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Qual o recado que absolvição da chapa Dilma-Temer passa para a sociedade?

O presidente do TSE, ministro Gilmar Mendes, com o relator do processo de cassação da chapa Dilma-Temer, Herman Benjamiin, ao fundo - Daniel Teixeira/Estadão Conteúdo
O presidente do TSE, ministro Gilmar Mendes, com o relator do processo de cassação da chapa Dilma-Temer, Herman Benjamiin, ao fundo Imagem: Daniel Teixeira/Estadão Conteúdo

Aiuri Rebello

Do UOL, em São Paulo

09/06/2017 22h45

Ao longo de quatro dias, o Brasil acompanhou o julgamento da chapa Dilma-Temer no TSE (Tribunal Superior Eleitoral), que podia cassar o mandato do presidente Michel Temer e declarar a petista como inelegível por oito anos. O resultado terminou com a absolvição de ambos por quatro votos a três. Qual é o recado que essa decisão histórica passa para a sociedade brasileira?

A pedido do UOL, o economista-chefe de uma conceituada corretora de valores, um professor de direito constitucional e um cientista político analisam o cenário. Confira  abaixo:

"Um julgamento como esse desacredita o sistema democrático brasileiro"

Roberto Romano, professor de ética e política na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas)

"Era absolutamente previsível o resultado, mas mesmo assim no final fiquei enjoado. Ele garantiu sua permanência ao indicar os dois ministros que votaram para absolvê-lo. Foi uma espécie de salva-vidas que o TSE jogou para o Temer, mas acredito que mesmo assim não irá ajudar muito dado o tamanho do enrosco que ele se meteu. Ganhou uma sobrevida, mas a vida dele está a cada semana que passa mais complicada e, sob pressão, ele tem dado muitos passos em falso como nessa história do avião da JBS. Enquanto isso ele vai perdendo credibilidade, fica cada vez mais sem apoio popular que, com uma eleição no horizonte, acaba levando embora também o apoio político e, por fim, o do dito mercado. Vai ficar caríssimo para ele manter o apoio da base aliada, que eu chamo de base comprada, em meio a tanta dificuldade. Temer ficará sujeito a chantagens. É uma situação muito parecida com a de Dilma no fim do governo: ela não governava mais, dedicava-se integralmente a manter-se no cargo. É o que está fazendo o presidente.

Paralelamente, nós temos um Congresso completamente desmoralizado, que foi praticamente inteiro eleito da mesma forma e com o mesmo dinheiro sujo da chapa Dilma-Temer. Até agora, a Justiça tem servido com um esteio de confiança dos cidadãos no Estado Brasileiro, já que a moral do Poder Executivo e do Legislativo está em frangalhos. Assim, uma decisão dessa abala a imagem do Poder Judiciário. Um julgamento como esse desacredita o sistema democrático brasileiro ainda mais, principalmente entre os mais jovens. Isso é gravíssimo e cria as condições ideais para o nascimento de um regime autoritário. Eu estou muito preocupado com o futuro da nossa democracia."

"Decisão foi 80% técnica e 20% de olho nas consequências"

Floriano de Azevedo Marques, professor-titular do Largo São Francisco da USP (Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo)

"O que prevaleceu foi uma posição extremamente formal que se ateve aos autos da petição inicial. O que discutiu-se, basicamente, foi se a decisão seria baseada na petição inicial ou nas delações e provas, que não existiam quando a ação foi impetrada, da Operação Lava Jato. Tecnicamente, juridicamente, foi uma decisão correta, em que pese que para boa parte da população, o que o TSE fez foi fechar os olhos para a corrupção. Apesar dessa percepção, foi uma decisão técnica e correta.

Mas os ministros não são alheios à realidade, e nesse sentido acredito que a decisão foi 80% técnica e 20% de olho nas consequências. Mas é interessante, porque não sei se olharam para as consequências adequadas. Por um lado acredito que pesou essa questão da enorme crise política e econômica que vivemos, a ideia de que uma cassação podia atrapalhar ainda mais a vida no país. Mas outra consequência da decisão foi passar a impressão de que o tribunal é leniente com a corrupção. É uma situação muito complicada a do julgador. A decisão foi correta tecnicamente, mas passou uma impressão muito ruim para a sociedade."

"Para o mercado, tanto faz se o Temer cai ou fica"

André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos

"Essa decisão já era esperada, já trabalhávamos com esta hipótese. Do ponto de vista do mercado, a verdade é que hoje tanto faz se o Temer cair ou não. O que importava era a reforma da Previdência e, desde as delações da JBS, ninguém sério acredita mais que seja possível aprovar o pacote proposto, mesmo com todas as concessões. E o mercado sabe que nem o Temer nem um eventual presidente 'tampão' vai conseguir entregar a reforma da Previdência. A tendência macroeconômica é que, com a economia estagnada, a inflação siga em forte queda e, com isso, os juros vão continuar caindo de forma expressiva. Neste cenário, tanto faz se explodir uma bomba em Brasília. Então, tanto faz.

O mercado também já sabia que o crescimento econômico vai acontecer só a partir de 2018, que as medidas tomadas até agora não vão surtir efeito no curto prazo. O que o mercado gosta é de previsibilidade. Por isso, talvez, tenha havido uma pequena preferência por deixar do jeito que está, com o Temer mesmo, do que passar pelo doloroso processo de eleição indireta.

Agora, eu acho que isso tem um aspecto bom. Não concordo com o projeto de reforma da Previdência do jeito que ele foi colocado, e pelo visto muita gente no país não quer essa reforma. De acordo com nossas previsões, em 2018 a economia vai voltar a crescer de verdade.

Como é um ano eleitoral, os candidatos vão se dividir em dois grandes grupos: contra e a favor das reformas (as feitas e as futuras). Como a economia vai melhorar um pouco, o mercado de trabalho vai reagir e tal, o projeto econômico-liberal de direita estará fortalecido no discurso de seus políticos. Caso ganhe o candidato que defendeu as reformas na campanha e disse que as faria, haverá toda a legitimidade necessária para discutir isso e implantar as medidas de forma democrática. Do jeito que está não adianta. O problema do Brasil não é econômico, é político. Assim que recuperarmos a legitimidade política no Brasil, a economia se resolve sozinha."

Quem e ganha e quem perde com o resultado do TSE

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