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Carreata pró-Bolsonaro e anti-Doria reúne multidão e fecha Paulista

Aiuri Rebello

Do UOL, em São Paulo

19/04/2020 14h09Atualizada em 19/04/2020 23h08

A carreata a favor do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que tinha entre outras bandeiras um golpe militar, críticas ao governador de São Paulo, João Doria (PSDB-SP), e o pedido pelo fim isolamento social por conta da pandemia de covid-19, causada pelo novo coronavírus, reuniu milhares de pessoas e centenas de carros hoje em São Paulo.

Foi a segunda manifestação do tipo em menos de 24 horas, mas a deste domingo foi bem maior que a do sábado na capital de SP.

Por volta das 17h30, a carreata fechava o sentido Paraíso da Avenida Paulista, uma das mais mais importantes da capital, completamente. A fila de carros estendia-se por pelo menos seis quarteirões. No sentido Consolação, apenas uma faixa estava liberada para passagem no mesmo horário, na altura do prédio da Fiesp (Federação das Indústrias Do Estado de São Paulo).

A Polícia Militar, que acompanhava a movimentação sem intervir no fechamento da via, não divulgou uma estimativa de público.

O número de carros bloqueando a avenida era tanto que a CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) desviou o trânsito na altura do Conjunto Nacional. Por volta das 18h30, a multidão e os veículos começaram a dispersar-se.

A exemplo do que já havia acontecido na concentração da carreata, mais cedo, centenas de manifestantes deixaram seus carros e aglomeraram-se aos gritos de palavras de ordem contra Doria, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), STF e o isolamento social em vigor no estado e recomendado por todas as autoridades de saúde do mundo.

Pedidos de um golpe militar e de "Bolsonaro está certo!" também eram comuns entre os manifestantes.

40 Km em 4 horas

A carreata saiu da região do Ibirapuera, na zona sul da capital, e antes de chegar até a Paulista, passou pela sede da TV Globo, também alvo do protesto, e pelo Palácio dos Bandeirantes, no Morumbi, sede do governo paulista.

Foram cerca de 40 quilômetros percorridos em 4 horas de carreata.

Pelo caminho, o protesto dividia transeuntes e outros motoristas. Alguns moradores de prédios próximos chegaram a jogar ovos contra o comboio em alguns momentos, mas de outras janelas no mesmo edifício pendiam bandeiras do Brasil, e muitos pedestres aplaudiam e outros motoristas buzinavam em apoio ao cortejo.

Pedidos de golpe

Na concentração da carreata, que começou ao meio-dia em frente ao comando da 2ª Região Militar e à Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo), próximo ao Parque do Ibirapuera, os manifestantes entoavam palavras de ordem a favor do presidente Jair Bolsonaro e contra o governador de São Paulo, e o isolamento social em vigor no estado.

Soldados nas guaritas do quartel ouviam com cara impassível e olhar no horizonte pedidos de golpe militar entoados por parte dos presentes. "Militares, venha conosco, precisamos de vocês", gritava um grupo em frente ao portão. Faixas e cartazes estendidos nos carros e nas mãos dos bolsonaristas estavam por toda a parte.

"Aqui só tem gente honesta, que quer trabalhar, fora Doria!", entoava um manifestante enrolado em uma bandeira do Brasil enquanto fazia uma live nas redes sociais.

Um grupo grande, com centenas de veículos que juntou-se mais cedo na Marginal Pinheiros, chegou ao local.

Enquanto a concentração crescia — por volta das 13h45, a fila dupla de carros já dava a volta na Alesp —- ambulantes aproveitavam para faturar. Com bandeiras do Brasil a R$ 10, máscaras de pano e cirúrgicas a R$ 2 e bebidas geladas de diversos tipos e preços. Perto das 14h, fazia quase 30 graus ao sol.

O carro de som no começo do comboio tocava uma espécie de arrocha com arranjo musical sofisticado contra o governador de São Paulo. Perto das 14h, um buzinaço foi a senha para os motoristas ligarem seus motores e darem início à carreata.

Diversos manifestantes não acataram a orientação de um dos grupos de apoio ao presidente que convocaram os atos deste domingo (19), como o Nas Ruas, de não sair dos carros durante a carreata. Na concentração e no final, na Avenida Paulista, centenas de pessoas circulavam entre os veículos.

Do ponto de partida até a Avenida Rebouças, em um percurso de cerca de três quilômetros, a caravana levou uma hora tamanha a confusão e número de carros presentes.

Dali, parte dos motoristas seguiu diretamente para a Avenida Paulista, enquanto a maioria desceu a Rebouças em direção à Marginal Pinheiros para a próxima parada prevista na programação divulgada em grupos de WhatsApp, a sede da TV Globo.

Lá, a PM segurou o trânsito convencional para a carreata fazer uma breve parada na Ponte Octávio Frias de Oliveira — a ponte estaiada que aparece ao fundo em alguns telejornais da emissora transmitidos do local.

Alguns carros seguiram para o Palácio dos Bandeirantes, e a maioria foi direto para a Avenida Paulista.

Parte das pessoas usava máscaras, mas a maioria estava sem a proteção. Muitos grupos também não respeitavam a distância mínima de um a dois metros a ser mantida entre as pessoas.

"Vocês são loucos"

De vez em quando, algum motorista que passava gritava contra o presidente ou xingava os manifestantes.

"Vocês são loucos, fora Bolsonaro!", gritou uma mulher com cerca de 40 anos, que cruzou com o grupo enquanto voltava de uma caminhada na área externa do Parque do Ibirapuera. Ela também não utilizava máscara.

"Você não vê que é tudo política? Isso tudo é uma farsa", gritou de volta um manifestante. "Bolsonaro está certo! Pra cima Deles Brasil!", entoavam alguns manifestantes próximos ao início do comboio. "Fora Doria, fora Doria", dizia outro grupo.

Alguns manifestantes não negavam a gravidade da pandemia de covid-19, doença causada pelo novo coronavírus. Apesar disso, eram contra o isolamento social total em vigor em diversas cidades e estados do país.

"Tá errado, tem que isolar os mais frágeis em casa e deixar os mais jovens trabalhar, fazer o isolamento social", afirmava a advogada Isabela, de 58 anos. Ela usava máscara. "O que querem é uma desculpa para quebrar a economia e assim não deixar o Bolsonaro reeleger-se em 2022. Não adianta, a gente não é trouxa", disse.

Outros manifestantes pediam a decretação de um AI-5 em cartazes e discursos. Dezenas de motociclistas e caminhoneiros também participaram do protesto, e o buzinaço foi intenso durante todo o caminho.

Governo de SP lamenta ato

Em nota, o governo de SP afirma que defende o direito à livre manifestação, mas lamenta que ela seja a favor de uma pandemia que já matou, até o momento, 1.015 pessoas no estado.

"A manutenção da quarentena é essencial para que o sistema de saúde comporte a demanda de pacientes e não aconteçam ainda mais óbitos. A medida visa preservar o bem mais valioso, que é a vida", afirma o comunicado. "O governo tem mantido o diálogo com a população e com os setores produtivo, de comércio e serviços e vai intensificá-lo para estruturar um plano de ação de reabertura das atividades a ser implementado assim que for possível flexibilizar as atuais restrições de funcionamento necessárias."