Votação sobre fim das coligações fica para semana que vem; fundão pode ser enterrado
Como se o impasse que há semanas limita o avanço das propostas de reforma política não fosse o bastante, a expectativa de que pelo menos uma delas fosse votada no plenário da Câmara nesta quarta-feira (30) foi frustrada pela sessão do Congresso Nacional, iniciada às 16h45.
A previsão é que o trabalho conjunto de deputados e senadores se estenda até o fim da noite, podendo até adentrar a madrugada. Os parlamentares estão apreciando uma pauta polêmica, que inclui vetos do presidente Michel Temer (PMDB) e a análise do projeto do governo federal que altera as metas fiscais de 2017 e 2018 e amplia o deficit para R$ 159 bilhões nos dois anos. A oposição promete tentar obstruir ao máximo a votação da matéria.
Com mais esse obstáculo, os deputados passaram a trabalhar com a expectativa de que a PEC 282/2016, proposta de emenda à Constituição que acaba com as coligações partidárias nas eleições para deputados e vereadores e institui uma cláusula de desempenho eleitoral, seja votada apenas na próxima terça-feira (5).
Relatora da proposta, a deputada Shéridan (PSDB-RR) disse ao UOL no início da noite desta quarta que, após votação das metas, é improvável que haja o quórum necessário para a votação de uma PEC, que precisa de 308 votos no plenário da Câmara para ser aprovada. "Vai ficar muito tarde", comentou.
O presidente em exercício da Câmara, André Fufuca (PP-MA), chegou a cogitar colocar o texto da PEC 282 em votação antes de ceder o plenário da Casa para a sessão do Congresso, mas não havia quórum suficiente. Já a possibilidade de se votar o texto nesta quinta (31) foi descartada porque, nesse dia da semana, costuma ser baixa a frequência de deputados na Casa.
Antes de adiarem a votação da PEC 282, os deputados já haviam entrado em consenso que essa proposta deveria passar na frente de outra, a 77/2003, de relatoria de Vicente Candido (PT-SP). Após tramitar em maior velocidade e chegar a ser colocada em votação, a PEC travou por falta de acordo entre os partidos sobre os dois principais pontos: a criação de um fundo público de campanha e a mudança de sistema eleitoral para o "distritão". Por alguns parlamentares, essa proposta de reforma política já é dada como enterrada.
Corrida contra o tempo
Os deputados sabem que agora devem correr contra o tempo se quiseram que qualquer mudança na legislação entre em vigor já nas eleições do ano que vem. Isso porque, de acordo com o princípio da anualidade, qualquer alteração precisa ser aprovada até um ano antes do pleito.
Como o feriado da Independência do Brasil, no dia 7 de setembro, cairá numa quinta, os parlamentares serão convocados para estarem presentes na próxima segunda (4) - dia da semana em que não costuma haver sessão deliberativa.
Apostando mais uma vez que não haverá quórum suficiente no primeiro dia útil da semana que vem, Shéridan diz acreditar que a PEC só será votada na terça. A avaliação foi corroborada por outros deputados e assessores parlamentares ouvidos pela reportagem.
De acordo com a tucana, já há consenso para votar o texto-base aprovado na última quarta (23) pela comissão especial que discutiu a proposta, mas os eventuais destaques (sugestões de mudança no texto) serão decididos no voto, já que não se alcançou um acordo sobre alguns pontos.
Segundo apurou o UOL, os partidos que mais se opõem as mudanças no modelo de coligações e ao fim da cláusula de barreira são o PP, PR e PRB, estes dois últimos por causa dos deputados Tiririca (SP) e Celso Russomanno (SP), que puxam candidatos menos votados das siglas para o Parlamento.
Veja abaixo as principais mudanças da PEC 282, de acordo com o texto aprovado em comissão:
Saem coligações. Entram federações e subfederações
Atualmente: Os partidos podem se unir tanto na esfera municipal, quanto na estadual e na federal formando as chamadas coligações. As uniões feitas nos municípios não são obrigatórias para os Estados e para a eleição presidencial. Além disso, os votos obtidos pelas coligações servem para eleger os candidatos a deputados e vereadores pelo atual sistema proporcional.
Como pode ficar: A PEC 282/2016 propõe acabar com as coligações já a partir de 2018. Como forma de substituí-las, os partidos políticos que tenham afinidade ideológica poderão se unir em grupos chamados "federações". A federação será formada antes das eleições e seus partidos membros deverão continuar atuando em conjunto ao longo dos quatro anos seguintes. Por exemplo, PMDB, PSDB e DEM poderão formar uma federação e terão de seguir os mesmos posicionamentos na Câmara o no Senado até as próximas eleições.
Dentro das federações, poderão ser formadas "subfederações". Estas serão compostas por dois ou mais partidos da federação da qual fazem parte, mas somente para o período de campanha eleitoral. Como ilustração tomando-se o exemplo dos partidos citados, o PSDB e o PMDB poderão se unir e enfrentar o DEM em um Estado ou no Distrito Federal para eleger um candidato. No entanto, após o fim da campanha, as três siglas terão de voltar a trabalhar juntas.
Nova cláusula de barreira
Atualmente: Todos os partidos registrados no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) --hoje são 35-- têm acesso ao fundo partidário, mas respeitando suas cotas de presença na Câmara e no Senado. Mesmo os que não têm representantes no Congresso recebem pequenas fatias.
Como pode ficar: O parecer estabelece uma cláusula de barreira para que as siglas tenham acesso aos recursos do Fundo Partidário e à propaganda gratuita no rádio e na televisão. Isto é, partidos que não alcançarem determinadas cotas, não terão direito a recursos do Fundo. A iniciativa terá exigências progressivas de 2018 até 2030 e que vão ficando cada vez mais rígidas.
Veja abaixo as principais propostas de reforma política que devem ser arquivadas:
Eleição de deputados e vereadores
Atualmente: No sistema atual, o proporcional, o candidato conta com os seus votos e com aqueles dados ao partido ou à coligação para ser eleito. Neste modelo, candidatos com poucos votos podem acabar se elegendo se parceiros de sigla tiverem obtido votações maciças, que garantiram uma cota grande de cadeiras para o partido, enquanto políticos com uma votação mais expressiva podem ficar de fora.
Como pode ficar: A partir do ano que vem, se a proposta for aprovada, os parlamentares das câmaras municipais, assembleias legislativas e a Câmara dos Deputados serão escolhidos por um modelo eleitoral majoritário, apelidado de “distritão”, em que são eleitos os deputados mais votados em cada Estado. Neste modelo, não há votos em partidos.
A partir de 2022, o distritão daria lugar ao distrital misto. Nele, o eleitor dá dois votos para o Legislativo: um para o candidato do partido no distrito dele e outro para qualquer candidato do partido na cidade ou no Estado que ele mora. O candidato mais votado em cada distrito é eleito para metade das vagas na casa legislativa. A outra metade é preenchida pelos mais votados dos partidos.
Financiamento público de campanha
Atualmente: Só é permitido aos partidos usar valores do Fundo Partidário - fundo anual de manutenção dos partidos -, doações de pessoas físicas e recursos do próprio candidato para custear as campanhas.
Como pode ficar pela proposta da Câmara: os deputados querem criar o FFD (Fundo Especial para o Financiamento da Democracia), que seria um fundo com dinheiro público. A proposta é que o valor do Fundo seja decidido anualmente na Lei Orçamentária, pela Comissão Mista de Orçamento do Congresso. A ideia de vincular este fundo a uma porcentagem fixa da receita anual da União já foi rejeitada.
Como pode ficar pelo projeto do Senado: os senadores querem criar o Fundo Especial de Financiamento de Campanha, de R$ 2 bilhões, que usaria o dinheiro da veiculação da propaganda eleitoral gratuita.
Doações de pessoas físicas
Atualmente: Pessoas físicas podem contribuir com doações para qualquer candidato, desde que não ultrapasse, para cada cargo em disputa, 10% do rendimento bruto do doador no ano anterior ao da eleição. Além disso, todos os doadores têm seus nomes obrigatoriamente divulgados.
Como pode ficar: Continua o limite de 10% do rendimento bruto do doador. Esse valor, no entanto, seria limitado a 10 salários mínimos por cargo ou chapa majoritária. A ideia de o doador se manter no anonimato foi retirada do projeto.
Teto para gastos com campanha
Atualmente: Candidatos e partidos não têm limite mínimo ou máximo de investimento nas campanhas. Em 2014, a campanha vitoriosa de Dilma Rousseff (PT) na eleição presidencial declarou ter gastado R$ 384 milhões, em valores atualizados.
Como pode ficar: Os parlamentares querem estabelecer teto para os gastos com campanha dos candidatos. A proposta é que nas eleições para presidente da República não sejam gastos mais de R$ 150 milhões. Os limites de gastos de campanhas para governador e senador vão depender do número de eleitores em cada Estado.
Pesquisas eleitorais
Atualmente: Hoje, institutos de pesquisa podem divulgar suas campanhas eleitorais a qualquer momento, desde que elas estejam devidamente registradas na Justiça Eleitoral.
Como pode ficar: Se o texto da reforma for aprovado, o instituto vai ter que informar, até dez dias antes da divulgação do resultado do levantamento, o nome do estatístico responsável pela pesquisa e o número de registro do profissional no Conselho Regional de Estatística. A Justiça poderá impedir cautelarmente a divulgação dos resultados. Além disso, os institutos estarão proibidos de divulgar pesquisas eleitorais a partir do domingo anterior à data das eleições.
Uso de telemarketing e redes sociais nas campanhas
Atualmente: Os partidos são proibidos de usar recursos de telemarketing e fazer propaganda paga na internet (inclusive nas redes sociais) para fazer a propaganda dos seus candidatos.
Como pode ficar: Ligações por telemarketing poderão ligar para o eleitor das 9h às 20h, de segunda a sábado, desde que sejam realizadas pelo próprio comitê de campanha ou por iniciativa de pessoal do candidato. Deverá ser dada ao eleitor a opção de não receber novas chamadas. Além disso, poderá aparecer uma postagem patrocinada de candidatos no seu feed de notícias no Facebook, por exemplo. O limite de gastos para o uso desses recursos de propaganda é de 5% do teto de gastos para o cargo, ou R$ 2 milhões, o que for menor.
Participação das mulheres nas eleições
Atualmente: Hoje, os partidos são obrigados ter ao menos 10% da participação feminina nas suas propagandas partidárias.
Como pode ficar: Esse número deve subir para 30%. Quem descumprir tem que pagar uma multa de R$ 50 mil. Além disso, será obrigatório que todas as chapas de candidatos a prefeito, governador e presidente (e seus vices) tenham um homem e uma mulher.
Vaquinha online
Os partidos poderão organizar campanhas de financiamento coletivo por meio de sites, aplicativos eletrônicos e outros recursos similares, mas esses meios deverão ter cadastro prévio na Justiça Eleitoral e informar o nome completo e o CPF de cada um dos doadores, além das quantias doadas. Hoje isso não é previsto em lei.
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