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Após negar ter favorecido Delta, Pagot diz que não é "nem corrupto nem incompetente"

Camila Campanerut

Do UOL, em Brasília

28/08/2012 11h14Atualizada em 28/08/2012 18h47

O ex-diretor do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), Luiz Antonio Pagot, afirmou nesta terça-feira (28), durante depoimento à CPI do Cachoeira no Congresso, que é um "fazedor" e não cometeu irregularidades à frente da pasta. O depoimento durou mais de oito horas.

"Ainda no Mato Grosso, após eleição do governo de Blairo Maggi, participei do núcleo duro do governo e com mão de ferro fiz as reformas necessárias para as transformações do Estado. Fui o verdadeiro pau para toda obra", afirmou aos parlamentares.

Pagot negou qualquer relação com o contraventor Carlinhos Cachoeira e negou ter favorecido a empresa Delta --apesar de ter recebido pedidos neste sentido do ex-senador Demóstenes Torres (ex-DEM, sem partido-GO), com quem disse ter jantado em duas ocasiões.

"Não sou nem corrupto nem incompetente. Posso ter minhas limitações, mas no rol de incompetentes eu não estou", afirmou à comissão.

Pagot foi afastado do Dnit depois de uma série de denúncias de corrupção no órgão, que resultaram na queda do então ministro dos Transportes, atual senador Alfredo Nascimento (PR-AM), e culminaram em uma crise entre o governo Dilma Rousseff e o PR.

“No momento de minha saída [do Dnit], o cenário que se apresentou foi que minha presença à frente do Dnit não era mais necessária. Deixei a autarquia sem medo do meu passado, e sem negar a minha gestão”, afirmou ele ao concluir sua alegação inicial à CPI.

Relações com Cachoeira

Ao ser questionado sobre suas relações com Cachoeira, Pagot negou conhecer o contraventor. “Nunca conheci Carlos Cachoeira, apenas vi as fotos dele nos jornais. Nunca encontrei com Carlos Cachoeira, nunca”, frisou.

Pagot também foi questionado pelos parlamentares sobre seu conhecimento sobre a Delta, empresa que seria usada para lavar dinheiro obtido por jogos ilegais e teria Cachoeira, como sócio oculto, segundo apontam investigações da Polícia Federal.  “Não sabia da relação de Cachoeira com a Delta”.

Para Pagot, a sua saída da autarquia se deveu à influência da empresa Delta, que vinha sendo cobrada por melhor atuação nas obras que tinha com departamento.  “Pela atuação que eu vinha tendo no Dnit, eu não dava vida boa a nenhuma empresa, nenhuma empreiteira.”

"Fiquei estarrecido quando soube que minha queda do Dnit foi articulada por um contraventor", afirmou Pagot à comissão. "Foi um episódio amargo na minha vida. Depois, quando começava a me restabelecer, depois de um período em que me sentia um morto-vivo, um fantasma, tive a notícia de que um contraventor e o diretor de uma empresa tinham sido responsáveis por minha saída", afirmou. “O momento de minha saída, sem qualquer possibilidade de defesa, foi sob o prisma de absoluto isolamento.".

O ex-diretor destaca que em duas obras, uma no Ceará e outro em Pernambuco, a Delta teria, no primeiro caso, subcontratado uma empresa sem avisar a autarquia e na outra, a construtora pediu aditivos (verba extra do montante acordado em licitação) ao contrato, apesar de não cumprir as metas até aquele momento de obra. “Para o Ceará, [a atuação da Delta em pagamento de propina a servidores do Dnit] representou um atraso nas obras. Para o Dnit, causou um mal-estar, bons executores estavam apontados e tinham provas contra eles. E tomamos, junto com a CGU (Controladoria Geral da União), todas as medidas.”

Pagot esclareceu aos parlamentares sobre os aditivos. “Para obras de manutenção rodoviárias, a média nacional de aditivos do Dnit é 18%. Para obras de construção e implantação, a média de 8%. E a média de aditivos da Delta era de 11%”, afirmou Pagot com base em levantamento feito pelo próprio Dnit.

Jantares com Demóstenes

Outro tópico abordado pelos parlamentares foi a relação de Pagot com o senador cassado Demóstentes Torres. “[O ex-senador Demóstenes Torres] me confidenciou que tinha intenções de mudar para o PMDB”, afirmou Pagot. À época, Torres era senador pelo DEM e teria jantado com Pagot duas vezes.

Pagot conta que o ex-senador goiano teria ficado “furioso” com ele por ter deixado a suplência do senador Jayme Campos para focar em seu cargo de diretoria do Dnit. O primeiro jantar teria o objetivo, segundo ele, de “restabelecer relações comigo”.

No segundo jantar, o senador goiano estava acompanhado de diretores da Delta –Fernando Cavendish, Cláudio Abreu e o representante Xavier, que não soube dizer o sobrenome. Na ocasião, o senador questionou se haveria dinheiro para pagar as obras da Delta e que gostaria de ter uma obra “com o carimbo dele”. 

“Para a minha surpresa, no [segundo] jantar, estava além dele [Demóstenes Torres], os diretores da Delta. Estava o Fernando Cavendish, o Cláudio Abreu, o Xavier e um outro diretor que não me lembro", afirmou Pagot. A versão agora apresentada por Pagot desmente Cavendish e Demóstenes, que negaram se conhecer. 

"O senador [Demóstenes Torres] me perguntou várias vezes se teria dinheiro para a execução de todas as obras, que estavam programadas no PAC 1 e 2, ele insistiu nesta pergunta. Em uma sala reservada, ele [Demóstenes] me disse o seguinte: eu tenho dívidas com a empresa Delta, que tem me apoiado nas campanhas e eu preciso de alguma obra com o meu carimbo. Eu disse a ele que lamentava, que não podia atendê-lo, que não tinha proximidade nehuma com o diretor geral do Dnit para pedir: ‘reserve uma obra para Delta", disse Pagot, negando favorecimentos à empresa.

Ainda sobre a Delta, o ex-diretor voltou a dizer, como já havia dito à imprensa, o deputado federal Valdemar Costa Neto (PR-SP) atuava como “operador” da Delta nos contratos da empresa com o governo. "Ele tinha especial interesse em alguns aditivos", afirmou Pagot. 

Campanha de 2010

Pagot afirmou à CPI que contribuiu para a campanha eleitoral da presidente Dilma Rousseff em 2010. No mesmo ano, o Dnit tinha contrato com 369 empresas, e Pagot afirma ter recebido a visita do tesoureiro da campanha de Dilma, José De Filippi (PT-SP), que pediu ajuda. "As maiores você não precisa se preocupar, que é assunto do comitê de campanha. Se puder pegar umas 30, 40 empresas", teria dito o tesoureiro. Segundo Pagot, não mais que "meia dúzia" de empresas contribuíram legalmente.

Pagot ressaltou que, apesar de manter contato com Dilma quando ela ainda era ministra do governo Lula, a agora presidente nunca pediu ajuda para sua campanha à Presidência.

Ainda de acordo com Pagot, a atual ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, teria pedido pessoalmente para ele que a ajudasse na campanha eleitoral ao governo de Santa Catarina em 2010. O relato já havia sido feito anteriormente à imprensa. Segundo ele, em 2010, Ideli o procurou para tratar de três convênios relacionados ao Estado de Santa Catarina. No final da reunião, ela teria dito: “Sou candidata ao governo e preciso que me indique empresas para que eu possa buscar recursos.” Ele disse que negou o pedido. 

“Disse a ela que não podia indicar [doadores de campanha] e que não faria. E a senadora, acredito, ficou contrariada”, relatou. Em nota, Ideli negou ter feito o pedido. Questionado novamente sobre o assunto, Pagot manteve sua versão e disse que estaria disposto a fazer uma acareação com a ministra.

Outro pedido que deixou Pagot "constrangido", segundo ele relatou à CPI, foi o do ex-ministro Hélio Costa. "Fiquei extremamente constrangindo e ameaçado [pelo ex-ministro Hélio Costa]. Ele chegou com toda sua entourage, com todo seu staff. E veio me procurar no sentido de procurar empresas para que ele pudesse fazer arrecadação", afirmou.

Embora admita que pediu apoio a empresas na campanha eleitoral, Pagot afirma que não vinculou qualquer contrapartida.

Sem novidades

O senador Pedro Simon (PMDB-RS) pediu a palavra para criticar a demora de Pagot em depor à CPI. "A água esfriou e a CPI já saiu das capas dos jornais. Nessa circunstância, Pagot vem depor", disse Simon. O relator da comissão, deputado Odair Cunha (PT-MG), se defendeu: "Se vem, sou criticado [pela demora]. Se não vem, sou criticado", afirmou. "Pagot pode dizer o que ele quiser dizer em qualquer espaço", rebateu Cunha.

"Depois de mais de oito horas de uma entrevista como essa, é difícil [fazer as considerações finais]. Mas eu gostaria que nós tivéssemos oportunidade de nos encontrarmos em uma dessas comissões [como a de infraestrutura e transporte], em que eu possa contribuir para que as contratações de obras públicas no Brasil sejam feitas de melhor forma. Para que deputados e senadores construíssem um novo arcabouço de leis", afirmou Pagot ao concluir seu depoimento à CPI.

"Eu precisava fazer uma defesa da gestão do Dnit. [Mostrar] O tanto que se trabalhou no Dnit de 2007 a 2011", disse o ex-diretor ao final da sessão.

Próximos depoimentos

Para esta terça-feira, o dono das empresas JSM Terraplenagem e SP Terraplenagem, Adir Assad, também foi chamado para depor como testemunha à CPI. Assad é apontado como um dos empresários que teria sido usado como "laranja" pelo contraventor no esquema com a construtora Delta.

Assad chega à CPI munido de habeas corpus, o que permite que ele se mantenha em silêncio para evitar que sua fala crie provas contra ele mesmo. A exemplo de outras testemunhas com a liminar, o presidente da comissão deve dispensá-lo, caso ele insista em permanecer em silêncio.

Nesta quarta-feira (29), outro aguardado depoimento está marcado: o do ex-presidente da Delta, Fernando Cavendish. O empresário entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal para não comparecer à comissão.

Cavendish comandava a Delta, uma das empresas com mais contratos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) do governo federal.

As denúncias também afastaram a holding J&F, que controla o frigorífico JBS, da ideia de comprar a Delta, que está saindo dos consórcios para construção de grandes obras, incluindo as da Copa do Mundo no Rio de Janeiro (RJ) e Fortaleza (CE).

Sobre o silêncio de testemunhas

Depois de ouvir reclamações seguidas de vários parlamentares, o presidente da CPI, Vital do Rêgo (PMDB-PB), afirmou que não poderá segurar a testemunha na comissão caso ela se recuse a falar, e continuará a adotar o padrão definido entre os integrantes da comissão de liberar o depoente que não quiser falar e tiver um habeas corpus que o sustente.

“Os senhores sabem que a minha postura aqui não é imperial e nunca será. Eu sou refém do colegiado. Se os senhores decidirem, em uma próxima reunião administrativa, mudar novamente o rito... Mas agora, nesta reunião, antes de uma próxima reunião administrativa, o que vou fazer é apenas ler a ementa e fazer comentários sobre os requerimentos dos senhores para relembrar aquilo que os depoentes têm no juízo de seus valores para chegar aqui”, explicou o senador peemedebista.

Vital do Rêgo disse ainda que os documentos restantes da Operação Monte Carlo, entregues na última sexta-feira pela Polícia Federal, estarão catalogados e à disposição para consulta dos integrantes da comissão nesta quinta-feira.