Topo

Investigado no mensalão tucano, publicitário mantém contratos com o PSDB

Leandro Prazeres

Do UOL, em Brasília

19/10/2016 06h00Atualizada em 19/10/2016 12h38

Enquanto o processo que apura responsabilidades sobre o chamado mensalão tucano se arrasta na Justiça de Minas Gerais, o diretório nacional do PSDB contratou, em 2015, a empresa do publicitário Valter Eustáquio Gonçalves, apontado pela Polícia Federal como um dos participantes do esquema de desvio de recursos públicos do governo mineiro coordenado pelo publicitário Marcos Valério e que, segundo a Justiça mineira, beneficiou o ex-governador tucano Eduardo Azeredo. A empresa recebeu R$ 105.581,25 (divididos em três pagamentos de R$ 35.193,75), pagos com recursos do fundo partidário. A direção nacional do PSDB e Valter Eustáquio negam irregularidades nos contratos entre ambos. 

O fundo partidário, cujo nome oficial é Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos, é um montante repassado todos os anos pelo poder público para os partidos formalmente registrados junto ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Para receber o dinheiro, que serve para atividades partidárias, as siglas devem estar com suas prestações de conta em dia. Em 2015, o fundo distribuiu R$ 867 milhões aos partidos. A análise das contas dos partidos é feita pela Asepa (Assessoria de Exame de Contas Eleitorais e Partidárias), vinculada ao TSE, e isso ainda não tem prazo para ocorrer.

Nesta semana, o UOL publicou uma série de reportagens mostrando como os três partidos que mais recebem dinheiro do fundo -- PT, PSDBPMDB  -- gastam esses recursos. Há desde viagens de dirigentes pagas com dinheiro público a financiamento de churrascos e contratação de assessores.

O PSDB foi o segundo partido que mais recebeu recursos do fundo partidário em 2015 -- foram R$ 96 milhões. O partido só ficou atrás do PT, com R$ 116 milhões. Em terceiro lugar, ficou o PMDB, com R$ 92 milhões.

Valter Eustáquio é sócio-administrador da empresa Pro-Ativa Planejamento e Assessoria de Mídia Ltda, com sede em Belo Horizonte. Em 2015, o PSDB, por meio do Diretório Nacional do partido, contratou a Pró-Ativa para, segundo a legenda, fazer a “distribuição de informação para jornais do interior”. De acordo com as notas fiscais apresentadas pelo PSDB ao TSE, o partido fez três pagamentos que, totalizados, somam R$ R$ 105,5 mil entre novembro e dezembro de 2015.

A reportagem do UOL não conseguiu localizar relatórios ou outros documentos que comprovem que o serviço contratado foi efetivamente prestado na prestação de contas apresentada pela legenda ao TSE. Tais documentos, porém, podem vir a ser solicitados pela Asepa, órgão responsável pela fiscalização das contas prestadas pelos partidos, se os técnicos acharem necessário.

Segundo a PF, Valter Eustáquio recebeu R$ 1,12 milhão de empresas de Marcos Valério que foram, posteriormente, destinados ao caixa dois da campanha de Azeredo. Parte desses recursos, diz a PF, foi desviado da Copasa (Companhia de Saneamento de Minas Gerais). Para a PF, “Valter Eustáquio deve responder pelo crime de lavagem de dinheiro praticado em associação com os representantes da SMP&B por ter dissimulado e ocultado a destinação do total de R$ 1.120.000 em 1998”.

Valter Eustáquio foi indiciado pela PF, mas acabou não sendo denunciado pelo Ministério Público no processo.

Outro lado

Questionado pelo UOL sobre as relações comerciais entre o PSDB e a Pró-Ativa, a legenda, por meio de sua assessoria de imprensa, disse desconhecer a informação sobre o indiciamento de Valter Eustáquio pela PF. O partido disse ainda que entrou em contato com Eustáquio que, por sua vez, negou fazer “parte da denúncia apresentada no âmbito do que foi chamado de mensalão mineiro”.

Por meio de sua assessoria de imprensa, o PSDB disse ainda que a Pró-Ativa “cumpriu com todas as obrigações" previstas no contrato entre a legenda e a empresa. 

O PSDB enviou, ainda, duas certidões negativas, apresentadas por Eustáquio, que comprovariam a inexistência de procedimentos judiciais contra ele.

Indagado sobre se o relacionamento comercial entre o PSDB e a empresa de uma pessoa indiciada por envolvimento no caso causava constrangimento ao partido, a sigla não se pronunciou.

A reportagem do UOL tentou nos dias 8, 9, 10, 11, 16, 17, 18 e 19 de agosto, contatar, via telefone, Eustáquio, mas as chamadas telefônicas feitas ao número cadastrado junto à Receita Federal não foram atendidas.

azeredo psdb - Pedro Ladeira/Folhapress - Pedro Ladeira/Folhapress
O ex-deputado governador de MG Eduardo Azeredo foi condenado a 20 anos por crimes relacionados ao mensalão tucano
Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

O que foi o mensalão tucano?

O esquema conhecido como mensalão tucano, segundo a Polícia Federal e a PGR (Procuradoria-Geral da República), teria ocorrido em 1998. Segundo as investigações, Marcos Valério operava um esquema para ocultar a origem e o destino de aproximadamente R$ 28,5 milhões em recursos ilícitos que teriam financiado a campanha à reeleição do então governador Azeredo – ele acabou não sendo reeleito à época. Parte desses recursos era oriunda de empréstimos contraídos por empresas de Valério, que, por sua vez, eram pagos com verbas públicas em contratos fraudulentos.

Em 2015, Azeredo foi condenado em primeira instância a 20 anos por sete crimes relacionados ao mensalão tucano, entre eles lavagem de dinheiro e peculato. A defesa de Azeredo alega que ele é inocente e recorreu da decisão da Justiça mineira.