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CPI: Relatório sobre fake news culpa Bolsonaro, mas poupa gabinete paralelo

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido), em evento no Palácio do Planalto Imagem: Ueslei Marcelino/Reuters

Luciana Amaral e Lucas Valença

Do UOL, em Brasília

08/10/2021 04h00Atualizada em 08/10/2021 19h32

O relatório parcial da CPI da Covid sobre fake news deve sugerir o indiciamento do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e integrantes do alto escalão do governo federal. No entanto, segundo o UOL apurou, deve poupar membros do chamado gabinete paralelo, como empresários, médicos e blogueiros.

Há um entendimento entre parte dos senadores de que emitir opiniões e difundir "conteúdo desinformativo" — na contramão do que mostra a ciência — não devem ser considerados crimes com base nas apurações e evidências coletadas pela CPI até o momento. Alguns parlamentares também enxergaram dificuldades em fazer sugestões de enquadramentos penais e preferiram focar nas ações do governo federal na pandemia — prioridade das investigações da Comissão Parlamentar de Inquérito.

Dessa forma, o relatório parcial não deve pedir o indiciamento de pessoas que não integram diretamente o governo federal. Por exemplo, os empresários Luciano Hang, Carlos Wizard e Otávio Fakhoury, a médica Nise Yamaguchi, o presidente do CFM (Conselho Federal de Medicina), Mauro Luiz de Britto Ribeiro, e o blogueiro Allan dos Santos.

O relatório parcial é elaborado por grupo de trabalho responsável pelo material apurado pela CPI referente à disseminação de informações falsas na pandemia, coordenado pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE).

O documento deve ser entregue ao relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), no início da semana que vem. A intenção é que ajude a embasar o relatório final a ser apresentado por Renan no próximo dia 19 e votado nos dias seguintes pelo colegiado. O emedebista pode acolher ou rejeitar as sugestões do relatório parcial.

A reportagem apurou que o relatório parcial deve propor o indiciamento de membros do governo que, segundo a CPI, ao receberem sugestões do chamado gabinete paralelo, tomaram decisões de Estado embasados em recomendações negacionistas.

Estão nesta lista preliminar do grupo de trabalho o presidente da República, o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, o ex-secretário-executivo do ministério Elcio Franco e o atual ministro da Defesa, Walter Braga Netto, por sua atuação à frente da Casa Civil à época do agravamento da pandemia do novo coronavírus. Servidores do Ministério da Saúde também podem entrar na lista.

Em princípio, o atual ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, ficará de fora das sugestões de pessoas a serem indiciadas no relatório parcial. No entanto, a situação pode mudar de acordo com apurações em andamento sobre seu posicionamento em relação à retirada de estudo contra o uso de cloroquina para a covid-19 da pauta de reunião de um órgão técnico do ministério.

Para parte dos senadores da comissão, Bolsonaro interferiu para retirar essa análise da discussão na pasta e Queiroga foi "conivente", como classificou um parlamentar ouvido pela reportagem.

O Ministério da Saúde afirmou que o pedido de retirada partiu do próprio coordenador do grupo de especialistas devido à publicação de novas evidências científicas dos medicamentos em análise. "O documento será aprimorado e vai ser pautado assim que finalizado", disse a pasta, em nota.

Queiroga foi reconvocado para prestar um terceiro depoimento aos senadores em 18 de outubro. A tendência hoje é que Renan inclua o ministro da Saúde na relação de sugestões de indiciamentos, segundo a avaliação de senadores do colegiado.

Para um senador da oposição, que ajudou a escrever o relatório parcial sobre o tema das fake news na pandemia, o relator da CPI tem feito esforços "mais políticos do que técnicos". Contudo, os parlamentares oposicionistas e independentes preferem manter a maioria das divergências somente nos bastidores.

O grupo não teve acesso às informações do inquérito das fake news compartilhadas pelo STF (Supremo Tribunal Federal) com a CPI. Renan seria o único senador que fez a leitura dos documentos.

Gabinete paralelo

O chamado gabinete paralelo, segundo a CPI, foi criado para assessorar informalmente o presidente Jair Bolsonaro ao longo da pandemia à revelia das decisões e recomendações do Ministério da Saúde. O grupo teria estimulado, por exemplo, o uso de medicamentos ineficazes contra a covid-19, como a cloroquina, e também teria levantado dúvidas em relação às vacinas contra a doença apresentadas ao governo brasileiro.

Uma das apurações do colegiado no Senado é entender até que ponto o gabinete paralelo teria atrapalhado e postergado as negociações do governo para a compra das vacinas CoronaVac e da Pfizer, além de incentivar a tese da imunidade de rebanho para combater a pandemia de covid, criticada por médicos e cientistas.

Segundo senadores de oposição na CPI, alguns dos suspeitos de integrar o gabinete paralelo são Hang, Wizard, Fakhoury, Yamaguchi, o virologista Paulo Zanotto, o ex-assessor da Presidência Arthur Weintraub, o tenente-médico da Marinha Luciano Dias Azevedo e o deputado federal Osmar Terra (MDB-RS).

Todos os suspeitos de fazer parte do grupo que prestaram depoimento à CPI negaram a existência do gabinete paralelo.

Relatório final de Renan

A apresentação do relatório final está prevista para 19 de outubro, mas o senador Renan Calheiros deverá disponibilizar o documento aos colegas no dia 15 para que façam os últimos ajustes. Como a oposição tem maioria na CPI, o parecer de Renan deve ser aprovado sem dificuldades.

O relatório de Renan deve concluir que o governo federal afastou opositores ao gabinete paralelo, que não possuía "investidura pública formal" para influenciar políticas públicas. Os ex-ministros da Saúde Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich serão usados como exemplo.

Também já foram produzidos os capítulos que dizem respeito à atuação do Exército na produção de remédios como a cloroquina, mesmo após a comprovação de ineficácia do medicamento contra a covid-19.

O documento também trará a informação de que o Ministério das Relações Exteriores atuou para adquirir, em vários países, a matéria-prima para a fabricação das drogas ineficazes contra o novo coronavírus, como a cloroquina.

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A CPI da Covid foi criada no Senado após determinação do Supremo. A comissão, formada por 11 senadores (maioria era independente ou de oposição), investigou ações e omissões do governo Bolsonaro na pandemia do coronavírus e repasses federais a estados e municípios. Teve duração de seis meses. Seu relatório final foi enviado ao Ministério Público para eventuais criminalizações.


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