Morto em dia da eleição lutava contra a intolerância na Bahia

Carlos Madeiro

Colaboração para o UOL, em Maceió

  • Reprodução/Facebook

Era tarde de 15 de novembro de 2017. Môa do Katendê, nome de capoeira do mestre Romualdo Rosário da Costa, gravou uma mensagem contra a intolerância religiosa.

"Nós, de matriz africana, respeitamos todos. E o que queremos? Em troca, respeito e consideração. Agora, invadir terreiros, procurar difamar uma tradição milenar é um ignorância muito grande. Aqui é um desabafo, e isso no país todo está fortalecendo", afirmou em vídeo divulgado em sua página, hoje repleta de comentários de homenagens.

Na noite do último domingo (7), aos 63 anos, Môa foi vítima daquilo que sempre combateu. Segundo testemunhas, foi assassinado após uma discussão sobre política. Ele teria defendido o voto no PT e irritou supostos eleitores de Jair Bolsonaro (PSL) em um bar na comunidade Dique Pequeno, na periferia de Salvador. Doze facadas tiraram sua vida ainda no local.

Referência

Mestre Môa do Katendê não era somente um artista negro entre tantos da Bahia. Ele era referência na defesa das tradições africanas e percorria o mundo divulgando a arte.

Compositor, dançarino, capoeirista, percussionista, artesão e educador, dizia que a cultura poderia promover a paz.

Há 40, havia fundado o "Badauê", várias vezes campeão do carnaval baiano nos anos 80, na categoria de afoxés. "Esse afoxé foi responsável pela reafricanização do carnaval baiano", diz o amigo e produtor cultural em São Paulo do mestre, Leandro Sequelle.

Em 1995, criou o afoxé "Amigos de Katendê", com o qual viajava pelo mundo. Nesta segunda-feira (8), tinha viagem marcada para São Paulo, a trabalho. Em vez disso, terá o corpo sepultado às 16h30, no cemitério da baixa de Quintas, em Salvador.

"Ele lutou a vida inteira contra intolerância, o preconceito, o racismo. Sempre tentou criar formas mais diversas para unir os povos", afirma Sequelle.

Mestre Môa tentava recursos para contra construir um centro cultural próprio. Em 19 de novembro, iria desfilar com seu afoxé no centro de São Paulo.

"Nestes últimos anos, ele estava realizando uma série de oficinas de musicalização, ritmo, movimentos, dança e canto pela Europa. Em 2018 passou por França, Inglaterra, Portugal, Espanha e Suíça", conta.

No mesmo vídeo em que fez o desabafo, Mestre Môa deixou um recado: "A gente encontra resistência não só no povo nosso do candomblé, mas nos afoxés, blocos afro, escolas de samba, pagodes, maracatu, tambor de crioula, mas de todas as manifestação de matriz africana que estejam ligados".

Como disse um de seus pupilos nesta segunda-feira, em sua rede social: "O mestre se foi, mas a luta está viva."

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