votos em que mostraram seu posicionamento sobre o recurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) contra a prisão após segunda instância, os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) usaram nesta quarta-feira (4) argumentos que foram de impunidade a falhas da Justiça brasileira.
Foram mais de dez horas de sessão, em que seis dos onze ministros negaram o habeas corpus preventivo do petista contra prisão em decorrência da condenação a mais de 12 anos de prisão por lavagem de dinheiro e corrupção passiva no caso do tríplex.
Confira quais foram as teses de cada um dos onze ministros:
Fachin: STF não sucumbiu a 'anseios de sociedade punitivista'
- Edson Fachin: morosidade da Justiça
Relator do habeas corpus de Lula no STF, o ministro Edson Fachin indicou a "morosidade judicial no Brasil em apresentar soluções criminais" como um de seus principais argumentos para negar o pedido da defesa do petista. Fachin pontuou que o TRF-4 lançou mão do entendimento do STF para indicar a execução da pena. Para o ministro, ela é um "desdobramento natural". Ele também aproveitou para rebater críticas de que, ao negar o recurso, o STF seja a favor de punições. "Digo isso para rechaçar a pecha de que esta Corte, ao julgar o habeas corpus, teria sucumbido aos anseios de uma criticável sociedade punitivista, comprimindo direitos humanos em um ambiente de histeria, como se alegou".
TRF-4 lançou mão de entendimento do Supremo, diz relator
- Gilmar Mendes: sistema falho
Após pedir para antecipar seu voto --ele seria o oitavo a se manifestar-- por causa de uma viagem a Portugal, o ministro Gilmar Mendes disse que a possibilidade de prisão após segunda instância, entendimento atual do STF, passou a ser vista como obrigação. Gilmar disse que mudou sua posição --ele era a favor de prisão depois de condenação em segundo grau-- porque os brasileiros estariam convivendo com um "sistema falho". "A Justiça criminal, por si só, é extremamente falha. É muito falha."
Gilmar explica por que mudou de entendimento
- Alexandre de Moraes: tribunais de passagem
Ao votar contra o habeas corpus, o ministro Alexandre de Moraes ressaltou sua visão de que barrar a execução de pena após a segunda instância seria tornar a primeira e a segunda instâncias "tribunais de passagem". Para ele, as decisões de juízes e desembargadores já contam com mecanismos, como a previsão de ônus da prova, que garantem a defesa dos acusados. "A jabuticaba seria o inverso: só começar a execução após trânsito em julgado, depois de todas as possibilidades recursais", pontuou.
Moraes defende prisão contra 'tribunais sem efetividade'
- Luís Roberto Barroso: paraíso de corruptos
Dono de um dos votos mais longos entre os ministros --cerca de uma hora e quinze minutos--, o ministro Luís Roberto Barroso defendeu a prisão após segunda instância dizendo que essa é uma decisão contra a impunidade. "Eu respeito todos os pontos de vista; agora, esse não é o país que eu gostaria de deixar para meus filhos", comentou, citando que o país seria "um paraíso de homicidas, estupradores e corruptos" sem a execução da pena. Para ele, se o Supremo voltar atrás em seu entendimento, "o crime voltará a compensar sem o risco da prisão em segundo grau".
Barroso voto contra 'paraíso de corruptos'
- Rosa Weber: a vida é dinâmica
Quinta a votar e considerada "dona do voto decisivo" no julgamento do habeas corpus, a ministra Rosa Weber frisou que votou seguindo o atual entendimento do STF de que é possível prisão após condenação em segunda instância. Em seu pronunciamento, ela pontuou que a consistência e a coerência são virtudes. E que, embora a jurisprudência comporte evolução --"porque, insisto, a vida é dinâmica"--, "há de se evitar rupturas bruscas".
Rosa, porém, ressaltou que quer debater a questão fora do habeas corpus de Lula, quando o Supremo decidir julgar duas ações que deverão formar nova jurisprudência da Corte. "Eu enfrento esse habeas corpus nos exatos termos", disse a ministra, "reafirmando que o tema de fundo [prisão após segunda instância] deva ser sim revisitado."
Rosa vota por manter jurisprudência de prisão após 2ª instância
- Luiz Fux: jurisprudência tem que ser estável
O quinto voto contra o pedido do ex-presidente foi dado pelo ministro Luiz Fux. Assim como a ministra Rosa Weber, ele sustentou que o STJ (Superior Tribunal de Justiça), quando negou o habeas corpus de Lula no começo de março, apenas seguiu o atual entendimento do STF sobre prisão após segunda instância. "A decisão foi nos estritos termos do STF", disse. "A jurisprudência do Tribunal tem que ser íntegra, coerente e estável", avaliou Fux.
Fux: instituição que não se respeita não pode usufruir do respeito
- Dias Toffoli: decisão certa ou errada?
Vice-presidente do STF, o ministro Dias Toffoli disse ter estruturado seu voto com base na Constituição, que indica que "ninguém será considerado culpado antes do transito em julgado". Contra a prisão após segunda instância, ele questionou o que seria o "culpado". Ele disse que essa "lacuna tem que ser resolvida pelo juiz". Toffoli ainda apontou que deseja debater a questão da prisão após segunda instância fora do habeas corpus de Lula. "Não há petrificação da jurisprudência. Entendo por possibilidade de reabrir o embrulho e enfrentar a questão de fundo".
Toffoli: não há uma posição certa e uma errada
- Ricardo Lewandowski: momento grave
A favor de conceder o habeas corpus a Lula, o ministro disse que o julgamento é "um momento grave na história" da Corte. Assim como Toffoli, ele recorreu à Constituição e indicou que ela estaria sendo desrespeitada, negando que esperar o trânsito em julgado levaria à impunidade. "Ao contrário do que se alardeia, se prevalecesse a tese de respeito absoluto à vontade dos constituintes, isso não significaria que os malfeitores seriam libertadores. Porque eles continuam presos por decisões fundamentadas", disse. "É possível restituir a liberdade de alguém se houver reforma da sentença condenatória no STJ ou no STF com juros e correção monetária? A vida e a liberdade não se repõem jamais."
Lewandowski: Vida e liberdade não se repõem jamais
- Marco Aurélio Mello: populismo judicial
Ao justificar sua posição de conceder o habeas corpus, o ministro Marco Aurélio Mello disse que não segue a opinião pública em suas decisões. "Longe de mim o populismo judicial. Longe de mim a postura politicamente correta, a hipocrisia. Creio que esta capa me atribui o dever maior, que é o dever de buscar a prevalência das leis da República". Para Mello, a prisão após segunda instância "revela desprezo à Constituição Federal". "No Brasil, presume-se que todos são salafrários até que se prove o contrário."
Longe de mim o populismo judicial, diz Marco Aurélio
- Celso de Mello: não é uma jabuticaba brasileira
Decano do STF, o ministro Celso de Mello defendeu que a prisão após trânsito em julgado não é algo exclusivo do Brasil. "A exigência do trânsito em julgado não é uma singularidade do constitucionalismo brasileiro", disse o ministro, citando a Constituição portuguesa como exemplo. "Não é uma jabuticaba brasileira", comentou. Para o ministro, a "prisão cautelar não pode representar antecipação punitiva daquele que a sofre". "Porque não se fundamenta em qualquer juízo de punibilidade", explicou.
Prisão após trânsito em julgado 'não é jabuticaba', diz decano
- Cármen Lúcia: princípio da igualdade
Última a votar e responsável pelo desempate na votação sobre o habeas corpus de Lula, a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, avaliou que não há ruptura no caso de prisão após segunda instância. Ela indica que, nesse cenário, já está exaurida a fase de provas. Nas instâncias superiores, STJ e STF, "passa-se a discutir, basicamente, o Direito". Ela também recordou um argumento do ministro Barroso, citando o "princípio de igualdade", de que há pessoas que conseguem se valer "de todos os recursos" e outras, mais humildes, não "podem se valer da mesma situação". Ela ainda citou que o Supremo já oscilou entre aceitar ou não prisão após segunda instância nas últimas décadas.
Cármen aponta princípio de igualdade ao negar HC de Lula
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