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MP denuncia três secretários da gestão Doria por suposta fraude em carnaval de rua

O carnaval de rua em São Paulo, este ano, reuniu mais de 3 milhões de foliões, segundo cálculos da Prefeitura - Junior Lago/UOL
O carnaval de rua em São Paulo, este ano, reuniu mais de 3 milhões de foliões, segundo cálculos da Prefeitura Imagem: Junior Lago/UOL

Janaina Garcia

Do UOL, em São Paulo

29/11/2017 20h10

O MP-SP (Ministério Público de São Paulo) apresentou uma ação civil pública em que pede que os secretários municipais Bruno Covas (Casa Civil e vice-prefeito), Júlio Semeghini (Governo) e André Sturm (Cultura), do primeiro escalão da gestão do prefeito João Doria (PSDB), sejam condenados à perda do cargo e à suspensão dos direitos políticos. É a primeira ação protocolada contra a gestão do tucano pelo MP, que tem outros procedimentos instaurados em relação a ela, mas ainda não finalizados.

Para o MP, o trio, juntamente com as agentes públicas Gabrielle Araújo, Gabriela Pereira e Karen Oliveira, cometeu ato de improbidade ao supostamente direcionar uma licitação do carnaval de rua deste ano, em São Paulo, à empresa Dream Factory.

Na ação, o promotor de Defesa do Patrimônio Público Nelson Sampaio explica que desde junho investigava se a administração municipal havia interferido na concorrência para escolha do patrocinador oficial do carnaval de rua em favor da empresa Dream Factory, que tem sede no Rio.

A investigação foi aberta a partir de reportagem da rádio CBN, que, também em junho, revelou que os três secretários participaram de uma reunião com diretores da Dream Factory na qual teriam dado orientações para que a empresa modificasse itens da planilha de serviços proposta a fim de vencer a concorrência.

Segundo a ação, o procedimento de chamamento público para definir o patrocinador do evento começou em agosto de 2016. Além da Dream Factory – agência contratada pela Ambev --, a Liga Independente das Escolas de Samba de São Paulo, a OCP Comunicação e a SRCOM também apresentaram propostas, mas, após a Dream Factory apontar a existência de irregularidades nas concorrentes, elas foram impugnadas. A SRCOM apresentou recurso, e administração teve de fazer nova avaliação – de modo que teve sua proposta considerada a mais vantajosa para o Município.

Na mesma data, apontou a promotoria, ocorreu uma reunião na Prefeitura de São Paulo com a presença do prefeito em exercício, Bruno Covas, dos secretários municipais de Governo e de Cultura e de representantes da Dream Factory e da Ambev. Na ocasião, havia revelado a CBN – a matéria foi anexada aos autos --, Bruno Covas orientou a Dream Factory sobre quais itens da planilha apresentada deveriam ser alterados para que saísse vencedora do chamamento público.

A proposta da SRCOM era de R$ 8,5 milhões; a da Dream Factory, de R$ 15 milhões.

MP usa auditoria do TCM que apontava irregularidades

Em maio, uma auditoria do Tribunal de Contas do Município concluiu que uma intervenção de Sturm modificou o resultado do certame, considerado irregular. “A proposta da empresa SRCOM é que deveria ter sido considerada vencedora com base nos critérios de julgamento descritos no edital", definiu a auditoria do TCM. Sturm não havia aceitado o parecer da comissão técnica encarregada de avaliar as propostas –a qual estabelecera que a proposta da SRCOM era "superior" e "melhor atendia ao interesse público".

O Ministério Público pede à Justiça que decrete a nulidade do chamamento público e do termo de parceria entre a Prefeitura e a Dream Factory e que condene Covas, Sturm e Semeghini tendo em vista que os atos dos três “são movidos por dolo”.

Sobre Sturm, a ação diz que os atos do secretário foram "movidos por dolo", isto é, intencionais. "Participou das reuniões realizadas informalmente entre os membros do Governo Municipal e a empresa demandada Dream Factory e, como bem apontado pela Auditoria do Tribunal de Contas do Município de São Paulo, é o responsável pelas irregularidades lá atestadas”, diz a peça.

Semeghini, prossegue a ação, “participou das reuniões informais que culminaram no favorecimento da empresa demandada Dream Factory e, assim, contribuiu para a prática de ato ilegal. Tinha pleno conhecimento do embuste e da intenção dos agentes envolvidos em direcionar o procedimento à empresa demandada Dream Factory”.

Bruno Covas, por sua vez, no entendimento da Promotoria, teve “direta interferência no procedimento do chamamento público para a organização e planejamento do Carnaval de Rua de 2017” já que, “na função de prefeito em exercício [Doria viajava a Dubai, na ocasião], teria orientado, em reunião a portas fechadas, a empresa demandada Dream Factory e integrantes da Ambev a alterar itens da planilha apresentada na proposta de gerenciamento do carnaval. Logo após este ajuste, foi realizada a sessão pública e a interpelação da empresa demandada para demonstrar o seu interesse em adequar-se ao pretendido pela municipalidade.”

Sobre as funcionárias públicas, integrantes da Comissão Especial de Avaliação que julgou as propostas licitatórias, o MP apontou que elas “concordaram com o combinado entre a empresa e o Governo Municipal e cooperaram com atos essenciais à possibilidade de ajuste da proposta da empresa demandada Dream Factory”.

No pedido de condenação também da Dream Factory, o MP conclui que ela “foi diretamente beneficiada pelos atos praticados pelos agentes públicos” já que, concretizada a parceria com a Prefeitura, “obteve renda e dividendos, sob o patrocínio da Ambev, que por sua vez, em razão do favorecimento havido, lucrou com a divulgação de sua marca e a venda de produtos durante o carnaval de rua”.

“A adequação dos itens da planilha apresentada de acordo com o necessário para atingir o preço estabelecido entre os agentes ímprobos atesta o dolo da empresa demandada que, de forma ilegal, estampou com séria mácula o escorreito procedimento administrativo para satisfazer interesse próprio, tudo em prévio ajuste com os demandados supramencionados”, definiu o promotor.

Prefeitura nega direcionamento

Em nota, a Prefeitura de São Paulo informou que “responderá a todos os esclarecimentos do Ministério Público quando for notificada”, mas negou que tenha havido irregularidades na conduta dos secretários.

“O edital, elaborado e publicado pela gestão passada, foi inteiramente obedecido. Como previsto, a empresa que havia feito a maior oferta financeira foi chamada a esclarecer sua proposta. Ainda conforme previa o edital, foi permitido que esta empresa, a Dream Factory, alterasse os itens de investimento, mas mantendo-se dentro do escopo do que já havia sido apresentado. Pare que fique claro: a proposta da SRCOM foi de R$ 8,5 milhões; a da Dream Factory, de R$ 15 milhões. O conteúdo da proposta de maior valor, porém, foi julgado insatisfatório pela comissão, pois boa parte dos recursos era destinada a ações de marketing. Como o edital permitia, foi solicitada à Dream Factory que alterasse o conteúdo de sua proposta, para que esse valor se destinasse inteiramente a serviços de interesse público (segurança, ambulâncias, banheiros químicos). O mesmo não poderia ser oferecido à SRCOM, uma vez que o edital não permitia que o valor da proposta fosse alterado, apenas sua composição, desde que dentro do escopo”, diz a nota.

“Por fim, a Prefeitura esclarece que todos os procedimentos adotados respeitaram os princípios da legislação, asseguraram a isonomia entre os interessados e aguarda a comprovação da justiça de que todos os trâmites ocorreram de acordo com a lei”, encerrou o texto.

Empresa diz que não cometeu ilegalidade

Procurada pela reportagem, a Dream Factory se manifestou também por nota de assessoria de imprensa: afirmou que “não foi notificada formalmente” sobre a ação proposta pelo MP, mas “reforça que cumpriu integralmente os termos do chamamento público que teve início em 2016”.

“A empresa, desde o início, apresentou a proposta econômica de maior valor (R$ 15 milhões), comparativamente a outros proponentes. A proposta da segunda colocada, a empresa SRCOM, inicialmente inabilitada, foi de aproximadamente de R$ 8 milhões, ou seja, substancialmente menor do que a oferecida pela Dream Factory. A comissão responsável pelo chamamento público claramente tomou várias medidas a seu alcance para aumentar o nível de competitividade entre as empresas envolvidas no procedimento. Para tanto, em 2017, já no novo Governo, a Dream Factory foi questionada pelos órgãos envolvidos sobre a possibilidade de, nos termos do que já era previsto no próprio Edital de Chamamento Público, compatibilizar itens da proposta – mantendo o valor total de R$ 15 milhões, visando atender da melhor forma o interesse público.”

A empresa defende que, na modalidade de chamamento público, as alterações feitas não são ilegais -- e justificou que "a comissão responsável pelo chamamento público claramente tomou várias medidas a seu alcance para aumentar o nível de competitividade entre as empresas envolvidas no procedimento". "Para tanto, em 2017, já no novo Governo, a Dream Factory foi questionada pelos órgãos envolvidos sobre a possibilidade de, nos termos do que já era previsto no próprio Edital de Chamamento Público, compatibilizar itens da proposta – mantendo o valor total de R$ 15 milhões, visando atender da melhor forma o interesse público."

A nota pondera ainda que, durante o chamamento público, “houve divulgação, tanto por parte dos órgãos públicos envolvidos, quanto por parte da mídia, que circulou informações sobre o processo de forma transparente e acessível para a sociedade”.