Violência no Rio

TRE-RJ planeja ações "customizadas" no combate a milícias nas eleições

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, no Rio

  • Marcelo Piu/Agência O Globo

    Símbolo do "Batman" demarca território da maior milícia do Rio, a Liga da Justiça. Desenho é alusão ao apelido de um dos fundadores do grupo criminoso, o ex-PM Ricardo Teixeira da Cruz, o Batman, atualmente preso

    Símbolo do "Batman" demarca território da maior milícia do Rio, a Liga da Justiça. Desenho é alusão ao apelido de um dos fundadores do grupo criminoso, o ex-PM Ricardo Teixeira da Cruz, o Batman, atualmente preso

O presidente do TRE-RJ (Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro), desembargador Carlos Eduardo da Rosa da Fonseca Passos, afirmou, em entrevista ao UOL, que as autoridades empenhadas em garantir a segurança nas eleições estudam "soluções customizadas" no combate à ação de milicianos no estado. Segundo ele, cada grupo paramilitar tem "um modo de agir próprio", o que "exige monitoramento específico".

O planejamento estratégico vem sendo elaborado pelo núcleo de inteligência criado pelo Tribunal --nomeado "Coalizão Eleitoral"--, que reúne as forças policiais, o comando da intervenção federal no estado e órgãos colaboradores.

"Cada uma de tais pseudo-organizações [milícias] possui um modo de agir próprio, o que exige monitoramento específico e a adoção de soluções customizadas, que estão sendo consideradas pelas equipes de fiscalização. Até o presente momento, o clima é de normalidade. Mas, caso necessário, agiremos de forma célere e dura", declarou Fonseca Passos, sem detalhar as ações que estão sendo articuladas.

O primeiro resultado efetivo entregue pela Coalizão Eleitoral foi um mapeamento dos locais de votação e do número de eleitores em áreas ameaçadas direta ou indiretamente pelo crime organizado. De acordo com o levantamento, cerca de 1,7 milhão de pessoas votam em 637 locais de votação (12,8% do total) considerados de risco no estado.

O RJ é o terceiro maior colégio eleitoral do país, com quase 12,5 milhões de votantes. Ou seja, do total, cerca de 15% do eleitorado fluminense exercem o direito do voto em bairros e localidades ameaçados por facções criminosos, milícias e outros grupos.

"É muito ou pouco? Aí nós temos que ter um referencial, e esse dado não existe, a comparação com outros estados. Nós temos o nosso dado. Então, para nós, é um dado absoluto. Não importa saber se é muito ou pouco. É o que é. E é o que vai ter que ser resolvido porque nós vamos trabalhar exatamente para isso", comentou o secretário de Segurança Pública, general Richard Nunes, que ministrou palestra em evento pelo TRE-RJ na terça-feira (14).

Tutela de evidência

A principal demanda de inteligência da Coalizão Eleitoral é o rastreamento de campanhas eventualmente financiadas pelo crime organizado, segundo o planejamento. Para enfrentar o problema, o TRE-RJ pode conceder antecipadamente a chamada "tutela de evidência", em casos irrefutáveis, a fim de impedir que candidatos eleitos com dinheiro do tráfico ou da milícia tomem posse do mandato.

A tutela de evidência é um dispositivo constitucional que, cumpridas as exigências definidas em lei, como "o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte", garante celeridade no cumprimento da decisão.

Presente na palestra do general Nunes, na terça, Fonseca Passos explicou que as medidas se aplicariam à existência de "provas que não permitam uma resposta do réu". O magistrado defende que, ainda que vencedor na urna, o candidato eventualmente financiado por organizações criminosas estaria, na prática, cometendo abuso de poder.

Haverá uma ação pronta para que essa medida seja decretada e o candidato, impedido de exercer o mandato. A vontade do eleitor estará viciada pelo abuso de poder

Carlos Eduardo da Rosa da Fonseca Passos, presidente do TRE-RJ

"Se for possível realmente estabelecermos uma relação de causa e efeito antecipadas, que é o nosso objetivo primordial, vamos evitar que o mal se concretize. Se não for na primeira etapa [tutela antecipada], na segunda nós vamos atuar", comentou o general Nunes.

Sigilo do voto

O presidente do TRE-RJ classificou como "balela" a tática utilizada por criminosos que buscam intimidar ou coagir o eleitor a votar em determinado candidato à base de ameaças de retaliação. Segundo ele, "não existe ataque externo à urna eletrônica", o que garante o sigilo do voto.

"É uma balela a afirmação de que o bandido sabe quem o eleitor votou. Os dados são embaralhados na urna eletrônica. Isso é uma fake news de bandido."

A Coalizão Eleitoral, responsável por garantir a segurança e a normalidade nas eleições, foi formada no fim do ano passado. Seus integrantes têm realizado reuniões a cada dois meses e, nas próximas semanas, devem se dividir em cinco grupos temáticos, nas áreas de inteligência, planejamento operacional e logística, soluções tecnológicas, comunicação social e capacitação de servidores.

Além do enfrentamento da violência e das questões associadas à ação do crime organizado, Fonseca Passos elencou as seguintes prioridades na entrevista ao UOL: "O combate à influência do crime organizado, à exploração da miséria através dos chamados centros sociais, ao abuso do poder religioso e à propaganda irregular, notadamente aquela difundida pelas mídias sociais".

Ações a partir da semana que vem

O secretário de Segurança do Rio anunciou que, a partir da próxima semana, as forças de segurança mobilizadas na intervenção federal darão início a uma grande operação de combate aos roubos de carga no estado. A estratégia, explicou o general Nunes, é atacar a sustentação econômica das facções e grupos criminosos que eventualmente possam interferir no "bom êxito" das eleições.

"Sabemos perfeitamente que o roubo de carga é uma prática criminosa que financia essas facções. De certa forma, vamos contribuir, não digo nem indiretamente, diretamente para o bom êxito do pleito eleitoral. Com uma presença muito mais massiva de policiais de todos os órgãos, inclusive de forças de segurança federais, nessas áreas, o que vai aumentar inclusive a nossa capilaridade e a nossa capacidade de vigilância."

Durante o período eleitoral, os órgãos mobilizados na intervenção federal e na coalizão coordenada pelo TRE-RJ ativarão gabinetes de crise a fim de processar as informações coletadas em campo.

"Se nós estivermos no terreno de maneira ostensiva, nossos olhos e ouvidos estarão lá. (...) Quando a gente tem a tropa no terreno, quando a gente tem policial no terreno, a inteligência fica muito mais apurada. Os dados chegam com muito mais celeridade e aperfeiçoamento de conteúdo."

Receba notícias do UOL. É grátis!

UOL Newsletter

Para começar e terminar o dia bem informado.

Quero Receber

Veja também

UOL Cursos Online

Todos os cursos