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Cai imagem de 'intocável', mas nasce o Lula 'perseguido', diz professor

Gabriela Fujita

Do UOL, em São Paulo

04/03/2016 15h00

O efeito imediato da 24ª fase da operação Lava Jato, realizada nesta sexta-feira (4), é o enfraquecimento da imagem de "intocável" que Luiz Inácio Lula da Silva sustenta há anos, ao mesmo tempo em que a operação da Polícia Federal abre ao ex-presidente da República uma oportunidade de consolidar uma imagem de "perseguido", afirma o cientista político Marco Antonio Carvalho Teixeira, professor da FGV (Fundação Getúlio Vargas), em São Paulo.

"Lula fica arranhado por um lado, mas ganha esse outro personagem, de alguém que está sendo perseguido pelo que fez", disse. 

Para Teixeira, a imagem do "injustiçado" e do "perseguido pelas elites e pela mídia" vai ser utilizada de qualquer maneira pelo PT no processo eleitoral, porque a condução da Lava Jato abriu espaço para essa retórica.

Não houve pedido de prisão expedido contra Lula, que foi ouvido hoje pela Polícia Federal por pouco mais de quatro horas, em uma sala no aeroporto de Congonhas, em São Paulo. Mas o ex-presidente foi obrigado a depor (o que é chamado de condução coercitiva).

Em nota, o Instituto Lula classificou a estratégia da PF de "violência injusta, injustificável, arbitrária e ilegal".

O procurador da República Carlos Fernando Lima, integrante da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba (PR), disse que optou-se pelo mandado de condução coercitiva para evitar comoção popular. 

O cientista político ouvido pelo UOL considera que não ficou claro se havia necessidade de a PF agir nestes moldes.

“Na medida em que não houve qualquer intimação anterior, a pessoa está em seu endereço, não demonstra qualquer intenção de se evadir ou de se esconder, acho que não faz sentido, ainda mais em se tratando de um ex-presidente da República", explica.

"Imagino ser exagerado o argumento de uma possível comoção social para justificar a condução coercitiva"

Ainda assim, o papel de vítima não é forte o suficiente para reverter os danos provocados até aqui, afirma o professor.

"Estamos falando de alguém que saiu do governo com mais de 80% de aprovação, que fez sua sucessora, que bancou o prefeito de São Paulo e que participava de campanhas em outros países, além de ter recebido várias condecorações internacionais, inclusive em universidades. Essa imagem parece ter sido definhada completamente, a não ser que se prove que tudo foi uma grande injustiça, algo que os fatos parecem não demonstrar."

Para Teixeira, a defesa de Lula e do PT baseia-se na reação pontual e "muitas vezes desastrosa".

"Desastrosa justamente porque o governo não sabe como reagir. Eles estão reagindo conforme o momento, não têm uma estratégia", afirmou.

De pronto, avalia o professor, as suspeitas envolvendo o ex-presidente são algo "devastador para o projeto político imediato do PT" e "enfraquecem ainda mais o governo na busca por estabilidade que permita não apenas concluir mandato, mas principalmente encontrar um rumo para a economia do país".

"A confiança social, importante para a credibilidade da presidente, parece ser algo que dificilmente será recuperada”

As consequências futuras ainda não estão muito claras, acredita ele, ainda mais quando se leva em conta uma das principais características da Lava Jato: a imprevisibilidade. Sendo assim, o que pode ser esperado, neste momento, é uma provável baixa nos quadros do partido.

"O efeito imediato é para o processo eleitoral. Como a legislação eleitoral de troca de partido mudou, não é mais um ano antes, e sim seis meses antes, até o final de março quem quiser mudar vai mudar. E vai mudar muita gente. As pessoas vão fazer um cálculo do tamanho do estrago para viabilizar suas candidaturas", conclui Teixeira.