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É preciso reduzir o foro privilegiado no Brasil, diz Barroso

O ministro Luís Roberto Barroso, do STF - Publius Vergilius/Folhapress
O ministro Luís Roberto Barroso, do STF Imagem: Publius Vergilius/Folhapress

Wellington Ramalhoso

Do UOL, em São Paulo

23/05/2016 11h11

Luís Roberto Barroso, ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), disse nesta segunda-feira (23) em São Paulo, durante debate promovido pela revista "Veja" sobre o legado da operação Lava Jato e do processo do mensalão, que é preciso acabar ou reduzir drasticamente o foro privilegiado no Brasil, reservando-o "apenas para um número muito pequeno de autoridades". 

Deu três razões principais como justificativa. A primeira foi como uma origem filosófica, por ser "uma reminiscência aristocrática" e "não republicana". A segunda indicou ser estrutural: "O STF não está equipado e nem é o foro adequado para fazer esse tipo de juízo de primeiro grau. O mensalão durou um ano e meio e ocupou 69 sessões do Supremo". A terceira causa foi "de justiça". "Frequentemente leva à impunidade, porque ele é demorado e permite a manipulação da jurisdição", disse, ressaltando que já houve 369 inquéritos e 102 ações contra parlamentares. "O prazo médio de aceitação de uma denúncia no STF é de 617 dias. Se for julgado numa instância de primeiro grau, isso leva no máximo uma semana."
 
Afirmou que desde que o Supremo começou a julgar parlamentares, em 2001, já houve 59 casos de prescrição de crimes. Para evitar isso, sugeriu a criação de uma vara especializada em Brasília, com um juiz escolhido pelo Supremo, por um mandato de quatro anos, com os auxiliares necessários. "Seria o único juiz para dar unidade a essas decisões. Aí caberia recurso no STF ou no STJ [Superior Tribunal de Justiça], conforme o foro da autoridade.”
 

Justiça mansa com os ricos

Barroso declarou que “a Justiça brasileira é mansa com os ricos e dura com os pobres”, feita para punir pequenos deliquentes. Com bons advogados, afirmou o ministro, escapava-se de condenações.
 
"A regra sempre foi a impunidade. Mas houve uma mudança vertiginosa na atitude da sociedade e dos tribunais em relação a práticas que nos levavam a aceitar o inaceitável. A sociedade passou a reagir, e o Judiciário ouviu a sociedade e interpretou esse sentimento. O marco emblemático dessa mudança foi o julgamento do mensalão, em que pela primeira vez agentes públicos e privados foram condenados e encarcerados. Na Lava Jato, muitos se apressaram em fazer acordos de delação para não ter o mesmo fim daqueles do mensalão", disse.
 
"Estamos dando objetividade à reação contra a corrupção. Corrupção é um mal em si - não é exclusividade de um governo. A mudança que estamos procurando produzir é a valorização dos bons no lugar da valorização dos espertos."
 

“Elite precisa aceitar a condenação de seus corruptos”

Nesse sentido, ele afirmou que a elite do país “precisa aceitar a condenação” de seus corruptos e criticou a forma como boa parte do sistema capitalista tira proveito do Estado brasileiro. Trata-se, segundo Barroso, de “um modelo de capitalismo que não gosta de risco e competição”. “O capitalismo no Brasil gosta de financiamento público, de reserva de mercado e de cartelização. Isso não é capitalismo. É socialismo para os ricos.”
 
O ministro do STF disse que o “avanço civilizatório” também depende de mais ética no espaço privado, e não só no público.
 
Questionado sobre a possibilidade de prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ele declarou que “as pessoas não devem supor que prisões específicas ou alinhadas é que vão mudar o que está acontecendo”. O magistrado disse que o foco deve ser o sistema e defendeu uma reforma política que barateie as eleições.
 

Declarações de Romero Jucá

Luís Barroso comentou a reportagem publicada hoje pelo jornal “Folha de S.Paulo” que revelou conversas em que o ministro do Planejamento, Romero Jucá, sugeriu ao ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado que uma "mudança" no governo federal resultaria em um pacto para "estancar a sangria" representada pela operação Lava Jato, que investiga ambos. O pacto, segundo Jucá, envolveria o Supremo Tribunal.
 
O ministro do STF afirmou que os magistrados vivem para as próprias biografias e não para as dos outros. “É impensável hoje que alguém tenha a capacidade de paralisar as investigações e influenciar o STF. Acesso para pedir audiência todo mundo tem, é recebido. Acesso no sentido de influenciar não acontece”.
 

Como funciona o foro privilegiado para políticos?

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