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FHC diz que entre Lula e Bolsonaro vota no petista, "o menos ruim"

Carolina Marins, Douglas Porto, Felipe Oliveira e Thaís Augusto

Do UOL, em São Paulo, e colaboração para o UOL, em São Paulo

16/03/2021 16h58Atualizada em 16/03/2021 20h30

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse hoje que Luiz Inácio Lula da Silva é "calejado pela vida" e que, em 2022, "vota em quem for menos ruim" numa possível disputa entre o petista e o atual presidente, Jair Bolsonaro (sem partido). A declaração foi dada hoje no UOL Entrevista, conduzido pelo colunista Tales Faria.

"O Lula foi calejado pela vida. Isso conta. Não é nenhum principiante. Ele deu uma entrevista agora e acertou em uns pontos fundamentais, ele tem jeito para a coisa", afirmou FHC, citando evento feito por Lula após ter suas condenações anuladas pelo ministro Edson Fachin, do STF (Supremo Tribunal Federal).

Lula não é de esquerda nem de direita, o Lula é ele.

"Ele não é o mal", acrescentou FHC. "Acho que Lula tem experiência do mundo, do Brasil, da pobreza, e enriqueceu. Não sei se Lula vai ter condições para ser candidato, ou se seria o melhor candidato, mas acho que, se ficar entre ele e Bolsonaro, voto em quem for menos pior."

Sobre a decisão de Fachin, FHC criticou o processo e a demora. "Não anularam as acusações, anularam o processo, vão refazer o processo. Era fácil reconhecer que o processo estava mal encaminhado", afirmou.

Lamento por terem esperado tantos anos para descobrir a pólvora, que é isso? Não tem muito cabimento. Agora, todo mundo ligado ao Lula vai interpretar como se fosse a nulidade das acusações, não é, é a nulidade do processo. Agora, politicamente abre-se um caminho novo, diferente. Vamos ver o que vai acontecer.

O processo ainda deverá ser avaliado pelo Plenário do Supremo. Mas, com isso, Lula recupera seus direitos políticos e pode se candidatar a presidente em 2022.

Questionado se o pleito de 2018 se repetisse hoje, com Fernando Haddad (PT) e Jair Bolsonaro disputando novamente, FHC conta que votaria "contra Bolsonaro".

Se houver, espero que não haja, essa dicotomia ou Haddad ou Bolsonaro, ou alguém do PT, lógico, que seja razoável, ou Bolsonaro, votaria mais contra o Bolsonaro.

Em sua avaliação, os governos petistas de Lula e Dilma Rousseff tiveram menos consequências negativas do que o atual governo de Bolsonaro. "Falando de maneira objetiva, as consequências que podem ser positivas ou negativas, somando do Lula e mesmo da Dilma, que foi bastante negativa em muitos aspectos, foram menos graves que as negativas atuais do presidente Bolsonaro."

Troca de ministro é 'mau sinal'

O ex-presidente criticou a nova troca de ministro da Saúde feita nesta semana pelo presidente. Segundo Fernando Henrique Cardoso, ter quatro ministros diferentes durante uma pandemia é "um mau sinal".

"Na pandemia, um momento difícil para todo mundo, você tem que dar força ao ministro, porque ele está na linha de frente. Não quero dizer que o presidente é o responsável pelas mudanças, mas uma parte da responsabilidade cabe ao presidente."

Às vezes é inevitável. Quer ir embora vai embora, ou um acidente, algo incontrolável e tal. Mas, neste momento, a gente já tendo tanto ministro da Saúde não é um bom sinal.

O médico cardiologista Marcelo Queiroga vai substituir o general Eduardo Pazuello, que ficou dez meses no cargo e vinha sendo criticado por sua subserviência ao presidente e sua condução da política sanitária contra a covid-19 —em especial, no que diz respeito às vacinas e à crise de oxigênio no Amazonas.

Antes de Pazuello, passaram pelo cargo Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich. Ambos saíram por desavenças com o presidente no combate à pandemia.

"Dá a sensação de que o presidente Bolsonaro tem vontade de mando, pelo menos é o que dizem os ministros dele. Dá a sensação de que é ele quem interfere, fala. Mas não sei realmente o que acontece", acrescentou ele.

Além da troca de ministro, FHC criticou a atitude de Bolsonaro minimizar a doença. "As pessoas estão morrendo e a falta de sentimentos demonstrada pelo presidente é grande. E também é delicado porque ele minimiza: 'Não é nada, é uma gripezinha'. Como é uma gripezinha? Está morrendo muita gente."

'Moro teve coragem' como juiz

Para o ex-presidente, o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro teve coragem durante a sua atuação como juiz na Operação Lava Jato. Mas ponderou que, "se tivesse ficado como juiz, seria melhor".

"Sempre fui partidário de que a Lava Jato avançasse, porque mexer com gente rica e poderosa não é fácil, então acho que Moro teve competência e coragem pra fazer isso", afirmou.

Não me cabe ficar criticando, mas acho que Moro aceitou ser ministro, uma coisa para a qual não foi vocacionado. Se tivesse ficado como juiz, seria melhor para ele. Dá a impressão, embora não acho que seja verdadeiro, de que ele tinha objetivos que não eram processuais apenas.

Ele também ressaltou que Moro, como juiz, teve papel importante. "Os erros dele foram pessoais, de aceitar o ministério, mas não invalidam a sua atuação enquanto juiz."

A Segunda Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) retomou, na semana passada, julgamento da suspeição do ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro, que condenou Lula no caso do tríplex do Guarujá.

O placar da votação está, até o momento, empatado em 2 a 2: Gilmar Mendes, presidente do colegiado, e Ricardo Lewandowski, votaram contra o ex-juiz —ou seja, a favor da suspeição.

Mas o julgamento foi adiado após pedido de vista do ministro Nunes Marques. Ainda não há data para a retomada do julgamento.

'PSDB precisa retomar suas bandeiras'

Fernando Henrique Cardoso disse que seu partido, o PSDB, se encabulou nas bandeiras que defende e precisa voltar a elas. "O PSDB tem que mostrar sua raiva, seu sentimento. Não quer dizer que vai romper relações pessoais com A, B ou C, mas quer dizer que tem que ter um lado e esse lado tem que ser sabido, conhecido."

O PSDB, de alguma maneira, ficou conivente com o governo, não participou diretamente, mas ficou conivente. Então eu acho que tem uma parcela razoável de culpa e, nesse momento, você tem que ser crítico do que está acontecendo, abertamente crítico, e não ficar meia-boca.

Dois nomes cotados para encabeçar a chapa do partido são os governadores João Doria, de São Paulo, e Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul. Mas, para que vençam, é preciso que os dois se coloquem como oposição a Jair Bolsonaro.

Logo, [Doria e Leite] terão dificuldade de fazer oposição ao governo. Se não tiver oposição, não ganha. Parecido com parecido, melhor quem já está.

"Se achar [um novo nome para ser candidato], é melhor, mas pode ser que não tenha. Tanto um quanto outro são capazes de governar o estado, são eficazes, mas depende do clima do eleitorado. Não é tanto direta ou esquerda que está em jogo, mas a capacidade ou não de levar adiante as necessidades do povo e da máquina pública."

O ex-presidente disse que não é contra uma possível aliança com o governo petista, mas diz haver barreiras do próprio PT. "O PT sempre foi contrário a isso, sempre foi intransigente nessa matéria, desde meu governo, eram contra tudo. Eu pessoalmente não tenho restrição de que haja uma ligação ampla, política, mas explícita."

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do publicado na primeira versão, Eduardo Pazuello não foi o ministro mais longevo na gestão Jair Bolsonaro. Luiz Henrique Mandetta ficou um ano e quatro meses no cargo. A informação foi corrigida.
Diferentemente do informado no texto, o pleito entre Fernando Haddad e Jair Bolsonaro foi em 2018, não em 2016. A informação foi corrigida.