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Defesa de Dilma vai pedir ao TSE anulação de depoimentos de delatores

O publicitário João Santana, responsável pelas campanhas da presidente Dilma Rousseff (2010 e 2014), e sua mulher, Mônica Moura - Zanone Fraissat - 23.fev.2016 -/Folhapress
O publicitário João Santana, responsável pelas campanhas da presidente Dilma Rousseff (2010 e 2014), e sua mulher, Mônica Moura Imagem: Zanone Fraissat - 23.fev.2016 -/Folhapress

Mirthyani Bezerra

Do UOL, em São Paulo

01/06/2017 12h21Atualizada em 01/06/2017 13h35

A defesa da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) afirmou que vai defender a retirada dos depoimentos dos empresários João Santana e Mônica Moura, além dos do empresário Marcelo Odebrecht, do processo durante o julgamento da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer no TSE (Tribunal Superior Eleitoral), marcado para a terça-feira que vem (6). Segundo Flávio Caetano, a inclusão dos depoimentos extrapolam o objeto das ações do PSDB contra a chapa eleita em 2014 na Justiça Eleitoral.

Os marqueteiros e o empresário da Odebrecht são delatores da Operação Lava Jato.

“Nesse processo houve extrapolação do objeto da ação. O processo precisa se delimitar aos fatos trazidos pelo PSDB no final de 2014, início de 2015, [à Justiça Eleitoral]. A fase Odebrecht não contava na ação e não pode ser incluída no processo”, afirmou Caetano, durante entrevista dada a jornalistas nesta quinta-feira (1°) em São Paulo. Segundo ele, a defesa de Temer também corroboram com a tese.

“Nós já levamos essa questão para o relator no processo. E já foi dito que o assunto será decido em julgamento. Mas entendemos que os depoimentos devem ser anulados e invalidados”, disse.

A expectativa, no entanto, é que o ministro Herman Benjamin, relator do processo, invoque o artigo 23 da lei que trata sobre inelegibilidade para respaldar a inclusão dos depoimentos no processo. Nele, é permitido ao juiz levar em consideração fatos ainda não narrados pelas partes.

Mais do que a denúncia inicial de que a chapa ocultação de dados negativos da economia por parte da chapa eleita, uso de propaganda oficial para fins eleitorais e recebimento de doações de empreiteiras envolvidas no esquema de corrupção com a Petrobras, os depoimentos, junto aos documentos anexados, têm mais capacidade de incriminar a chapa.

Durante sua apresentação, Flávio Caetano mostrou o que, segundo ele, são provas de que Mônica Moura, João Santana e Marcelo Odebrecht mentiram durante depoimento ao TSE e que, por isso, a defesa de Dilma já pediu à Justiça que, além da anulação e invalidação dos depoimentos, eles respondam por crimes de falso testemunho e que tenham os acordos de delação premiada questionados. “Esse pedido já foi feito nas nossas alegações finais”, afirmou.

Sobre Marcelo Odebrecht, Caetano afirma ser falso que o pedido de R$ 50 milhões feito em 2009 e mencionado durante depoimento do empresário baiano ao TSE para aprovação de um projeto de lei que atenderia várias empreiteiras e que serviria para a campanha de 2010 da chapa. O valor acabaria sendo utilizado, segundo Odebrecht, na eleição de 2014. “Primeiro que Dilma não era candidata em 2009. Estava se tratando de um câncer. Era impossível Guido  [Mantega] ter pedido o valor para alguém que nem sabia se ia estar viva”, disse. Além disso, Caetano afirmou que o próprio Odebrecht se contradisse pois havia informado em depoimento à PGR (Procuradoria Geral da República) que os pagamentos feitos a pedido do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega  foram repassados paulatinamente entre 2011 e 2014

Dentre as inverdades apontadas por Caetano está a afirmação feita por João Santana de que o atraso no pagamento informado durante depoimento seria do feito via caixa dois. “Ele disse durante o depoimento que todos os pagamentos eram feitos religiosamente e que o atraso foi do valor pago por fora. Mas a campanha nunca pagou em dia a João a Santana. Isso mostra que ele mentiu à Justiça Eleitoral”, afirmou. 

Disse ainda que Mônica Moura quer atribuir valores repassados pela Odebrecht à campanha presidencial do Panamá à chapa Dilma-Temer. Ele mostrou um documento rasurado aprendido com Maria Lúcia Tavares, da Odebrecht, que daria a entender que os US$ 10 milhões repassados tinham como fim a campanha panamenha, e não a brasileira. “Isso precisaria de uma perícia. É só o começo, não um fim”, disse.

Preparativos para o julgamento

Entre amanhã e segunda-feira – véspera do julgamento –, a defesa de Dilma vai se reunir com ministros do TSE para entregar um parecer jurídico contábil mostrando que é impossível a separação da chapa.  “Preparamos um parecer porque a defesa do Temer juntou outro parecer dizendo que sim é possível”, disse Caetano.

Questionado se o fato de defender Dilma também o torna defensores de Temer, diante do agravamento da crise política, com o atual presidente sendo investigado no STF (Supremo Tribunal Federal), Caetano disse que as primeiras ações da defesa dentro do processo movido pelo PSDB também eram direcionadas a Temer. “Ele que fez a cisão”, disse.

Para Caetano, novos episódios da crise política, com o presidente Temer gravado pelo empresário Joesley Batista, da JBS, não influenciarão na decisão dos ministros. “Não acredito que vá influenciar os ministros. Mas será um julgamento complicado. Nunca antes na história houve um julgamento de um presidente. É algo de grande complexidade”, afirmou.

Para ele, é “muito natural” que haja pedidos de vista, o que pode protelar ainda mais a decisão do TSE sobre o caso. “Pedido de vista é algo muito natural e pode acontecer com certeza”, disse.

Sobre a possibilidade de que o TSE aplique a mesma regra executada no Amazonas, em caso da cassação do mandato do chefe do Executivo, de serem convocadas novas eleições diretas, Caetano afirmou concordar que a mudança no código eleitoral também deve ser aplicada à Presidência. “Nos parece que tem que aplicar o Código Eleitoral. Mas se isso é ou não inconstitucional, cabe ao STF dizer. E ele ainda não disse”, afirmou.

A acusação

Pouco depois do resultado das eleições de 2014, o PSDB, partido adversário naquela disputa presidencial, entrou com quatro ações no TSE acusando a chapa adversária, formada por Dilma Rousseff e Michel Temer, de ter cometido irregularidades na campanha e pedindo sua cassação.

A principal acusação era sobre o recebimento de doações irregulares de empresas beneficiadas pelo esquema de corrupção investigado na Petrobras pela Operação Lava Jato.

O uso de caixa dois na campanha, como ficou conhecida a movimentação de recursos não declarados à Justiça Eleitoral, além de ser crime, é considerado uma infração eleitoral grave que pode levar à perda do mandato.

Em depoimento ao TSE, o empresário Marcelo Odebrecht, ex-presidente da construtora baiana, confirmou pagamentos de R$ 120 milhões à chapa Dilma-Temer em 2014, segundo reportagem do "Estado de S.Paulo".

As defesas de Dilma e de Temer têm afirmado que não foram cometidas irregularidades na campanha. Os advogados de Dilma afirmam que os delatores que acusam a ex-presidente mentem, e diz que as contas da chapa foram aprovadas pelo próprio TSE.

A defesa de Temer afirma que não há atos do então vice-presidente que o liguem às irregularidades apontadas na ação, o que o impediria de ser punido com a perda do mandato. Os advogados do presidente também afirmaram ao TSE que sua cassação abriria um "perigosíssimo precedente" que poderia agravar a crise política no país.

As penas

Se o TSE entender que foram praticados abusos na campanha, a punição é a de cassação da chapa. Como Dilma foi deposta da Presidência no ano passado, agora a ação poderia levar à cassação do mandato de Temer, o antigo vice que assumiu o governo com o impeachment.

A defesa de Temer afirma que não houve participação do vice nas supostas irregularidades pelas quais a campanha é acusada e, por isso, o TSE não poderia punir Temer com a perda do mandato. 

A Justiça Eleitoral, no entanto, tem decidido na maioria de seus julgamentos que quando a chapa é cassada por irregularidades que desequilibraram a disputa eleitoral, o vice também deve perder o mandato, mesmo que não tenha envolvimento nos atos ilegais. 

O TSE também terá que decidir se pune Dilma ou Temer com a pena da inelegibilidade, o que pode proibi-los de disputar eleições por oito anos. Para punir com a inelegibilidade, o TSE entende que é preciso provar que houve participação ou conhecimento do candidato nas irregularidades.

Caso o presidente Temer seja cassado, ele ainda pode recorrer ao próprio TSE e também ao STF (Supremo Tribunal Federal). Juristas avaliam que nem o TSE nem o STF devem determinar a saída imediata de Temer do cargo até que todos os recursos tenham sido julgados.

Caso a cassação seja mantida pelo STF, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), assume a Presidência da República, com a obrigação de convocar novas eleições. A eleição será indireta, com o voto apenas de deputados federais e senadores.

Novos ministros

Dois dos sete ministros do TSE que vão participar do julgamento foram indicados à corte eleitoral pelo próprio Temer, após ele assumir a Presidência.

Ambos oriundos da advocacia, os ministros Admar Gonzaga e Tarcísio Vieira de Carvalho Neto vão ocupar, respectivamente, as vagas no TSE que foram dos também advogados Henrique Neves e Luciana Lóssio.

A indicação de Temer seguiu a lista tríplice elaborada pelo STF, que respeita os critérios de antiguidade no TSE –tanto Gonzaga quanto Carvalho Neto já eram ministros substitutos da corte eleitoral.

Mas o fato de a confirmação dos nomes ter partido de um presidente sob julgamento, levantou especulações de que os novos ministros poderiam emitir votos favoráveis a Temer.

Gonzaga rejeitou essa hipótese, em entrevista recente. Carvalho Neto informou que não poderia dar entrevista sobre a ação em julgamento.

Novos delatores

O julgamento da ação foi suspenso em abril, depois de o plenário do TSE decidir dar mais tempo às defesas e abrir prazo para que novas testemunhas fossem ouvidas.

Além de Guido Mantega, ex-ministro da Fazenda no governo Dilma, que falou como testemunha de defesa da ex-presidente, o TSE também ouviu o marqueteiro João Santana e a mulher do publicitário, Mônica Moura, que firmaram acordo de delação com a Operação Lava Jato.

Santana e Moura trabalharam para a campanha de 2014 da chapa Dilma-Temer e afirmaram ter recebido pagamentos irregulares por meio de caixa dois.

Rito do julgamento

O primeiro ato do julgamento, marcado às 9h do dia 6 de junho, será a leitura do relatório da ação pelo ministro Herman Benjamin, relator do processo e corregedor-geral da Justiça Eleitoral.

O documento traz um resumo das investigações, citando trechos dos depoimentos colhidos ao longo das investigações e as provas coletadas.

Após a leitura do relatório, e Antes de Benjamin proferir seu voto, o presidente do TSE, ministro Gilmar Mendes, vai passar a palavra aos advogados de acusação e aos de defesa, nessa ordem.

Cada uma das partes terá 15 minutos para fazer sua sustentação oral.

Em seguida, o representante do MPE (Ministério Público Eleitoral) apresentará suas ponderações.

Dino pediu em seu parecer a cassação do mandato de Temer e a inelegibilidade de Dilma, segundo reportagem da Agência Brasil. 

Somente após essas etapas o relator deve apresentar o seu voto.

Na sequência, votam o ministro Napoleão Nunes Maia, que é também ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça), os ministros Admar Gonzaga e Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, ambos advogados, os ministros do Luiz Fux e Rosa Weber, do STF, e, por último, o presidente do TSE, Gilmar Mendes.

O julgamento pode ser interrompido caso algum dos sete ministros peça vista. Apesar de o regimento interno do TSE não apontar regras sobre essa dinâmica, a praxe é que isso aconteça apenas depois do voto do relator.