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Temer confirma encontro, mas nega ter tratado de silêncio de Eduardo Cunha

Adriano Machado/Reuters
Imagem: Adriano Machado/Reuters

Felipe Amorim, Gustavo Maia, Luciana Amaral e Marina Motomura

DO UOL, em Brasília

17/05/2017 21h33Atualizada em 18/05/2017 21h49

O presidente Michel Temer (PMDB) afirmou, em nota divulgada pelo Palácio do Planalto na noite desta quarta-feira (17), que "jamais solicitou pagamentos para obter o silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha" e negou ter participado ou autorizado "qualquer movimento com o objetivo de evitar delação ou colaboração com a Justiça pelo ex-parlamentar".

O comunicado foi divulgado horas após a publicação de reportagem do jornal "O Globo" segundo a qual o dono da JBS, Joesley Batista, afirmou à PGR (Procuradoria-Geral da República) que Temer deu aval à compra do silêncio de Cunha e do operador Lúcio Funaro, ambos presos na Operação Lava Jato.

Na nota, Temer confirmou ter se encontrado com o empresário Joesley Batista no começo de março, no Palácio do Jaburu, sua residência oficial, em Brasília, mas disse que "não houve no diálogo nada que comprometesse" sua conduta.

O presidente ainda defendeu "ampla e profunda investigação" das denúncias, "com a responsabilização dos eventuais envolvidos em quaisquer ilícitos que venham a ser comprovados".

Veja a íntegra da nota:

"O presidente Michel Temer jamais solicitou pagamentos para obter o silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha. Não participou e nem autorizou qualquer movimento com o objetivo de evitar delação ou colaboração com a Justiça pelo ex-parlamentar. O encontro com o empresário Joesley Batista ocorreu no começo de março, no Palácio do Jaburu, mas não houve no diálogo nada que comprometesse a conduta do presidente da República.

O presidente defende ampla e profunda investigação para apurar todas as denúncias veiculadas pela imprensa, com a responsabilização dos eventuais envolvidos em quaisquer ilícitos que venham a ser comprovados."

Mais cedo, o assessor especial do presidente Temer e ex-deputado Sandro Mabel avaliou ao UOL que o "estrago é grande" e a denúncia está sendo "analisada" no Planalto. No entanto, ele disse que a frase que o peemedebista teria falado na gravação é "uma frase que se usa em qualquer momento, em qualquer lugar".

"Não acho que o presidente ia endossar um negócio desses. [Quanto ao momento da revelação], parece que as coisas são feitas de propósito", defendeu ao ressaltar que é preciso "pensar no país" e não somente em soluções políticas.

Questionado se o pedido de impeachment feito pelo deputado Alessandro Molon (Rede-RJ) terá andamento e as reformas serão paralisadas, Mabel disse que a oposição está apenas cumprindo o seu papel.

Durante a noite, Temer se reuniu com ministros e parlamentares -- entre eles, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e saiu do Planalto às 22h08 sem falar com jornalistas.

O advogado Gustavo Bonini Guedes, que representa Temer na ação que pede sua cassação no TSE, chegou ao Planalto por volta das 22h. Guedes não quis informar à reportagem se sua visita tinha relação com as notícias sobre a delação da JBS.

Manifestantes fazem buzinaço contra Temer em frente ao Palácio do Planalto

UOL Notícias

Entenda a denúncia

Segundo o jornal "O Globo", Joesley Batista afirmou à PGR que o presidente deu aval à compra do silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha e do operador Lúcio Funaro, ambos presos na Operação Lava Jato.

De acordo com a publicação, as informações fazem parte de uma delação de Joesley que ainda não foi homologada pelo STF (Supremo Tribunal Federal). O depoimento do empresário foi dado à PGR em abril e, no dia 10 passado, o conteúdo foi comunicado ao ministro do Supremo Edson Fachin, relator da Lava Jato na Corte.

Joesley Batista, um dos donos da JBS, encontrou Temer no dia 7 de março no Palácio do Planalto. O empresário registrou a conversa com um gravador escondido. Em um trecho, Joesley inicia um diálogo sobre o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Após perguntar qual era a atual relação entre Temer e o ex-deputado, o empresário diz que zerou "tudo o que tinha de pendência" com Cunha. Mais para frente, no diálogo, Joesley afirmou: "eu tô bem com o Eduardo". Ao que Temer respondeu: "e tem que manter isso, viu". O diálogo, porém, tem trechos inaudíveis, tornando inconclusiva uma possível referência a um aval de Temer aos pagamentos mensais.

A publicação também informou que a PF registrou ao menos uma entrega de R$ 400 mil para Roberta, irmã de Lúcio Funaro. Já o dinheiro para Cunha seria entregue a Altair Alves Pinto. Altair já fora apontado pelo operador Fernando Falcão Soares, o Fernando Baiano, como o responsável por receber as propinas destinadas ao ex-deputado.

Cunha teria agido a favor da J&F em projetos de lei e no fundo FI-FGTS, que investiu mais de R$ 1 bilhão em empresas do grupo.

O empresário disse ter pagado ao menos R$ 5 milhões a Cunha depois de sua prisão, e ainda devia mais R$ 20 milhões relativos à tramitação de uma lei que previa a desoneração de impostos no setor de frango.

Deputados pedem impeachment de Temer

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Deputado teria resolvido "assunto" da J&F

Ainda de acordo com o relato de Joesley publicado por "O Globo", Temer indicou o deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) para resolver "um assunto" da J&F, a holding que controla a JBS. Depois, Rocha Loures foi filmado recebendo uma mala com R$ 500 mil mandados pelo empresário.

A "pendência" da J&F com o governo, segundo Joesley, era uma disputa relativa ao preço do gás fornecido pela Petrobras à termelétrica EPE, que pertence ao grupo. Loures teria ligado para o presidente do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), Gilvandro Araújo, para interceder pela J&F. Pelo serviço, Joesley teria oferecido a Loures uma propina de 5%, que teria sido aceita pelo deputado.

Depois, Joesley e Ricardo Saud, diretor da JBS, teriam acordado com Loures o pagamento de uma propina de R$ 500 mil semanais por 20 anos --o que totalizaria quase meio bilhão de reais. O deputado teria dito que levaria a proposta a alguém acima dele.

Ao menos uma entrega de R$ 500 mil a Loures, feita por Saud, teria sido flagrada pela PF em São Paulo.

Joesley, Saud e mais cinco pessoas da JBS devem pagar uma multa de R$ 225 milhões, segundo "O Globo".

O UOL está tentando contato com as assessorias de imprensa da JBS e do deputado Rodrigo Rocha Loures. Nenhum deles respondeu.

O advogado do economista Lúcio Funaro, Bruno Espiñera, disse não ter conhecimento sobre pagamentos em dinheiro feito a Funaro e parentes dele. Ele disse que irá se encontrar com seu cliente, que está preso em Brasília, nesta quinta-feira (18).

“Estou tão surpreso com essa informação quanto qualquer outra pessoa. Não tinha conhecimento dessas informações, mas até falar com meu cliente e saber o que ele tem a dizer sobre isso, vou continuar tratando essas informações como mais uma delação que ainda precisa ser confirmada”, afirmou.

Procurada, a PGR (Procuradoria-Geral da República) disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que não se manifestará sobre eventuais acordos de colaboração que ainda não foram homologados.

Aécio também foi gravado

Joesley Batista afirmou à PGR, ainda de acordo com "O Globo", que também gravou o senador Aécio Neves, presidente do PSDB, lhe pedindo R$ 2 milhõesO dono da JBS entregou à PGR um áudio em que o tucano pede a quantia sob a justificativa de pagar despesas com sua defesa na Lava-Jato.

O momento da entrega do dinheiro a um primo de Aécio foi filmado pela Polícia Federal. A PF descobriu que a quantia foi depositada numa empresa do senador Zezé Perrella (PSDB-MG).

Em nota, Aécio disse estar "tranquilo". "O senador Aécio Neves está absolutamente tranquilo quanto à correção de todos os seus atos. No que se refere à relação com o senhor Joesley Batista, ela era estritamente pessoal, sem qualquer envolvimento com o setor público. O senador aguarda ter acesso ao conjunto das informações para prestar todos os esclarecimentos necessários."

Em vídeo publicado em seu Facebook, Zezé Perrella se coloca à disposição para esclarecimentos. "Não conheço Joesley Batista. Nunca tive contato com ele, nem mesmo por telefone, ou com qualquer outra pessoa do Grupo JBS."

Empresário implica Mantega e Palocci

Ainda de acordo com "O Globo", Joesley disse que o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega era seu contato no PT para a distribuição de propina a petistas e aliados. Mantega também atenderia a interesses da JBS e da J&F no BNDES.

Já o ex-ministro chefe da Casa Civil, Antonio Palocci, foi contratado pela JBS como consultor e atuava como uma espécie de orientador do empresário no meio político. Segundo Joesley, Palocci não se envolveu nos pedidos de suas empresas no BNDES, mas pediu doação de campanha ao PT via caixa dois. De acordo com "O Globo", o pedido foi atendido.

JBS faturou R$ 170 bi em 2016

Em seu site, a JBS se apresenta como "uma das líderes globais da indústria de alimentos", com mais de 230 mil funcionários ao redor do mundo. A empresa abriu seu capital na Bolsa de Valores de São Paulo em 2007. No ano de 2016, segundo informes financeiros da empresa, a JBS a companhia registrou receita líquida de R$ 170,3 bilhões. O lucro líquido foi de R$ 376 milhões.

A JBS é uma das empresas da holding J&F, que inclui companhias de setores variados. São elas: Vigor (derivados de leite), Alpargatas (calçados e vestuário), Eldorado Brasil (celulose), Flora (higiene e limpeza), Banco Original, Âmbar (energia), Canal Rural, Oklahoma (criação de gado nos EUA, Austrália e Canadá) e Floresta Agropecuária (criação de gado no Brasil).