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Deputado admite ter comprado de agência base ilegal de contatos para campanha via WhatsApp

O deputado federal Laudívio Carvalho (PODE-MG), em foto registrada em junho de 2016 - Luís Macedo/Agência Câmara
O deputado federal Laudívio Carvalho (PODE-MG), em foto registrada em junho de 2016 Imagem: Luís Macedo/Agência Câmara

Leandro Prazeres, Flávio Costa e Aiuri Rebello

Do UOL, em Brasília e em São Paulo

13/11/2018 04h02

O deputado federal Laudívio Carvalho (PODE-MG) admitiu ao UOL que utilizou dados de 40 mil pessoas cedidos por uma agência de marketing digital para fazer disparos de mensagens via WhatsApp durante as eleições deste ano. A prática é considerada ilegal pela lei eleitoral. Esta é a primeira vez que um político admite irregularidades na utilização de mensagens via WhatsApp nas eleições deste ano.

Laudívio Carvalho é deputado federal de primeiro mandato. Neste ano, disputou a reeleição, mas não obteve sucesso e conseguiu apenas uma vaga como suplente.

A agência utilizada por ele durante a campanha foi a Quick Mobile, com sede em Belo Horizonte. De acordo com dados da Justiça Eleitoral, Laudívio pagou R$ 3.080 pelos serviços de marketing digital. Procurada, a empresa não respondeu aos questionamentos da reportagem.

A Quick Mobile é uma das empresas investigadas por suposta participação em esquema bancado por empresários para envio de mensagens via WhatsApp com conteúdo anti-PT. O caso foi revelado pelo jornal Folha de S.Paulo em outubro deste ano. Após a revelação da Folha, a PF (Polícia Federal) e o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) abriram uma investigação para apurar o caso.

Campanha usou dados fornecidos por agência

Segundo o deputado, sua campanha contratou a agência durante as eleições depois de receber um portfólio nos últimos dez dias antes da realização do primeiro turno, ocorrido em 7 de outubro. A Quick Mobile Desenvolvimento e Serviços é o nome fantasia da empresa P.R Querino, que aparece na prestação de contas da campanha de Laudívio Carvalho, de acordo com os dados do TSE.

"A Quick me entregou um portfólio de serviços nos últimos 10 dias da campanha e foi neste período que conheci o trabalho deles", disse o parlamentar, por meio de mensagens enviadas via WhatsApp por sua assessoria à reportagem do UOL.

Laudívio afirmou que a agência fez um disparo de mensagens via WhatsApp para 40 mil números de telefone celular que, segundo ele, foram oferecidos à sua campanha pela Quick Mobile.

A legislação eleitoral proíbe o envio de mensagens para usuários que não tenham sido cadastrados pelo candidato, partido ou por sua coligação. Além disso, a lei veda também a comercialização de cadastros de usuários.

"Este ato é irregular e configura uma infração da legislação eleitoral", afirma o advogado, especialista em direito constitucional e eleitoral, Daniel Falcão. Ele é professor do IDP (Instituto Brasiliense de Direito Público).

A infração pode gerar uma multa entre R$ 5 mil e R$ 30 mil.

Deputado é membro das bancadas da bala e da Bíblia

Novato na Câmara dos Deputados, o congressista Laudívio Carvalho atuou junto às chamadas bancadas "da bala" e "da Bíblia" durante o seu mandato. Ele é radialista de profissão.

Em 2017, ele foi relator da comissão especial da Câmara que analisou o projeto de lei que revoga o Estatuto do Desarmamento e facilita a aquisição de armas de fogo no país.

Neste ano, ele viu seu número de votos cair mais da metade. Em 2014, obteve 78,7 mil votos. Em 2018, 31,1 mil. Com essa votação, ele precisa que integrantes da sua coligação desistam da vaga na Câmara para ele continuar como deputado federal.

O UOL ligou para os telefones da Quick Mobile e enviou email para dois endereços distintos da empresa, que constam em seu site oficial. Nenhuma resposta foi enviada até a publicação desta reportagem.

À Folha, na reportagem do último dia 18, o sócio da Quick Mobile, Peterson Rosa, afirmou que a empresa não estaria atuando na política neste ano e que seu foco é apenas mídia corporativa. Ele negou ter fechado contrato com empresários para disparo de conteúdo político.

Empresas do caso WhatsApp receberam R$ 2,5 milhões

Empresas envolvidas em investigações do TSE, da PF e do MPE-SP (Ministério Público Eleitoral de São Paulo) sobre disparos de mensagem em massa via WhatsApp receberam pelo menos R$ 2,5 milhões de candidatos e partidos durante as eleições.

A líder desse ranking é a Deep Marketing, que recebeu R$ 2 milhões da campanha do ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles (MDB) à Presidência da República. A agência é alvo de apuração do MPE-SP por sua atuação na campanha de João Doria (PSDB) ao governo de São Paulo, quando teria disparado mensagens negativas sobre Paulo Skaf, então candidato do MDB e adversário do tucano.

O levantamento feito pelo UOL teve como base os dados da prestação de contas oficial de candidatos e partidos à Justiça Eleitoral. O montante recebido por essas empresas foi pago por 17 candidatos de diferentes partidos e pelo diretório estadual do partido Novo em Minas Gerais (veja a tabela abaixo).

Os valores podem ser alterados porque o prazo final para a apresentação das contas eleitorais de quem disputou o segundo turno das eleições termina no dia 17 de novembro.

Pelo menos quatro agências teriam participado do esquema de disparos anti-PT revelado pela Folha: Yacows, Croc Services, SMS Market e a já mencionada Quick Mobile.

O levantamento realizado pelo UOL incluiu outras duas empresas que têm como sócio ou proprietário o empresário Lindolfo Antônio Alves Neto, diretor e um dos donos da Yacows: a Kiplix Comunicação Digital LTDA, que teria prestado serviços à agência responsável pela campanha de Jair Bolsonaro, e a já mencionada Deep Marketing LTDA. Juntas, essas empresas receberam R$ 2,111 milhões.

O empresário Lindolfo Antônio Alves Neto também aparece como sócio também da Maut Desenvolvimento de Software LTDA, que recebeu um total de mais de R$ 138 mil de 20 candidatos. Esta empresa não é citada nas investigações mencionadas acima.

A Croc Services recebeu R$ 415 mil, enquanto a Quick Mobile recebeu R$ 18 mil. Até o momento, a SMS Market não aparece nas prestações de conta divulgadas pela Justiça Eleitoral.

Candidatos dizem que usaram base própria de contatos

No início do mês, por meio de nota enviada ao UOL, a campanha de Henrique Meirelles declarou que "não contratou disparos com 'base comprada'. Usou apenas base orgânica e do próprio partido", o que é permitido pela legislação eleitoral.

A assessoria do governador eleito de Minas Gerais pelo partido Novo, Romeu Zema, informou "que a candidatura contratou serviço de envio de mensagem por WhatsApp somente para envio aos filiados ao partido, pessoas cadastradas pelo website e ações de mobilização de apoiadores, como o 'Novo na Rua'".

O deputado federal Vitor Valim (PROS-CE) disputou nestas eleições uma vaga na Assembleia Legislativa do Ceará. Eleito deputado estadual com 63.462 votos, ele afirma que "criou seu próprio banco de dados durante a vida pública".

Valim apresentou à reportagem uma das notas fiscais da prestação de serviços da Kiplix. Para um disparo de mensagem para 75 mil números de telefone, ele pagou a quantia de R$ 4,8 mil.

Por sua vez, o deputado estadual reeleito Rogério Nogueira (DEM-SP), confirmou que contratou a Kiplix, "para disparo de mensagem de WhatsApp e utilizou a plataforma com uma base de dados própria".

Por meio de sua assessoria de imprensa, o deputado estadual Edmir Chedid (DEM-SP) negou qualquer irregularidade na contratação da Kiplix. Segundo o parlamentar, a empresa foi indicada por colegas. O deputado afirma que usou seu próprio banco de dados para direcionar o envio de mensagens.

A reportagem fez ligações, enviou emails e mensagens de texto para João Leite (PSDB-MG), Flávia Rita (PMB-MG), Arnaldinho Borgo (MDB-ES), Paulo Abi Ackel (PSDB-MG), Danilo Forte (PSDB-CE), Antônio Jorge (PPS-MG) e Alencar da Silveira (PDT-MG), mas não recebeu retorno.

O candidato a deputado federal Promotor Rômulo Ferraz (PV-MG) não foi localizado. A reportagem ligou para o diretório mineiro do PV, que repassou o telefone de uma de suas assessoras. Foram feitas três ligações para o telefone fornecido, mas nenhuma foi atendida ou respondida posteriormente.

A assessoria de imprensa do PSDB em São Paulo afirmou que o candidato a deputado estadual Gilson Barreto Jr. responderia às indagações do UOL sobre o contrato firmado com a Kiplix, o que não ocorreu até a publicação desta reportagem. Ele não se elegeu.

Também não houve resposta dos diretórios paulistas do PSL e do PTB aos emails enviados pelo UOL sobre a prestação de serviço da mesma empresa aos candidatos Tenente Nascimento e Chiquinho Pereira, respectivamente.

A reportagem enviou email e telefonou para as empresas Croc Services, Quick Mobile e Yacows, porém, não recebeu qualquer resposta até a publicação desta reportagem.

UOL revelou que PT, Bolsonaro, Doria e Meirelles usaram serviços investigados

Há pouco mais de duas semanas, o UOL vem publicando reportagens mostrando que diversos políticos utilizaram o sistema de envio em massa de mensagens da empresa Yacows, citada no esquema sob investigação.

Entre as campanhas que utilizaram o sistema estão as dos então candidatos à Presidência Fernando Haddad (PT) e Henrique Meirelles (MDB), a do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) e a do governador eleito de São Paulo, João Doria (PSDB).

A reportagem do UOL publicada no último dia 26 apresentou relatos de que a Quick Mobile também teria atuado junto à campanha de Bolsonaro. Uma ex-funcionária da empresa disse ter informações de que a agência comprava bases de dados de terceiros e usava softwares para "garimpar" números de telefone de usuários de redes sociais.

Desde a publicação dessas informações, a PF incluiu dados dessas reportagens na investigação sobre a suposta compra de disparos anti-PT.