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STF decide que lei inspirada no Escola sem Partido é inconstitucional

O ministro do STF Luís Roberto Barroso é o relator da ação contra a lei de Alagoas - 18.mar.2020 - Nelson Jr./SCO/STF
O ministro do STF Luís Roberto Barroso é o relator da ação contra a lei de Alagoas Imagem: 18.mar.2020 - Nelson Jr./SCO/STF

Felipe Amorim e Marcelo Oliveira

Do UOL, em Brasília, e do UOL, em São Paulo

21/08/2020 20h01Atualizada em 21/08/2020 22h47

O STF considerou inconstitucional uma lei estadual de Alagoas semelhante ao projeto Escola sem Partido. Foram nove votos contra a lei e somente um a favor.

Batizada de "Escola Livre", a legislação alagoana proíbe a "prática de doutrinação política e ideológica" em sala de aula e afirma ser um direito dos pais que seus filhos recebam uma "educação moral livre de doutrinação política, religiosa ou ideológica".

A lei estava suspensa desde março de 2017 por uma liminar do ministro Luís Roberto Barroso, relator do processo. Após debates, a ação direta de inconstitucionalidade, movida pelo PDT e pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino, passou a ser julgada nesta semana pelo plenário do STF.

Relator do processo, Barroso confirmou voto em definitivo pela inconstitucionalidade da lei estadual alagoana. Em seguida, oito ministros votaram pela invalidação da lei. O julgamento foi realizado no plenário virtual, sistema no qual os ministros postam os votos de forma remota e não há debate entre eles durante a votação.

Há possibilidade de votar pelo sistema até pouco antes da meia-noite de hoje, porém dez ministros já votaram. Apenas o ministro Celso de Mello não se manifestou, por estar em licença de saúde após uma cirurgia.

Além de Barroso, votaram contra a lei de Alagoas os ministros Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Edson Fachin, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Rosa Weber e Luiz Fux. O ministro Marco Aurélio votou de forma contrária à maioria.

Decisão indicará entendimento do STF sobre o tema

A decisão do caso terá validade apenas para o caso de Alagoas, mas a posição dos ministros indicará o entendimento do tribunal sobre esse tipo de legislação.

O esperado é que sejam adotadas decisões semelhantes contra leis do tipo que vierem a ser questionadas no STF.

No âmbito federal, há um projeto de lei em tramitação na Câmara dos Deputados que tenta implantar o Escola sem Partido. A proposta tem a simpatia do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

O STF já impôs uma série de derrotas a leis municipais inspiradas no Escola sem Partido que tratavam da proibição de o ensino escolar abordar temas relacionados a gênero e sexualidade. Mas a lei em julgamento, além de estadual, possui abrangência mais ampla ao citar a possibilidade de "doutrinação" de forma genérica e sem estar limitada a um tema específico.

O movimento Escola sem Partido nasceu de mobilização de setores da sociedade que entendem haver doutrinação política e ideológica nas escolas. A acusação é comumente associada à propagação em sala de aula de ideias identificadas à esquerda do espectro político.

Pluralismo deve ser assegurado

Em seu voto sobre a lei alagoana, o ministro Luís Roberto Barroso afirmou que Constituição e a legislação federal garantem o pluralismo de ideias no ensino.

"A ideia de neutralidade política e ideológica da lei estadual é antagônica à de proteção ao pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas e à promoção da tolerância, tal como previstas na Lei de Diretrizes e Bases da Educação", disse o ministro.

"A exigência de neutralidade política e ideológica implica, ademais, a não tolerância de diferentes visões de mundo, ideologias e perspectivas políticas em sala", afirmou Barroso.

O ministro afirmou ainda que a diversidade de ideias na formação escolar garante o espírito crítico dos estudantes e a capacidade de conviver e respeitar diferenças na sociedade.

"Quanto maior é o contato do aluno com visões de mundo diferentes, mais amplo tende a ser o universo de ideias a partir do qual pode desenvolver uma visão crítica, e mais confortável tende a ser o trânsito em ambientes diferentes dos seus", disse.

"É por isso que o pluralismo ideológico e a promoção dos valores da liberdade são assegurados na Constituição e em todas as normas internacionais antes mencionadas, sem que haja menção, em qualquer uma delas, à neutralidade como princípio diretivo", afirmou Barroso em seu voto.

Em seu voto divergente, o ministro Marco Aurélio também defendeu a pluralidade de visões na democracia e a liberdade de expressão, porém ressaltou que ao Judiciário não cabe "corrigir ou aperfeiçoar decisão política regularmente tomada no âmbito do Legislativo".