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Moraes centraliza inquérito sobre fake news e nem delegados sabem detalhes

Moro afirmou que Bolsonaro manifestou preocupação com o inquérito das fake news comandado por Moraes (na foto) no STF - Rosinei Coutinho/SCO/STF
Moro afirmou que Bolsonaro manifestou preocupação com o inquérito das fake news comandado por Moraes (na foto) no STF Imagem: Rosinei Coutinho/SCO/STF

Aiuri Rebello e Eduardo Militão

Do UOL, em São Paulo e em Brasília

12/05/2020 04h02

Resumo da notícia

  • Ministro Moraes concentra inquérito sobre fake news no STF pra evitar interferências
  • Delegados da investigação afirmam não saber detalhes sobre andamento dos trabalhos
  • Policiais desconhecem quem é investigado formalmente ou o resultado das operações
  • Inquérito é considerado ilegal por procuradores e juristas; PGR já pediu arquivamento

O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), blindou de tal forma a investigação que apura fake news contra a Corte que mesmo os delegados designados pela PF (Polícia Federal) para levar adiante o inquérito trabalham no escuro sob controle do ministro, que comanda as operações.

De acordo com policiais que participam da investigação ouvidos pelo UOL, apenas o ministro e seu gabinete possuem uma visão completa do que há no procedimento. A meta é manter a apuração blindada de qualquer tentativa de interferência.

No dia em que pediu demissão o ex-ministro da Justiça Sergio Moro divulgou uma troca de mensagens com Jair Bolsonaro (sem partido) onde o presidente indicava receio em relação à investigação, de iniciativa do próprio STF, ao comentar uma notícia sobre parlamentares aliados dele que eram investigados, e disse tratar-se de mais um motivo para trocar o diretor-geral da PF.

De acordo com reportagem do jornal "Folha de S.Paulo", um dos alvos no inquérito do STF seria o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), filho do presidente. Ele nega qualquer esquema.

No final do ano passado, o UOL mostrou que o STF apurava a relação entre uma rede de fake news pró-Bolsonaro e os ataques à Corte.

A reportagem procurou o gabinete de Alexandre de Moraes no STF e a Polícia Federal, mas não obteve esclarecimentos.

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Quebra-cabeças

Os delegados, de acordo com os relatos obtidos pela reportagem, não têm acesso nem a informações básicas do inquérito, como quem é investigado formalmente. As informações produzidas não são compartilhadas oficialmente com os outros, as equipes não recebem retorno sobre os relatórios que enviam ao gabinete do ministro e quando recebem uma ordem, ela contém os elementos mínimos para serem cumpridas.

É como se fosse um quebra-cabeça onde apenas ele encaixa as peças e consegue ver a imagem que está sendo formada. O ministro Alexandre desenhou a investigação dessa forma blindada desde o começo. Parece que já previa tentativas de interferência nisso.
Delegado da PF, que pediu anonimato

Moraes age como chefe do trabalho de investigação policial, acompanha os trabalhos e faz pedidos à polícia no lugar do Ministério Público e decide sobre o encaminhamento do caso. Em uma quebra de sigilo telefônico, por exemplo, é ele quem pede e autoriza a ação, analisa o conteúdo colhido e decide o encaminhamento do material.

Policiais ouvidos pelo UOL acreditam que o inquérito não deve sofrer alterações em seu curso e ainda pode ficar aberto por muito tempo.

Delegados foram blindados pelo STF

Como medida de segurança adicional, após Moro acusar o presidente de tentar interferir politicamente na PF, Moraes mandou manter os cinco delegados dessa investigação. Eles lideram equipes com agentes, escrivães. Muitas vezes, peritos também são acionados. No despacho, o ministro não explica o motivo de ter pedido a manutenção dos delegados e apenas determina que a Direção Executiva da PF não mexa com eles.

Os delegados citados são Alberto Ferreira Neto, Igor Romário de Paula, Denisse Dias Rosas Ribeiro, Fábio Alceu Mertens e Daniel Daher.

Com exceção de Ferreira Neto, que trabalha da Superintendência de São Paulo, todos atuam em Brasília.

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STF pediu investigações sem provocação da PGR

O inquérito das fake news foi aberto em março do ano passado a mando do presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, para apurar a disseminação de ataques, ameaças e notícias falsas contra integrantes da corte.

A instauração do inquérito foi muito criticada pelo fato de a Corte ter agido de ofício, ou seja, ter iniciado uma investigação sem ser provocada pela PGR (Procuradoria-Geral da República), que sequer participa das apurações.

Ainda no final do ano passado, o UOL revelou que o STF estava desmembrando o inquérito das fake news, mas o MPF (Ministério Público Federal) estava rejeitando as ações e arquivando os casos.

A manobra é uma tentativa "esquentar" casos concretos que aparecem na investigação e trazê-los para dentro do rito legal, já que a investigação é considerada ilegal por procuradores e juristas. A PGR já pediu o arquivamento do inquérito das fake news duas vezes.