Crítica a Temer, disciplina de curso na UnB terá semestre sobre "golpe de 2016"
O curso de graduação de ciência política da UnB (Universidade de Brasília) divulgou a ementa de uma disciplina intitulada “O golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil”, a ser ofertada na grade deste semestre, duas vezes por semana.
A disciplina se refere ao processo político que culminou com o impeachment da então presidente Dilma Rousseff (PT), em 2016, e a consequente posse de Michel Temer (MDB) na Presidência da República.
Na ementa, definida como “provisória e sujeita a alterações”, são informados três objetivos complementares da disciplina: “(1) Entender os elementos de fragilidade do sistema político brasileiro que permitiram a ruptura democrática de maio e agosto de 2016, com a deposição da presidente Dilma Rousseff"; "(2) Analisar o governo presidido por Michel Temer e investigar o que sua agenda de retrocesso nos direitos e restrição às liberdades diz sobre a relação entre as desigualdades sociais e o sistema político no Brasil"; e "(3) Perscrutar os desdobramentos da crise em curso e as possibilidades de reforço da resistência popular e de restabelecimento do Estado de direito e da democracia política no Brasil.”
A programação da disciplina prevê aulas e leituras divididas em cinco subtemas.
O primeiro deles, intitulado “Do golpe de 1964 à nova república”, apresenta tópicos que vão do governo João Goulart e a deposição dele, pelos militares (1964), à promulgação da Constituição de 1988. O segundo tópico, “O PT e o pacto lulista”, traz sugestões de leituras sobre sindicalismo, surgimento do PT e lulismo –o ex-porta-voz da Presidência no governo Lula, André Singer, é o autor mais citado no tópico.
O terceiro tópico da disciplina, “Democratização e desdemocratização”, cobra leituras sobre democracia, capitalismo, limites da representação política; o quarto, “Das ‘Jornadas de junho’ à destituição de Dilma”, apresenta textos sobre as manifestações pela redução das tarifas de transporte, em junho de 2013, e as eleições de 2014 e os meios de comunicação.
O quinto e último tópico, batizado de “O governo ilegítimo e a resistência”, trata principalmente da gestão Temer e cobra leituras de textos sobre a PEC 241 (a PEC do teto de gastos), a “nova direita radical e a ascensão do parafascismo”, o “populismo de direita” e o antipetismo, bem como as pautas da esquerda e, por último, “a resistência popular e as eleições de 2018”.
"Disciplina se alinha com valores claros, em favor da liberdade", diz professor
Procurada, a UnB informou, em nota, que a proposta de criação de disciplinas, bem como suas respectivas ementas, "é de responsabilidade das unidades acadêmicas, que têm autonomia para propor e aprovar conteúdos, em seus órgãos colegiados".
"Além disso, a referida disciplina é facultativa, não integrando a grade obrigatória de nenhum curso. A UnB reitera seu compromisso com a liberdade de expressão e opinião --valores fundamentais para as universidades, que são espaços, por excelência, para o debate de ideias em um Estado democrático", diz a universidade em nota.
Também por meio de nota, o professor responsável pela disciplina, Luis Felipe Miguel, reclamou da “falsa polêmica que querem abrir” sobre o caso. Segundo o site da instituição, Miguel é professor titular do Instituto de Ciência Política e atua nas áreas de mídia e política, teoria da democracia, representação política e gênero
“Trata-se de uma disciplina corriqueira, de interpelação da realidade à luz do conhecimento produzido nas ciências sociais, que não merece o estardalhaço artificialmente criado sobre ela. A única coisa que não é corriqueira é a situação atual do Brasil, sobre a qual a disciplina se debruçará. De resto, na academia é como no jornalismo: o discurso da ‘imparcialidade’ é muitas vezes brandido para inibir qualquer interpelação crítica do mundo e para transmitir uma aceitação conservadora da realidade existente", escreveu o docente, na nota.
O professor afirmou ainda que a disciplina que ele oferece se "alinha com valores claros, em favor da liberdade, da democracia e da justiça social", e diz que não abrirá mão do rigor científico. "É assim que se faz a melhor ciência e que a universidade pode realizar seu compromisso de contribuir para a construção de uma sociedade melhor”, escreveu.
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