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Cármen Lúcia vai para 2ª Turma do STF; veja o que ela pensa sobre investigações

Cármen Lúcia passa a fazer parte da Turma que julga ações da Lava Jato - Marivaldo Oliveira/Estadão Conteúdo
Cármen Lúcia passa a fazer parte da Turma que julga ações da Lava Jato Imagem: Marivaldo Oliveira/Estadão Conteúdo

Felipe Amorim

Do UOL, em Brasília

18/09/2018 04h00

Nesta semana, após deixar a presidência do STF (Supremo Tribunal Federal), a ministra Cármen Lúcia volta a fazer parte da Segunda Turma do tribunal, órgão responsável por julgar processos da Operação Lava Jato.

A mudança na composição da Turma, com a saída de Dias Toffoli para a presidência do Supremo, é vista como uma possibilidade de virada no perfil dos julgamentos.

A Segunda Turma tem sido apontada como responsável por decisões mais favoráveis aos investigados. Foi com os votos de Toffoli, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, que a Turma decidiu manter em liberdade o ex-ministro José Dirceu. Os ministros Edson Fachin, relator dos processos da Lava Jato, e Celso de Mello, ficaram em minoria no julgamento.

A Segunda Turma também vinha tratando com rigor o uso de delações e provas apresentadas pelos delatores. Em agosto, também com os votos de Toffoli, Gilmar e Lewandowski, a Turma rejeitou denúncia contra o senador Ciro Nogueira (PP-PI), por entender que apenas provas entregues por delatores não seriam suficientes para autorizar a abertura de processo criminal. Nesse julgamento, Fachin foi voto vencido. O ministro Celso de Mello não participou da sessão.

Agora, com Cármen Lúcia integrando a Turma no lugar que foi de Toffoli, há a possibilidade de ser alterado o equilíbrio nos julgamentos, resultando em posições mais favoráveis às investigações, em conjunto com os ministros Edson Fachin e Celso de Mello.

segunda turma - Nelson Jr. 26.jun.2018/SCO/STF - Nelson Jr. 26.jun.2018/SCO/STF
Sessão da Segunda Turma do STF, para onde vai Cármen Lúcia
Imagem: Nelson Jr. 26.jun.2018/SCO/STF

A reportagem do UOL selecionou alguns votos recentes da ministra sobre temas que envolvem investigações criminais e o combate à corrupção, em processos que foram julgados pelo plenário do STF.

Foro privilegiado

A ministra foi a favor da restrição ao chamado foro privilegiado para deputados federais e senadores.

"O Brasil é uma República na esteira da qual a igualdade não é uma opção, é uma imposição", disse, no julgamento.

O Supremo decidiu em maio que apenas crimes cometidos durante o mandato e que tenham relação com o exercício do cargo deverão continuar sendo julgados pelo STF.

Improbidade administrativa

Cármen Lúcia foi um dos seis ministros que votaram a favor de que não haja prazo de prescrição para serem apresentadas ações que cobram o ressarcimento aos cofres públicos de prejuízos causados por atos de improbidade administrativa. A prescrição é o prazo máximo para apresentar uma ação judicial. O prazo varia de acordo com a situação.

Para a PGR (Procuradoria-Geral da República), esse entendimento ajuda no combate à corrupção e para que os danos ao poder público sejam reparados.

A ministra afirmou que o impedimento da prescrição está previsto na Constituição e decorre ainda da "circunstância de que se erigiu a própria probidade administrativa em princípio da Constituição", disse.

Poder do relator nas delações

A ministra votou a favor de reafirmar o poder do relator do Supremo e a validade do acordo de colaboração firmado pela JBS. De acordo com a decisão, tomada por 8 votos a 3, o relator tem poder de decidir sobre as cláusulas do acordo de delação premiada no momento de sua homologação.

"Portanto, o acordo homologado judicialmente é tido como ato jurídico perfeito, que não pode ser alterado sequer por modificação legislativa, sob pena de ofensa ao artigo 5º da Constituição e aos princípios da segurança jurídica e da confiança que o particular deposita no Estado", disse Cármen Lúcia, em seu voto.

"Cumpridos os termos do acordo homologado, deverão os mesmos ser integralmente aplicados ao colaborador. Em sentido contrário, descumpridos os termos acordados, será declarada a rescisão do acordo e o colaborador estará sujeito à punição regular. O que não se admite é a revisão de forma unilateral dos termos do acordo homologado na sentença ou no acórdão", afirmou a ministra.

A delação da JBS foi responsável por dar início às investigações contra o presidente Michel Temer (MDB) e o senador Aécio Neves (PSDB-MG), ambos alvo de denúncias apresentadas pela PGR (Procuradoria-Geral da República). As duas denúncias contra Temer foram barradas por decisão da Câmara dos Deputados. A denúncia contra Aécio foi aceita pela Primeira Turma do STF e o senador passou a responder como réu no processo. Temer e Aécio negam irregularidades.

Delações da PF

Cármen Lúcia foi um dos dez votos favoráveis ao poder de delegados de polícia negociarem acordos de colaboração premiada. A decisão vale tanto para a Polícia Federal quanto para a Polícia Civil dos estados.

A atribuição foi prevista na lei sobre as delações, mas ação da PGR (Procuradoria-Geral da República) defendia que essa fosse uma prerrogativa exclusiva do Ministério Público.

Em seu voto, Cármen Lúcia defendeu o "entendimento" entre as instituições. "Há a necessidade de cada instituição saber qual seu papel e quais seus limites e sua forma mais eficiente de atuar", disse a ministra.

Conduções coercitivas

A ministra foi a favor de manter a possibilidade das conduções coercitivas para interrogatório, desde que feitas de acordo com o previsto na legislação. Nesse julgamento, Cármen Lúcia foi voto vencido no placar de 6 votos a 5 que determinou a proibição da prática.

Segundo a ministra, desde que seguidas as regras previstas na lei, seriam possíveis as conduções para ouvir investigados. "A imposição de qualquer cerceio, de qualquer restrição à liberdade, há que ser feita, portanto, nos termos estritos da legislação vigente", disse.

A prática está prevista no Código de Processo Penal quando "o acusado não atender à intimação para o interrogatório, reconhecimento ou qualquer outro ato que, sem ele, não possa ser realizado".

Mas muitas vezes nas investigações os juízes determinavam a condução mesmo sem ter havido a negativa prévia de comparecer ao depoimento. Nessas circunstâncias, o juiz costumava justificar a decisão com o argumento de que a medida é menos grave que a decretação da prisão provisória do suspeito.

Cármen Lúcia defendeu que abusos na utilização da medida devem ser combatidos.

"Abusos praticados em investigação ou processo tem que ser resolvidos nos termos da legislação vigente, mas não aniquilam o próprio instituto", afirmou. "É certo que todo e qualquer abuso haverá de ser coarctado [restringido], é inaceitável, mas para os excessos há os meios jurídicos adequados", disse a ministra.