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Na onda do blog de Dirceu, ex-detento relata como escrevia coluna na prisão

Luiz Alberto Mendes, 61, começou a escrever para a revista "Trip" quando ainda estava preso  - Arquivo pessoal
Luiz Alberto Mendes, 61, começou a escrever para a revista "Trip" quando ainda estava preso Imagem: Arquivo pessoal

Juliana Carpanez

Do UOL, em São Paulo

07/12/2013 07h01

Luiz Alberto Mendes, 61, cumpriu 31 anos e dez meses de prisão em diversas penitenciárias do Estado de São Paulo. Dois anos antes de ser solto – o que aconteceu em 5 de abril de 2004 -, ele começou a escrever uma coluna publicada mensalmente na revista “Trip”. Diante do pedido do ex-ministro José Dirceu, que pretende atualizar seu blog dentro da prisão, o UOL conversou com Mendes para saber como foi sua experiência.

Questionado sobre o que Dirceu deveria escrever no blog, Mendes sugeriu: “Suas impressões e sentimentos relacionados ao fato de estar preso”. Ele também acha que o ex-ministro deveria incluir em seus protestos no blog “os direitos não cumpridos de pessoas aprisionadas”.

O ex-ministro da Casa Civil foi condenado a 7 anos e 11 meses de prisão por corrupção ativa e está preso no Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília. Ele também foi condenado pelo crime de formação de quadrilha, mas sua condenação será julgada novamente em 2014.

O blog de José Dirceu continua sendo atualizado por uma equipe.  O pedido de atualização pelo próprio Dirceu, feito advogado José Luis Oliveira Lima, é mantido em sigilo – por isso, não se sabe como ele faria as postagens. No caso de Mendes, as colunas eram escritas em cartas e chegaram a ser digitadas em um computador sem acesso à internet.

Mendes tomou gosto pela escrita dentro da prisão. Na segunda-feira (9), ele lançará seu quinto livro, Desconforto (Editora Reformatório), na livraria Martins Fontes da avenida Paulista (São Paulo).

Condenado a mais de cem anos de prisão por assalto à mão armada e homicídio, ele começou a cumprir pena em maio de 1972. Hoje mora em Embu das Artes (SP), mantém a coluna e um blog na “Trip”, além de uma oficina de escrita e leitura.  Em entrevista por e-mail, ele relatou como foi a experiência de manter a coluna dentro da prisão.

UOL - Quando você começou a escrever a coluna na “Trip” e como conseguiu esse espaço?

Luiz Alberto Mendes - Comecei a escrever na “Trip” há 12 anos, ainda preso. O editor da revista, Paulo Lima, teve a ideia de uma pessoa que morava em Londres [o cineasta Henrique Goldman] escrever sobre o mundo externo e eu, de uma cela, escrever sobre o mundo interno. Ele me convidou, deu certo, temos a coluna Mundo Livre até hoje.

UOL - Como o Paulo Lima chegou até você?

Mendes - Porque eu escrevi o livro "Memórias de um Sobrevivente". Ele gostou demais do livro, que foi publicado há 12 anos pela Cia. das Letras e ainda vende até hoje. Ele teve a ideia de me oferecer a coluna talvez porque tenha pensado que escrevo bem, quem sabe?

UOL - Como era o esquema para envio das cartas? Você chegava a receber a revista com o texto publicado?

Mendes - Eu fazia os textos e mandava registrado pelo correio. Havia uma certa colaboração da parte do setor de educação da prisões, pois eram eles que censuravam as cartas e as encaminhavam.

UOL - O presídio sabia da sua coluna? Fazia algum tipo de censura do conteúdo?

Mendes - Os textos passavam pelo setor de censura das prisões. Nenhum dos meus textos foi bloqueado pela censura e eu escrevi quase dois anos na revista, ainda preso.

UOL – Acredita que teria recebido esse mesmo benefício se precisasse usar o computador dentro da cadeia?

Mendes - Cheguei a usar um laptop 486 Digimac, que ganhei do escritor Fernando Bonassi. Mas somente no setor de educação, somente para escrever e absolutamente sem internet.

UOL – Caso o benefício de atualizar o blog seja concedido a Dirceu, teria alguma dica para o ex-ministro sobre esse conteúdo? Algo que ele deva ou não postar em seu blog?

Mendes - Sim, que ele nos diga de suas impressões e sentimentos relacionados ao fato de estar preso. Que continue paladino e que também inclua em seus protestos os direitos não cumpridos das pessoas aprisionadas.