Convocar atos contra vitória de Bolsonaro não é democrático, diz general

Luis Kawaguti

Do UOL, no Rio

  • UOL

    General Carlos Alberto dos Santos Cruz, ex-secretário nacional de Segurança Pública

    General Carlos Alberto dos Santos Cruz, ex-secretário nacional de Segurança Pública

O general da reserva Carlos Alberto dos Santos Cruz afirmou, nesta terça-feira (30), que as declarações e os protestos organizados por Guilherme Boulos (PSOL) contra o presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) não são atitudes democráticas. Para ele, Boulos, que disputou a eleição presidencial e é líder do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto), tenta "se apropriar" indevidamente do termo democracia.

Logo após a eleição de Bolsonaro, Boulos começou a divulgar vídeos na internet convocando militantes para participarem de manifestações contra Bolsonaro nesta terça-feira em diversas cidades do Brasil. Dois atos reuniram grupos no Rio e em São Paulo. Procurado pelo UOL, Boulos disse que a iniciativa está dentro das regras democráticas (leia mais abaixo).

Acho que é um absurdo esse pessoal falar em democracia. Estão tentando se apropriar do termo democracia quando não têm nada de democrático

Carlos Alberto dos Santos Cruz, general da reserva Santos Cruz

Na opinião dele, as colocações de Boulos dão a ideia de um não reconhecimento da vitória eleitoral de Bolsonaro, que teve 55,1% dos votos contra 44,9% de Fernando Haddad (PT), apoiado por Boulos no segundo turno.

Santos Cruz, foi Secretário Nacional de Segurança Pública entre 2017 e 2018, durante o governo de Michel Temer (MDB), e comandou duas missões de paz das Nações Unidas, no Haiti (2007-2009) e na República Democrática do Congo (2013-2015).

Ele combateu grupos rebeldes Chimères haitianos e venceu junto ao exército congolês uma série de batalhas que levaram à desestruturação do M23 (Exército Revolucionário do Congo).

O UOL conversou com três oficiais da ativa ligados à cúpula do Exército que afirmaram que as declarações de Boulos logo após a votação desagradaram boa parte dos militares. Eles disseram, porém, que essa é uma percepção individual, pois institucionalmente o Exército se mantém neutro quando o assunto é política partidária.

Ao ser informado pelo UOL sobre o descontentamento de militares, Boulos disse: "Bolsonaro foi eleito presidente do Brasil. Isso não tira nosso direito de fazer oposição, dentro das regras democráticas, como sempre fizemos".

Na mensagem divulgada pelo WhatsApp no domingo, o líder do MTST diz: "O país sai dividido e fraturado dessa eleição. Bolsonaro é uma ameaça real à democracia brasileira".

"É importante que aqui se diga: vai ter resistência, entre a prisão e o exílio nós escolhemos as ruas", disse Boulos.

Santos Cruz rebate: "Tentar começar a organizar uma manifestação quando se está comemorando uma vitória da democracia é uma desqualificação política".

O general da reserva disse acreditar que Boulos estaria tentando manipular a população. "Ele vive da exploração da desgraça, não tem interesse em uma disputa limpa e manipula as pessoas que estão em necessidade [sem-teto]. Ele não tem interesse em resolver o problema dessas pessoas, só quer os votos delas", disse.

Santos Cruz declarou apoio individual a Bolsonaro durante a campanha eleitoral, mas não é vinculado a partidos políticos nem tem ligação com a equipe do presidente eleito. Apesar de estar na reserva, ele é considerado uma grande liderança entre militares da ativa e da reserva, segundo as fontes ouvidas pelo UOL.

Boulos disse ao UOL que está incentivando atos pacíficos. "A mensagem que eu passei é que nós não podemos fingir que há uma normalidade democrática institucional quando é eleito um Presidente da República, ainda que pelo voto popular é verdade, alguém que diz que se não fosse eleito viraria a mesa, seria fraude", disse.

O político do PSOL incentivou ainda a criação de uma "frente ampla pela democracia" e afirmou que manifestações em protesto serão realizadas ainda nesta terça-feira (30).

"Bolsonaro ganhou as eleições só que mais de uma vez ele se colocou como uma ameaça aos valores democráticos no Brasil. Há uma semana atrás ele disse que seus opositores teriam duas opções: a prisão ou o exílio, ele é alguém que exalta com frequência a ditadura militar, a tortura e torturadores, é alguém avesso aos valores democráticos", disse Boulos.

Após dar as declarações citadas por Boulos, nas quais afirmou que os "marginais vermelhos serão banidos da nossa pátria", Bolsonaro baixou o tom e dizendo na noite de segunda-feira (29), em entrevista à Rede Globo, que foi um discurso inflamado.

Ele afirmou que se referia à cúpula do PT e à cúpula do PSOL, porque Boulos havia dito que invadiria sua casa no Rio de Janeiro por não ser produtiva. "Foi um momento de desabafo, foi um discurso acalorado, mas não ofendi a honra de ninguém", disse o presidente eleito à Rede Globo.

Um general da ativa ligado à cúpula do Exército ouvido pelo UOL sob anonimato afirmou acreditar que Boulos tenta provocar um cenário de confrontação para tentar fazer as Forças Armadas intervirem na segurança para manter a ordem. "Não vamos cair na provocação. Vamos manter a serenidade e a democracia", disse ele.

Luis Kawaguti / UOL
Militantes de esquerda fazem ato contra Bolsonaro no Rio

Atos em SP e Rio

No final da tarde desta terça-feira (30), atos organizados pelo PSOL, pelo PSTU e por movimentos sociais reuniram algumas centenas de pessoas em São Paulo e no Rio de Janeiro.

Em São Paulo, um grupo protestou no vão livre do museu Masp, na avenida Paulista, região central, e no Rio em um auditório em um prédio na Avenida Rio Branco, centro da capital.

No Rio, em discursos, militantes disseram que o motivo de o ato ser em um ambiente fechado era para evitar hostilidades de apoiadores de Bolsonaro e "não parecer choro de perdedor".

O candidato derrotado ao governo do Rio Tarcísio Motta (PSOL) disse que o ato foi o início de um movimento que vai resultar em manifestações de rua.

"[O ato] não tem a ver ou com reconhecer o resultado eleitoral. Ele [Bolsonaro] ganhou a eleição, agora a partir desse momento é preciso que a gente possa estar em guarda, atento, forte, unido para defender aquilo que é a democracia de fato cotidiano", disse. Segundo ele os militantes não estavam criticando a eleição de Bolsonaro, mas sim ideias defendidas por ele.

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