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Número 2 de secretaria especial de Doria cai após áudio sobre Lei de Acesso

O prefeito de São Paulo, João Doria -
O prefeito de São Paulo, João Doria

Janaina Garcia

Do UOL, em São Paulo

08/11/2017 12h11Atualizada em 08/11/2017 17h34

A Prefeitura de São Paulo confirmou na manhã desta quarta-feira (8) que o número dois da secretaria executiva de Comunicação (Secom), Lucas Tavares, “pediu exoneração” e não integra mais os quadros da administração municipal. A alteração acontece no mesmo dia em que reportagem do jornal "O Estado de S.Paulo" revelou que Tavares teria agido para tentar dificultar o fornecimento de dados a jornalistas via LAI ( Lei de Acesso à Informação) no âmbito da Comissão Municipal de Acesso à Informação (Cmai).

A reportagem do jornal apurou, a partir de um áudio de 1h10, que Tavares, até hoje de manhã chefe de gabinete da Secom, espécie de número 2 da secretaria, atuaria para dificultar o acesso de jornalistas a dados solicitados.

O pedido de exoneração foi confirmado ao UOL pelo próprio Tavares. Ele afirmou que a comissão da qual fazia parte, e à qual o áudio reportado se referia, representava a terceira instância da análise de pedidos de informação via LAI e era composta por representantes de oito secretarias.

"Sou um cara muito informal, falo palavrão", diz exonerado

"Eu era um dos cargos, pela Secom, e fazia parte, como tal, das reuniões que julgava os pedidos. Sou um cara muito informal, falo palavrão... o que estava no áudio era uma conversa informal, uma brincadeira. Se você pegar as atas da comissão esses áudios não eram sequer oficiais", disse.
 
Em parte do áudio revelado pelo jornal, por exemplo, Tavares afirma que, dentro do que for “formal e legal”, vai “botar pra dificultar”, e que, se a resposta tardar a chegar, o jornalista vai “desistir da matéria”. Em outro trecho, sobre o pedido de uma produtora da TV Globo para uma reportagem sobre buracos de rua, ele afirma: "Como buraco é sempre matéria por motivos óbvios - a cidade parece um queijo suíço, de fato -, e a gente está com problema de orçamento, porque precisaria recapear tudo, então tem matéria nisso. Agora, dentro do que é formal e legal, o que eu puder dificultar a vida da Roberta (Roberta Giacomoni), eu vou botar pra dificultar, sendo muito franco", diz Tavares. O pedido da profissional acabou indeferido.
 
As declarações foram feitas em reunião ocorrida em 16 de agosto, na Controladoria-Geral do Município, com outros sete representantes da Prefeitura -- entre os quais, técnicos, secretários adjuntos e a então controladora-geral, Laura Mendes, demitida pela gestão Doria em 17 de agosto.

"São brincadeiras de um jeito informal de eu me expressar. Chamar um jornalista de 'chato' é até elogioso, não é uma crítica. Não teve dolo no que eu disse ou nas mibhas ações", defendeu-se.

Indagado então sobre o porquê de uma medida mais extrema, como o suposto pedido de exoneração, Tavares argumentou: "Não quero causar constrangimentos à administração, então, achei por bem sair. Mas todas essas decisões da comissão foram tomadas por unanimidade de membros – com votos inclusive da controladora demitida. As brincadeiras não entram nas atas. Imagina que teria algum trabalho de cercear o jornalista? Nenhum. Fico até chateado com isso", declarou, acrescentando, em terceira pessoa: "Lucas só brincou e foi informal e agora está pagando por isso, mas não é um liberticida."

Além da Secom, Tavares havia sido assessor também no governo de São Paulo, pelo qual ocupou postos de chefia na comunicação da SSP-SP (Secretaria de Segurança Pública de São Paulo), da Fundação Casa e da CHDU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano). 

Tavares fazia "defesa da transparência", diz Secom

Em nota, a Secom informou que "esta gestão tem compromisso com a transparência" e afirmou que os trechos de áudio divulgados pelo Estadão "não refletem a orientação para que a Lei de Acesso à Informação seja sempre respeitada".

"Prova disso é que o primeiro semestre de 2017 tem o maior percentual de pedidos de informação atendidos nos últimos quatro anos. A Controladoria Geral do Município já está elaborando um novo plano de transparência para que eventuais problemas ainda existentes em relação ao cumprimento da lei sejam sanados."

Sobre o ex-chefe de gabinete, a pasta salientou não ter havido dolo em suas ações, mas alegou que "o funcionário pediu exoneração, o que atende a determinação da Secretaria de Comunicação". "Vale ressaltar que a análise do conjunto de votos do funcionário e a íntegra do áudio mostram que ele adotava como critério a defesa da transparência e somente votou pela negativa aos pedidos de informação quando estes contrariavam a legislação ou já haviam sido atendidos em instâncias inferiores", conclui a nota.

Questionada, a Secom não se manifestou sobre um novo nome para o posto.

"Prática discriminatória contra jornalista", critica Abraji

Em nota, a Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) criticou os fatos denunciados pelo jornal e classificou que eles provam "o que antes era apenas desconfiança: a prefeitura de São Paulo, deliberadamente, dificulta o acesso da imprensa a informações solicitadas via LAI."

"A prática discriminatória contra jornalistas revelada pelo repórter Luiz Fernando Toledo é inconstitucional. Viola dois princípios da administração pública: a impessoalidade e a publicidade. Configura improbidade administrativa. A Abraji também lamenta a crítica feita na manhã desta quarta, pelo prefeito João Dória, ao fato de a reunião ter sido gravada. O que é discutido pela Comissão Municipal de Acesso à Informação é de interesse público e a divulgação desse tipo de áudio deveria ser prática recorrente de um governo transparente, em vez de exceção.
Ao negar ou dificultar respostas a pedidos para satisfazer a determinada política de comunicação, a prefeitura comete grave atentado ao direito fundamental de acesso a informações. Coloca em risco o acompanhamento de políticas públicas pelos cidadãos e o combate à corrupção. Zomba da lei, da imprensa e dos cidadãos", encerra a nota.