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Fachin deu aula a membros da Lava Jato na UFPR, e pares o têm como "incorruptível"

Luiz Edson Fachin durante sua posse no STF, em junho de 2015 - Fellipe Sampaio/SCO/ STF
Luiz Edson Fachin durante sua posse no STF, em junho de 2015 Imagem: Fellipe Sampaio/SCO/ STF

Rafael Moro Martins

Colaboração para o UOL, em Curitiba

02/02/2017 19h42Atualizada em 03/02/2017 11h46

Sorteado nesta quinta-feira (2) novo relator dos processos da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Edson Fachin tem algo em comum com o juiz Sergio Moro, responsável pelos processos da operação na primeira instância: ambos são professores na Universidade Federal do Paraná (UFPR).

"Aqui, o relacionamento deles era de simples colegas", contou ao UOL um docente do curso de Direito, que pediu para não ser identificado. "Nunca deram aulas no mesmo turno. Moro leciona sempre à noite; Fachin dava aulas pela manhã. Moro dá suas aulas e vai embora. Não vive a faculdade. Fachin, não. Foi coordenador do curso, tem uma geração de orientandos da pós-graduação. Ele respirava a faculdade 24 horas por dia até ir ao STF."

A comparação dá a medida do respeito que Fachin merece de seus pares na UFPR. O ministro, que atuou na instituição entre 1991 a 2016 --quando se licenciou por conta dos compromissos na corte suprema --, é visto nos corredores do prédio neoclássico da praça Santos Andrade, centro de Curitiba, como dono de um currículo dos mais robustos entre os juristas brasileiros e como o responsável, como professor e coordenador, por fazer o curso subir de nível.

"Moro chama a atenção da mídia, mas o que fez crescer a reputação do curso foi a nomeação de Fachin para o STF e, antes ainda, o fato de termos um programa de pós-graduação entre os melhores do país --algo que também devemos em muito a ele", diz o docente.

"Reúne as melhores credenciais acadêmicas"

"Fachin era o coordenador do curso quando o programa de pós-graduação em Direito se tornou referência nacional. Sempre foi um dos grandes nomes da ciência jurídica na área dele, o direito civil. Ele criou uma escola de pensamento na área que se tornou muito influente", afirma o reitor da UFPR, Ricardo Marcelo Fonseca. Como Fachin, Fonseca foi professor e coordenador da faculdade de Direito.

"É uma pessoa com enorme capacidade de trabalho, altamente comprometida com seu ofício, da maior retidão e integridade e com muito equilíbrio, prudência, bom senso e temperança, além de grande conhecimento jurídico", fala o reitor.

"Ele reúne as melhores credenciais acadêmicas. Chegou a professor titular de Direito Civil (topo da carreira acadêmica). É um de nossos maiores juristas. Estudou no exterior, tem um intercâmbio de pesquisas com o Instituto Max Plank [de Munique, Alemanha]", corrobora a professora Vera Karam, atual diretora do setor de Ciências Jurídicas da UFPR.

"Fachin é muito conhecido internacionalmente, tem relações muito estreitas com o mundo acadêmico fora do Brasil, o que não é muito comum no Direito", assevera Carlos Frederico Marés, professor de direito sócio-ambiental na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), ex-presidente da Funai no governo FHC e ex-sócio do ministro em um escritório de advocacia em Curitiba.

"Fachin tem uma postura muito ponderada", avalia um docente que não quis ser identificado. "É muito mais de diálogo do que o juiz Moro, que tem uma postura do direito penal mais punitivo."

"Eu o considero incorruptível"

Marés foi colega de Fachin na procuradoria-geral do Estado e em um escritório de advocacia em Curitiba --compartilhado também com a mulher do ministro, Rosana Amara Girardi Fachin, atualmente desembargadora no Tribunal de Justiça do Paraná. Ainda é amigo pessoal de ambos, embora os encontros tenham se tornado cada vez mais raros, por conta das agendas profissionais.

"Todo o lazer dele está ligado diretamente à família, aos netos, à esposa", diz Marés. "Não vejo no STF nenhum ministro mais independente e constrito que ele mesmo. Não sei dizer se algum dos ministros cederia aos muitos encantos de Brasília, mas sei que Fachin não cederia. O considero incorruptível."

Fachin, Rosana e Marés trabalhavam juntos nos anos 1990. "Fachin não advogava muito por ser procurador do Estado", lembra Marés. A legislação permite que procuradores que fazem parte dos quadros desde antes da Constituição de 1988 mantenham escritórios de advocacia --caso dos três.

O novo relator da Lava Jato no STF demitiu-se da procuradoria após alguns anos para dar mais atenção ao escritório, que atua na área de sua especialidade --direito civil. Rosana defendeu o hoje senador Roberto Requião (PMDB) em algumas ações. Mas Marés --também próximo de Requião, de quem foi procurador-geral do Estado--, não se recorda de Fachin ter defendido o político.

A proximidade com Requião, aliás, fez com que a nomeação de Rosana para o hoje extinto Tribunal de Alçada, em 1999, fosse considerada uma surpresa --o então governador e responsável pela nomeação, Jaime Lerner, é adversário do peemedebista. "Ela foi indicada pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), e era querida pelo tribunal. Lerner acabou cedendo e a nomeando, ainda que a contragosto", relata Marés.

Deltan Dallagnol também foi aluno

A nomeação de Fachin para a relatoria da Lava Jato, de certa forma, coloca o curso de Direito da UFPR como nunca sob os holofotes da mídia. Ele graduou-se na instituição. Moro, bacharel em Direito pela Universidade Estadual de Maringá (UEM), é doutor pela UFPR.

Outras figuras da operação --como os procuradores Deltan Dallagnol, Laura Tessler e Roberson Pozzobon e o delegado de Polícia Federal Igor Romário de Paula -- também foram alunos de Fachin.

Do outro lado, figuras da proa da defesa de envolvidos na operação também estão ligados à UFPR. O advogado Jacinto Nelson de Miranda Coutinho, que defende executivos da empreiteira OAS e chegou a pedir a nulidade de ações por alegadas falhas nas transcrições de delações, é professor titular da instituição.