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Fachin vota para que injúria racial seja imprescritível: 'Chaga infame'

O ministro Edson Fachin, do STF - Nelson Jr./SCO/STF
O ministro Edson Fachin, do STF Imagem: Nelson Jr./SCO/STF

Felipe Amorim

Do UOL, em Brasília

26/11/2020 18h31Atualizada em 26/11/2020 19h10

Em julgamento na tarde de hoje, o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Edson Fachin defendeu que a injúria racial deve ser tratada como um crime imprescritível.

Em seu voto, o ministro afirmou que o racismo representa uma "chaga" na sociedade brasileira e reafirmou a existência de preconceito racial no país. "Há racismo no Brasil. É uma chaga infame que marca a interface entre o ontem e o amanhã", disse Fachin.

A afirmação de Fachin se contrapõe às declarações do vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB) que na semana passada disse acreditar que "no Brasil não existe racismo".

O STF começou a julgar hoje se a injúria racial é um crime imprescritível, assim como os crimes previstos na lei que trata dos crimes de racismo. A injúria racial está citada no texto do Código Penal.

Após o voto de Fachin, relator do processo, o julgamento foi suspenso e será retomado na próxima quarta-feira (2).

O caso entrou na pauta do Supremo após João Alberto Freitas, um homem negro de 40 anos, ser morto por seguranças de uma loja do supermercado Carrefour em Porto Alegre, na semana passada.

A prescrição é uma regra jurídica que limita o tempo de duração do processo em que é possível aplicar punições aos acusados. A Constituição Federal considera o racismo um crime imprescritível, ou seja, que não está sujeito a essa limitação temporal.

Mas decisões judiciais em instâncias inferiores têm aplicado o entendimento de que a injúria racial seria um tipo do crime de injúria e, como tal, também estaria sujeito à regra da prescrição.

A injúria consiste em proferir ofensas contra outra pessoa. Quando essas ofensas tem raiz na raça ou cor do ofendido, trata-se de uma injúria racial.

Em 2015, o STJ reconheceu que a injúria racial deveria ser tratada como um crime imprescritível, posição que também foi adotada em 2018 por julgamento da Primeira Turma do STF.

Agora, o tema está sendo analisado no plenário do Supremo, composto de 11 ministros.

Por ser um julgamento em ação de habeas corpus, a decisão do STF terá efeito imediato apenas no caso concreto, mas, como toda decisão do Supremo, servirá de parâmetro para orientar as demais instâncias do Poder Judiciário.

O caso que levou o Supremo a discutir a injúria racial

O caso analisado ocorreu em 2012, quando uma idosa de Brasília ofendeu uma frentista em um posto de gasolina ao ser informada que não poderia pagar com cheque. A idosa chamou a funcionária do posto de "negrinha nojenta, ignorante e atrevida", segundo consta da denúncia oferecida pelo Ministério Público.

A idosa foi condenada pela Justiça do Distrito Federal em 2013 a um ano de reclusão e ao pagamento de dez dias multa. A sentença foi mantida após os recursos da defesa serem julgados pelo Tribunal de Justiça do DF e pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça). A defesa alega que, por ter mais de 70 anos, o que reduz o prazo da prescrição, não seria mais possível aplicar a pena à acusada.

Em seu voto, Fachin afirma que a injúria racial é uma modalidade dos crimes de racismo pois sua prática está ligada à inferiorização de todo um grupo social.

A prática do crime de injúria racial traz em seu bojo o emprego de elementos associados ao que se define como raça, cor, etnia, religião ou origem para se ofender ou insultar alguém"
Edson Fachin, ministro do STF

"Aqui se afasta o argumento de que o racismo se dirige contra grupo social, enquanto a injúria afeta o indivíduo singularmente. A distinção é uma operação impossível, apenas se concebe um sujeito como vítima da injúria racial se ele se amoldar aos estereótipos e estigmas forjados contra o grupo ao qual pertence", afirmou Fachin.