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Lula é um preso político?

Lula chega à Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, rodeado de agentes da PF - Theo Marques/UOL
Lula chega à Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, rodeado de agentes da PF Imagem: Theo Marques/UOL

Lucas Borges Teixeira

Colaboração para o UOL

19/04/2018 15h17

Desde que o ex-presidente Lula teve seu habeas corpus preventivo negado pelo STF (Supremo Tribunal Federal), no último dia 5, o PT tem afirmado que ele foi vítima de um julgamento de exceção e se tornou um preso político.

Em uma nota divulgada no mesmo dia em que o STF votou pela execução provisória da pena, o partido afirma que o tribunal “rasgou a Constituição” e “ajoelhou-se ante pressões”.

A senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), presidente nacional da sigla, repetiu este discurso em um vídeo enviado à TV internacional Al-Jazeera nesta quarta-feira (18). A parlamentar afirma que o ex-presidente é um preso político no Brasil e que o "o objetivo da prisão é não permitir que Lula seja candidato na eleição deste ano".

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Mas, afinal, Lula é um preso político?

Juridicamente, o ex-presidente não pode ser considerado um preso político, de acordo com Marco Aurélio Florêncio, professor de Direito Penal da Universidade Presbiteriana Mackenzie. “Para ser considerado preso político pela legislação brasileira é preciso ter cometido um crime político previsto na Lei de Segurança Nacional”, explica o advogado ao UOL.

A Lei de Segurança Nacional (L 7.170/1983) prevê como crime político atos que “lesam ou expõem a perigo de lesão a integridade territorial e a soberania nacional; o regime representativo e democrático, a Federação e o Estado de Direito; e a pessoa dos chefes dos Poderes da União”.

“Ou seja, juridicamente, o ex-presidente não é visto como preso político, visto que foi imputado a ele o crime de corrupção”, afirma Florêncio.

Mas não é tão simples assim. De acordo com o advogado, presidente da Comissão de Direito Penal Econômico da OAB/SP, há uma segunda leitura, não eminentemente jurídica, do que pode ser considerado um preso político.

“Não é a definição jurídica, mas historicamente são considerados presos políticos aqueles encarcerados por suas opiniões, o que acontece em regimes ditatoriais. Por isso, no Brasil, a Constituição garante a liberdade de expressão, com certas ressalvas. Logo, não se pode dizer que o ex-presidente tenha sofrido isso”, afirma Florêncio.

No entanto, o especialista explica que, mesmo em um estado democrático de direito como o Brasil, ainda é possível fazer uma leitura que entenda que o ex-presidente foi privado de sua liberdade em ações políticas.

“Há quem diga que passamos por uma fragilidade democrática e ela pode ser identificada na atual não comunhão entre as instituições”, afirma o advogado. Para Florêncio, uma prova disso foi o julgamento da execução provisória da pena do ex-presidente.

Na votação, cinco ministros votaram a favor e cinco votaram contra. Coube à presidente da Casa, ministra Cármen Lúcia, decidir pela negativa do habeas corpus preventivo. O Tribunal manteve o entendimento firmado em 2016 de que pessoas condenadas em segunda instância devem começar a cumprir a pena – o que impediu que o ex-presidente respondesse em liberdade até o fim do processo.

“O processo dele pode ser até levado à absolvição, como o próprio ministro [Luís Roberto] Barroso lembrou ao dar seu voto. O que foi julgado ali foi a execução provisória de pena. Ou seja, é cabível a leitura de que isso tenha ocorrido para que ele fosse retirado do processo democrático”, argumenta Florêncio.

“O fenômeno crime pode ser visto de vários aspectos. Essa leitura [de preso político] se enquadra neste”, conclui o advogado. “Rompe-se com a Constituição para não permitir que ele participe do procedimento democrático. É uma leitura que procede.”

Uso político do termo pelo PT

Já o cientista político Fernando Schüler diz acreditar que o Partido dos Trabalhadores tem usado o termo como uma manobra política e é “evidente” que o ex-presidente não é um preso político.

“O Brasil tem instituições sólidas e independentes. O Judiciário não responde a ninguém, assim como o Ministério Público também não”, afirma o professor do Insper. “Lula é um preso comum, como todos os outros condenados em segunda instância. Não é um preso político, assim como [os ex-ministros] Geddel Vieira e Antônio Palocci não são presos políticos. Você não pode escolher imaginar que só o seu político favorito não se enquadra.”

De acordo com Schüler, esta é uma estratégia usada pelo PT para politizar o julgamento. Ele vê dois objetivos no uso deste termo: um bem-sucedido e outro que não funcionou.

“O primeiro era fazer pressão para influenciar a justiça, algo que se mostrou ineficiente. Já o segundo, no terreno líquido da política, foi a retórica que fez o partido voltar a ser coeso e mobilizou militância”, afirma o especialista. “O militante, por definição, é um crente. Por isso essa estratégia foi bem-sucedida, trouxe de artistas a intelectuais alinhados com a causa.”

Schüler, no entanto, afirma que a estratégia é ruim para o exercício da democracia no Brasil, pois “procura deslegitimar as instituições nacionais que deveríamos lutar para fortalecer”.

“Além disso, quando o chamam de preso político, a mim soa como uma afronta a todos que foram no passado verdadeiramente presos políticos de regimes arbitrários, como é o caso da ex-presidente Dilma Rousseff e do próprio ex-presidente Lula quando era líder sindical”, conclui Schüler.

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