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Juiz põe sob suspeita pagamento de R$ 21 milhões a marqueteiro João Santana por campanha de Haddad

Guilherme Balza e Julianna Granjeia

Do UOL, em São Paulo

12/12/2012 20h57Atualizada em 13/12/2012 13h25

O juiz eleitoral Paulo Furtado de Oliveira Filho, da 6ª Zona Eleitoral (Vila Mariana), que desaprovou a prestação de contas da campanha de Fernando Haddad (PT) à Prefeitura de São Paulo, colocou sob suspeita o pagamento de R$ 21 milhões da campanha do prefeito eleito ao publicitário João Santana, marqueteiro do petista.

A campanha de Haddad declarou ter pagado R$ 30 milhões à empresa Polis Propaganda & Marketing LTDA. pelos serviços de publicidade prestados na disputa eleitoral, montante que representa 44,70% do total gasto na campanha.

De acordo com a prestação de contas, até a véspera do segundo turno R$ 9 milhões foram declarados em notas fiscais --30% do total recebido pela empresa. Um dia antes do segundo turno, foram emitidas 21 notas sequenciais no valor de R$ 1 milhão para completar os R$ 30 milhões.

Segundo o juiz, a empresa não descreveu quais serviços foram prestados para justificar o recebimento do valor. Para Oliveira Filho, as notas foram emitidas para dar suporte a dívidas adquiridas ao longo da campanha sem prestação de contas.

“Como se vê, a ausência da planilha de descrição dos serviços, o pagamento aleatório de 30% do valor contratado, bem como a emissão de 21 notas fiscais ao final da campanha eleitoral pelo saldo de R$ 21 milhões, para dar suporte à assunção da dívida pelo partido, comprometem a verificação do serviço que efetivamente foi prestado pela Polis e, mais, de sua correspondência com os gastos apresentados.”

Em seguida, o magistrado afirmou que “as irregularidades são graves” e impedem a “verificação da origem dos recursos arrecadados para a quitação de todas as despesas assumidas pelo candidato.”

Antes de trabalhar na campanha de Haddad, Santana foi marqueteiro do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da presidente Dilma Rousseff. Ele também trabalhou na campanha do venezuelano Hugo Chávez, reeleito presidente em outubro deste ano.

A reportagem telefonou para dois números da Polis –em São Paulo e em Salvador--, mas ninguém atendeu a ligação. O publicitário também não foi localizado em sua residência na capital baiana.

O vereador Chico Macena, tesoureiro da campanha de Haddad, afirmou que não houve irregularidades nas prestações de contas e que no recurso irá esclarecer todas as dúvidas do juiz.

“A gente foi emitindo nota [durante a campanha] segundo o fluxo de caixa. Ficou uma dívida de R$ 21 milhões. A gente consultou juridicamente como podia ser feito [a apuração da dívida], se através de contrato ou através de nota, e fomos informados que era através da nota fiscal. Tínhamos duas opções: emitir uma nota de R$ 21 milhões ou 21 notas de R$ 1 milhão. A opção [escolhida] de 21 notas de R$ 1 milhão é porque eu ainda tinha mais 30 dias para arrecadar. Eu poderia arrecadar R$ 1 milhão, R$ 2 milhões, R$ 3 milhões, e pagar segundo estivesse dentro da lei que o Tribunal coloca de possibilidade legal, de ainda estar pagando [a dívida] nos 30 dias posteriores. Se eu conseguisse o suficiente, tinha que ser apurado como divida e o diretório assumir. Foi isso o que foi feito”, afirmou o vereador.

Contas rejeitadas

A desaprovação das prestações de contas do candidato não impede a sua diplomação. Na decisão, além das contas da Polis, o juiz diz que as informações prestadas são inconsistentes. Para Oliveira Filho, há irregularidade na contratação, no valor de R$ 4,6 milhões, da empresa AJM de Azevedo Eletrônicos-EPP.

O magistrado afirma que a empresa não emitiu notas fiscais eletrônicas, teria fornecido carros de som e material publicitário em volume muito acima a sua capacidade de estocagem, pois está instalada em imóvel de pequeno porte, além de o candidato ter locado veículos de som no mesmo valor com empresa diversa.

Oliveira Filho afirma que esse fato permite “a conclusão de que se trata da mesma despesa paga em duplicidade, já que nos autos não há menção a quais veículos dirigiu-se a contratação da outra empresa”. Portanto, segundo o juiz, não há elementos convincentes da regularidade das despesas efetuadas pelo candidato com a empresa AJM.

A coordenação da campanha de Haddad informou que irá recorrer da decisão "com documentação suplementar para comprovar a efetiva prestação dos serviços das empresas AJM de Azevedo Eletrônicos-EPP e da Polis Propaganda e Marketing Ltda, sanando todas dúvidas suscitadas pelo juiz".

Macena afirmou que acredita em um erro de interpretação do juiz no caso da locação de 150 Kombis com equipamento de som da  empresa AJM de Azevedo Eletrônicos-EPP.

"Esse mesmo tipo de serviço foi contratado de outras empresas. Não houve duplicidade. Eu contrato 100 Kombis de um, 100 de outro, 30 de outra, não tem uma empresa capaz de fornecer tudo e gerenciar tudo isso. Vamos ter oportunidade de levar toda a documentação, com placas, nome dos motoristas, no recurso", disse o vereador.

Diretório Municipal

Oliveira Filho reprovou, em outro processo, a prestação de contas do Diretório Municipal do PT relativa às eleições municipais deste ano.

O magistrado apontou como irregular a ausência de declaração de R$ 132 mil doados por Jofege Pavimentação e Construção Ltda.

O julgamento das contas do diretório municipal também aponta para a omissão de despesa com serviço da Caso Sistema de Segurança, empresa da mulher de Freud Godoy, ex-assessor pessoal do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e envolvido no escândalo que ficou conhecido como dos aloprados.

O juiz afirmou que o diretório não apresentou documento comprovando que o gasto não era destinado à campanha.

Na decisão, o juiz também suspendeu o repasse de recursos do fundo partidário das direções nacional e regional ao diretório municipal do partido pelo período de quatro meses. Já a prestação de contas do comitê financeiro municipal único foi aprovada.

A 6ª zona eleitoral de São Paulo foi designada pelo TRE (Tribunal Regional Eleitoral) para julgar as prestações de contas referentes às eleições municipais na capital.

O Diretório Municipal do PT informou que, no caso da empresa Jofege, a doação foi feita ao Diretório Nacional. E, na checagem do TSE, apareceu como doação ao diretório municipal.

O PT também informou que vai recorrer da decisão com documentação suplementar sobre o contrato da empresa.

Dívida

Haddad terminou sua campanha com uma dívida de R$ 26 milhões, segundo dados entregues pelo candidato à Justiça Eleitoral. Ele informou ter arrecadado R$ 42 milhões e ter tido despesas de R$ 68 milhões.

O maior gasto do petista foi com o marqueteiro João Santana, que recebeu cerca de R$ 30 milhões pela propaganda da campanha --incluindo programas de rádio e televisão. Haddad gastou ainda outros R$ 11 milhões com publicidade impressa e por meio de carros de som.

Do total arrecadado, R$ 38 milhões (90%) foram recebidos por meio de doações intermediadas pelo partido, as chamadas doações ocultas.

A prática não é ilegal, mas impossibilita que se conheça o doador original do dinheiro. Por isso, o recurso é usado por empresas que não querem ter seu nome diretamente associado aos candidatos.

A maioria desses recursos foi repassada via Direção Nacional do PT. A instância partidária recebeu R$ 177 milhões em doações. Sua maior financiadora foi a Andrade Gutierrez, com R$ 18 milhões.

Prestação de José Serra (PSDB)

A prestação de contas do candidato tucano derrotado à Prefeitura de São Paulo, José Serra, ainda não foi julgada.

O prazo para a Justiça Eleitoral apreciar a documentação dos candidatos derrotados vai até 31 de julho de 2013. Para os candidatos eleitos, terça-feira (11) foi o último dia do prazo para a publicação da decisão do juízo, já que a diplomação será feita até a próxima quarta-feira (19).