ESCÂNDALOS NO CONGRESSO

Eduardo Cunha (PMDB-RJ) é relacionado a gastança em Furnas

Data de Divulgação

26.jan.2011

O escândalo

A Furnas Centrais Elétricas, estatal influenciada pelo PMDB, não comprou um lote de ações em dezembro de 2007 para comprá-lo por R$ 73 milhões a mais, 8 meses depois, de empresa ligada ao deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). A informação foi publicada pelo jornal "O Globo", em 26.jan.2011.

O jornal obteve atas de reuniões que registram o caso por etapas. O negócio era a compra de papéis da Oliveira Trust e, segundo "O Globo", envolveu "alteração da sociedade montada para construir e explorar a usina hidrelétrica de Serra do Facão, em Goiás".

Uma ata de 4.dez.2007 mostra que Furnas renunciou ao direito de adquirir participação na empresa Oliveira Trust Servicer. Em 9.jan.2008, foi registrado que a Companhia Energética Serra da Carioca II, do grupo Gallway –relacionada a Eduardo Cunha pelo jornal– comprou os papeis por R$ 6,96 milhões. Por fim, em 29.jul.2008, Furnas comprou os papeis que antes não quisera por R$ 80 milhões –diferença de mais de R$ 73 milhões do preço de janeiro.

O grupo Gallway, segundo o jornal, tem origem no paraíso fiscal das Ilhas Virgens britânicas e tem em seus quadros duas pessoas próximas a Eduardo Cunha: Lutero de Castro Cardoso, ex-presidente da Cedae e ex-funcionário da Telerj, e Lúcio Bolonha Funaro que, segundo o jornal, é um doleiro "que se apresenta em negócios como representante da Gallway".

"Lutero e Funaro têm ligações com o deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a quem é atribuída a indicação do então presidente de Furnas, o ex-prefeito Luiz Paulo Conde , no período da transação. Lutero, também nome indicado por Cunha para a Cedae, chegou a ter bens bloqueados pela Justiça por operações ilegais na companhia de águas em 2007. Já Funaro, ao ser investigado pela CPI dos Correios, teve de explicar os motivos que o levavam a pagar aluguel, condomínio e outras despesas do apartamento ocupado por Eduardo Cunha no flat Blue Tree Tower, em Brasília, em 2003", relatou o jornal.

O presidente de Furnas, Carlos Nadalutti Filho, enviou carta ao ministro de Minas e Energia, Edson Lobão (PMDB), na qual cita todos os diretores da estatal e membros do Conselho de Administração que endossaram a compra dos papeis da Oliveira Trust, revelou o "Painel" da "Folha", em 2.fev.2011 (aqui, para assinantes do jornal e do UOL).

São citados na carta Márcio Zimmermann, ex-ministro e atual secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, Valter Cardeal, diretor da Eletrobras, e Fábio Rezende, a quem é atribuído dossiê sobre o caso Serra do Facão, informou o "Painel". A coluna explica que Cardeal é próximo a Dilma e, à época de divulgação do escândalo, estava cotado para ocupar posto-chave no setor elétrico. Além disso, a coluna publicou que o presidente de Furnas, Carlos Nadalutti, deve perder seu cargo para Flávio Decat, pessoa ligada a Eduardo Cunha.

BNDES
Em 28.jan.2011, o jornal "Folha de S.Paulo" publicou que o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) vetou financiamento de R$ 587,8 milhões à hidrelétrica Serra do Facão, em Goiás, após a empresa Companhia Energética Serra da Carioca 2 entrar no negócio.

Segundo a "Folha", o BNDES justificou a suspensão da ajuda financeira, em 2008, com o fato de que sócios e investidores na Serra da Carioca haviam sido investigados pela CPI dos Correios (que em 2005 apurou o mensalão e suposta corrupção em estatais). O financiamento do BNDES para o projeto –que está no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento)– estava aprovado desde outubro de 2007.

Em 31.jan.2011, a "Folha" publicou que Furnas pressionou o BNDES em 2008 pela liberação de um empréstimo de R$ 587,9 milhões para a construção da hidrelétrica Serra do Facão, no interior de Goiás, mas o BNDES só liberou o financiamento depois que a empresa Serra da Carioca saiu do negócio.

Em 4.fev.2011, a "Folha" publicou que a Serra da Carioca omitiu sua origem em paraíso fiscal (aqui, para assinantes do jornal e do UOL). "O banco [BNDES] pediu informações sobre o quadro societário da Serra da Carioca. Na relação de sócios, estavam os empresários João Alberto Nogueira e Sérgio Reinas, com 5% das ações cada um, e a Gallway Projetos e Energia do Brasil, com 90%. A controladora da Gallway era a Atlantic Energy Private Foundation com 99,99%. A Serra da Carioca omitiu que Atlantic, sediada nas Antilhas Holandesas (paraíso fiscal), pertencia a Nogueira", publicou o jornal.

"Por meio de assessoria de imprensa, Furnas disse que a "correspondência [enviada ao BNDES] apenas solicitou que fosse viabilizado o financiamento da usina Serra do Facão [a hidrelétrica de Goiás], de forma a não comprometer seu cronograma de implantação", publicou a "Folha".

Dossiê
O negócio envolvendo a hidrelétrica de Serra do Facão é citado em dossiê feito por engenheiros de Furnas para relatar que a estatal é aparelhada pelo PMDB, afirma "O Globo". O dossiê tem 2 páginas e meia e foi encaminhado pelo deputado estadual licenciado e secretário municipal de Habitação, Jorge Bittar (PT-RJ), ao ministro Luiz Sérgio, da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República.

O caso de Serra do Facão, segundo o dossiê, representa prejuízo para Furnas que é "exemplo da atuação dessa rede de influência gerencial". Para os autores do documento, os prejuízos acumulados só nessa operação chegariam a R$ 100 milhões, relatou "O Globo".

"Ainda que não haja nenhuma prova material, contratações, renovação e não renovação de contratos, liberação de pagamentos, nomeação etc. são feitas, frequentemente e às claras, para atender ao interesse desse ou daquele grupo político. A desfaçatez é amplamente registrada nos corredores da empresa", diz o texto.

Manobra no Congresso
Sobre a participação do deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ) no caso, a "Folha de S.Paulo" ainda publicou, em 2.fev.2011, que ele apresentou, e conseguiu aprovar, "mudança na lei que impedia a estatal Furnas de comprar as ações de seu sócio no projeto da hidrelétrica Serra do Facão, em Goiás".

A mudança conseguida por Cunha, segundo o jornal, "permitiu que Furnas comprasse, em agosto de 2008, as ações da empresa Serra da Carioca II".

Além disso, "O Globo" publicou, em 4.fev.2011, que a Furnas Centrais Elétricas cobriu os prejuízos causados pela participação da Companhia Energética Serra da Carioca II na sociedade montada para construir e explorar a Usina Hidrelétrica da Serra do Facão , em Goiás.

"As perdas para a estatal, que superam R$ 100 milhões, incluem o pagamento de um empréstimo de R$ 60 milhões, tomado em abril de 2008 pela empresa Serra da Carioca II junto ao ABN AMRO Real, que teve como garantia as próprias ações da sociedade e não foi honrado", diz a reportagem do jornal.

Outro indício da influência de Cunha sobre Furnas foi levantado por texto de "O Globo" publicado em 21.fev.2011. O jornal diz que Aluízio Meyer de Gouvêa Costa, ex-presidente da Cedae e afilhado político de Cunha, acumula o cargo de diretor técnico de três empresas contempladas, no governo Lula, por obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para o setor elétrico. "Ele foi indicado aos cargos pela direção de Furnas Centrais Elétricas, que detém 49% do capital dessas empresas", diz "O Globo".

Outro lado
Em entrevista à "Folha", publicada em 31.jan.2011 (aqui, para assinantes do jornal e do UOL), o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) afirmou não ser "responsável por atos de Furnas" e classificou como "jogo sujo" o dossiê entregues ao Planalto pelo petista Jorge Bittar. "Não tenho nenhum problema com o PT-RJ, institucional. Só me revolto e me rebelo contra esses dossiês apócrifos com inverdades. Isso é que eu acho jogo baixo, jogo sujo", disse Cunha. 

Cunha ainda disse à "Folha" que propôs a mudança na lei a pedido do ministro de Minas e Energia Edison Lobão e do secretário-executivo do Ministério, Márcio Zimmermann e que não há relação entre este fato e a operação entre Furnas e a empresa Serra da Carioca. O objetivo da alteração na lei, segundo Cunha, seria permitir a atuação da estatal e de suas subsidiárias no exterior.

"A iniciativa foi única e exclusivamente do governo, tanto que foi sancionada pelo presidente da República na forma proposta, sem qualquer veto", disse Cunha à "Folha", segundo publicado em 2.fev.2011.

Furnas alega que pagou os papeis R$ 73 milhões mais caro do que teria pagado antes porque, nesse intervalo, a empresa Serra Carioca fez um aporte de R$ 75 milhões na sociedade, "o que justifica integralmente a diferença", publicou "O Globo", em 26.jan.2011.  As explicações da estatal foram enviadas ao jornal em nota.

"A estatal, contudo, não forneceu qualquer detalhe sobre o suposto aporte feito pela companhia ligada ao doleiro Lúcio Funaro", comenta o jornal, destacando trecho do texto recebido de Furnas: "O aporte foi feito pela Serra da Carioca à Serra do Facão Participações; portanto, esse registro deve ser solicitado a eles".

A nota ainda diz que Furnas abriu mão de comprar o lote das ações em dez.2007 porque "naquela ocasião era necessário manter o caráter privado da Serra do Facão , o que só seria possível se um investidor privado fosse substituído por outro de mesma natureza". Meses depois, a aquisição foi feita porque " melhoraria o resultado do negócio para Furnas, considerando-se a alteração de variáveis macroeconômicas no período", diz a nota.

Também em nota, segundo publicou a "Folha" em 28.jan.2011, Furnas afirmou desconhecer o veto do BNDES.

Já o BNDES informou que, com a Serra da Carioca fora do negócio, concedeu financiamento de R$ 520 milhões à usina em 2009. O banco não comenta sobre o veto de 2008, escreveu a "Folha". E o deputado federal Eduardo Cunha nega envolvimento com o caso.

"Desconheço a operação denunciada e, pelo pouco conhecimento que possuo sobre governança, duvido que tenha se passado da forma colocada", afirmou o deputado em nota, segundo noticiou a "Folha".

A Companhia Energética Serra da Carioca nega ter sido beneficiada por políticos e confirma aportes de recursos que justificam o valor da venda de ações a Furnas.

A advogada de Lúcio Bolonha Funaro mandou carta à "Folha" (publicada sábado, 29.jan.2011) negando que seu cliente seja doleiro e tenha cometido irregularidades. Abaixo, íntegra da carta, como publicada pelo jornal:

"Lúcio Bolonha Funaro foi atingido em sua honra, com danosos reflexos em seus negócios, por causa do texto "Furnas compra ação após veto do BNDES" (Poder, ontem). Venho externar repúdio ao conteúdo inverídico e prestar esclarecimentos: 1) Sua carreira é pautada na mais absoluta legalidade, sendo empresário reconhecido.

2) É certo que repórteres da Folha, assim como ocorrerá com os signatários da reportagem, já são alvo de interpelações judiciais e/ ou ações criminais propostas por Funaro, por insistirem em se referir à sua pessoa como "doleiro", atividade jamais praticada por meu constituinte.

3) Quanto à afirmação lançada pelo jornal de que o deputado federal Eduardo Cunha teria morado em apartamento de propriedade de Funaro, deve ser esclarecido que a Folha lançou mão de informação mentirosa e cometeu o grave erro de publicar o nome de meu cliente indevidamente, uma vez que ele não possui nenhuma vinculação com o deputado.

4) Devo ressaltar que Funaro fora alvo de quebra de sigilo pela CPMI dos Correios, sendo certo que, após apuração, não houve irregularidade ou ilícito apontado pelos órgãos competentes.

5) Lúcio Bolonha Funaro nega firmemente a vinculação atribuída a ele com a empresa Serra da Carioca 2, bem como afirma jamais ter participado de qualquer tratativa com Furnas.

BEATRIZ CATTA PRETA, advogada de Lúcio Bolonha Funaro (São Paulo, SP)"

O que aconteceu?

A presidente Dilma Rousseff (PT) prometeu apurar irregularidades em Furnas, segundo texto publicado por "O Globo", em 29.jan.2011. "Nós iremos apurar o que foi divulgado. Acredito que já está sendo investigado na CGU (Controladoria Geral da União), pois não é um fato atual", disse a presidente.

Em 2.fev.2011, o jornal "O Estado de S.Paulo" publicou que Dilma decidiu trocar toda a diretoria de Furnas (composta pelo presidente e cinco diretores). Além disso, ela deve rejeitar qualquer indicação política para os cargos - o que fez os partidos passarem a buscar técnicos do setor elétrico para indicar, diz a notícia do "Estado".

O escolhido pela presidente para presidir Furnas foi Flávio Decat, ligado ao grupo do presidente José Sarney (PMDB-AP). Essa escolha fez Eduardo Cunha perder influência na estatal. Decat, segundo publicou a "Folha", em 7.fev.2011, tem no currículo punição por licitação irregular da época em que presidiu outra estatal do setor elétrico, a Amazonas Energia. "Eu aprovei a licitação para adquirir canais de dados, uma exigência da Aneel [Agência Nacional de Energia Elétrica]", disse Decat. A reportagem completa, com a explicação de Decat está disponível aqui (para assinantes do jornal e do UOL). O jornal também publicou entrevista exclusiva com Decat, também em 7.fev.2011.

O texto de 2.fev.2011 do "Estado" ainda lembra que, após tomar posse (em 1º.fev.2011), o deputado oposicionista Antonio Imbassahy (PSDB-BA) redigiu requerimento para abertura de CPI para investigar operações suspeitas em Furnas.

Também em 2.fev.2011, a coluna "Panorama Político", do jornal "O Globo", noticiou que o governo pretende boicotar a CPI de Furnas. "Não vamos assinar [o requerimento para instalar a CPI]", disse o líder do PT na Câmara, Paulo Teixeira (PT-SP), segundo a coluna.

Apesar disso, a Controladoria Geral da União (CGU) decidiu abrir investigação para apurar supostas irregularidades na compra de ações da Oliveira Trust por Furnas, noticiou "O Globo" também em 2.fev.2011. "Na segunda-feira [31.jan.2011], o ministro [da CGU] Jorge Hage determinou à Secretaria de Controle Interno, uma das estruturas da Controladoria, que faça uma auditoria nos contratos firmados por Furnas e que estão sendo alvo de denúncias", escreveu o jornal, esclarecendo que não foi divulgado prazo de término da auditoria.

O afilhado de Eduardo Cunha que tinha cargo de direção em três empresas, Aluízio Meyer de Gouvêa Costa, foi demitido uma semana após Fávio Decat assumir a presidência de Furnas, noticiou "O Globo", em 22.fev.2011.

UOL Cursos Online

Todos os cursos