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Urbanistas dizem que Brasília foi feita para a paz e não para a guerra

Muro de 1 km de extensão divide a Esplanada para separar manifestantes - Márcio Neves/UOL
Muro de 1 km de extensão divide a Esplanada para separar manifestantes Imagem: Márcio Neves/UOL

Wellington Ramalhoso

Do UOL, em Brasília

14/04/2016 06h00

O muro erguido na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, para evitar confrontos entre manifestantes pró e contra o impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) provoca arrepios em arquitetos e urbanistas, mas eles admitem que a medida de segurança tomada pelo governo do Distrito Federal em função do aumento da tensão política é necessária.

“É uma decisão que parece bizarra, mas para situações extraordinárias você tem que tomar decisões extraordinárias. Essa situação [o pedido de impeachment] está dividindo a população e há muita radicalização no ar”, afirma Frederico Flósculo, professor do Departamento de Projeto, Expressão e Representação em Arquitetura e Urbanismo da UnB (Universidade de Brasília).

“Brasília é uma cidade feita para a paz, é uma cidade aberta. Brasília é cordialíssima. Não estamos preparados para cenas violentas e de radicalismo”, prossegue Flósculo.

Na avaliação do professor, até Lúcio Costa (1902-1998), arquiteto e urbanista responsável pela elaboração do plano de Brasília no fim da década de 1950, concordaria com a necessidade do muro neste momento. Para Flósculo, se o muro não fosse erguido, haveria o risco de uma batalha campal na Esplanada no dia da votação na Câmara. “A arquitetura que nos desculpe, mas segurança é fundamental.”

Erguido no fim de semana passado pelo governo do Distrito Federal, comandado por Rodrigo Rollemberg (PSB), o muro tem estrutura metálica, dois metros de altura e é provisório. A Esplanada dá acesso à praça dos Três Poderes, onde se situam o Congresso e o Palácio do Planalto. Os grupos pró e contra impeachment ficarão de lados opostos na Esplanada.

Falta de civilidade

Emilia Stenzel, professora de arquitetura e urbanismo do Uniceub (Centro Universitário de Brasília) e conselheira do IAB-DF (Instituto de Arquitetos do Brasil - Departamento Distrito Federal), diz que a decisão de construir o muro parte do pressuposto de que não há civilidade na ação dos dois lados. “As forças de segurança pressupõem que possa haver confronto. E pode mesmo.”

“O muro me incomoda, mas a segurança tem razão. Não demonizo o pessoal da segurança. Mas é uma vergonha [que tenhamos chegado a esse ponto]”, afirma a professora.

Por outro lado, diz ela, o muro é um incentivo ao “comportamento pouco civilizado”. “De um lado, [a construção do muro] é uma atitude realista das forças de segurança pressupor que pessoas estão numa cruzada. De outro, é capitular à falta de civilidade e começar a agir a partir desse parâmetro.”

Emilia ressalta que Lúcio Costa concebeu a Esplanada como um espaço de manifestação cívica e democrática. O que se vê agora, no entanto, é um clima de guerra, diz a arquiteta. “A democracia necessita do diálogo. A guerra é a negação da política. A Esplanada não merecia esse muro.”

O conjunto urbanístico de Brasília é tombado como patrimônio cultural. Em nota, o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) afirmou que não lhe cabe interferir nas medidas de segurança. “A manutenção de segurança em espaços públicos, com utilização temporárias de grades, reforço no efetivo ou outra medida julgada pertinente, cabe às autoridades competentes da área de segurança. Não é atribuição do Iphan responder pela segurança pública da cidade.”