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Qual o efeito da condenação de Lula para a esquerda brasileira?

O ex-presidente Lula, que foi condenado a nove anos e seis meses de prisão por Moro - Dida Sampaio/Estadão Conteúdo
O ex-presidente Lula, que foi condenado a nove anos e seis meses de prisão por Moro Imagem: Dida Sampaio/Estadão Conteúdo

Guilherme Azevedo

Do UOL, em São Paulo

13/07/2017 04h00

A condenação a nove anos e meio de prisão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), proferida em primeira instância na quarta-feira (12) pelo juiz Sergio Moro, prejudica a imagem de Lula e acende um alerta vermelho no campo das forças políticas da esquerda brasileira com vista às eleições de 2018, segundo especialistas ouvidos pelo UOL.

"A condenação é um problema de grande preocupação para as esquerdas", avalia o cientista político Aldo Fornazieri, da Fespsp (Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo). "É complicado ter um candidato com uma condenação, embora ainda seja em primeira instância. Esse elemento vai ser explorado pelos adversários e Lula vai ter de ficar dando explicação o tempo todo durante a campanha."

Para Malco Camargos, professor de ciência política da PUC-MG (Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais), "a dimensão da condenação é mais simbólica do que objetiva", porque pode ser contestada em instância superior e Lula sair inclusive inocente.

Mas a esfera simbólica, diz Camargos, tem o poder de afetar a condição de Lula como principal candidato, uma vez que "atrapalha a retórica da esquerda de alegar a sua inocência". Segundo pesquisa do Instituto Datafolha, Lula lidera as intenções de votos para presidente da República em 2018, com 29% ou 30%, dependendo do adversário.

O cientista político Claudio Couto, da FGV-SP (Fundação Getulio Vargas de São Paulo), é conclusivo sobre o impacto da possibilidade de Lula ser impedido de concorrer a presidente.

"Sem Lula, não sobra no campo das esquerdas nenhum quadro político relevante, competitivo. Para a esquerda, é mais um revés", observa, lembrando outras derrotas recentes das forças políticas esquerdistas, como o impeachment de Dilma Rousseff (PT) e o mau resultado do Partido dos Trabalhadores nas eleições municipais, ambas ocorridas em 2016. No pleito municipal, o partido perdeu cerca de 350 prefeituras em relação a 2012.

Fornazieri não poupa críticas aos petistas e ressalta a falta de reação e força de mobilização de seus quadros e movimentos sociais, que perderam, diz ele, a hegemonia das ruas desde os protestos pelo impeachment de Dilma.

"Agora, essas forças não têm capacidade de criar um fato político em cima da condenação, embora acreditem que ela seja injusta, como eu também acredito", frisa. "Essa desmobilização favorece ainda mais o caminho de tirar o Lula da disputa em 2018."

O professor da Fespsp vê ainda outro efeito colateral da condenação de Lula, com a possibilidade aberta de tirá-lo judicialmente da disputa em 2018: "Vai se criar um novo trauma na política nacional, porque tira a única liderança política nacional das eleições. Que tipo de eleições teremos em 2018, afinal? É um novo fato para levar a crise política para além de 2019".

Diferença de tratamento?

Camargos, da PUC-MG, identifica na condenação de Lula diferença de tratamento de político para político e de instância para instância da Justiça brasileira. Cita especificamente o caso de Aécio Neves (PSDB-MG), flagrado pela Polícia Federal negociando favor em dinheiro da empresa de carnes JBS, e a instância máxima da Justiça, o STF (Supremo Tribunal Federal).

O senador mineiro, segundo candidato a presidente mais votado em 2014, é alvo de inquéritos na Suprema Corte e, para o professor, tem privilégios por lá. "Essa diferença da Justiça traz muito mais insegurança do que certeza em relação a 2018. A Justiça não exerce o seu poder moderador."

Para Camargos, na eventualidade de Lula não disputar o pleito do ano que vem, é certo que alguém ocupará o campo da esquerda. "Mas esse nome ainda não está posto, pois ainda não há um nome natural que pode suceder Lula".

Couto assevera que, para a reorganização da esquerda de modo a ter chances eleitorais sem Lula, precisaria "acontecer algo muito surpreendente", como surgir algum novo líder ou movimento muito rapidamente. "A gente não tem nada disso no horizonte. A esquerda se encontra órfã tanto para o Executivo quanto para o Legislativo. Faltam quadros."