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Frente parlamentar para defender maconha medicinal une de PT a Novo em SP

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Imagem: sand86/iStock

Lucas Borges Teixeira

Do UOL, em São Paulo

31/10/2021 04h00

Deputados estaduais de diferentes partidos criaram a primeira frente parlamentar do país para debater o uso medicinal da maconha na Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo). Endossada por 21 parlamentares de 12 siglas, a frente tem como principal objetivo debater regulação, flexibilização e inovação acerca do uso da cannabis para fins medicinais e científicos.

A importação de alguns produtos à base de cannabis já é permitida pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para uso medicinal, mas os pedidos são avaliados caso a caso e os custos seguem altos. A Frente Parlamentar em Defesa da Cannabis Medicinal e Cânhamo Industrial pretende discutir distribuição pelo SUS (Sistema Único de Saúde) e estímulo à produção no Brasil —a flexibilização do uso recreativo não deverá ser contemplada nos debates.

A frente foi oficializada no último dia 17 e tem um primeiro evento oficial programado para novembro. Em sua apresentação, o grupo justifica que tratamentos terapêuticos com substâncias derivadas da cannabis já apontam benefícios e resultados positivos para pelo menos 26 patologias, como epilepsia, fibromialgia, autismo, câncer e Parkinson.

De acordo com os parlamentares, estima-se que uma flexibilização poderia impactar diretamente cerca de 6 milhões de pessoas no Brasil.

É preciso desmistificar o preconceito e avançar no debate sobre a cannabis medicinal. Nosso desafio é apoiar projetos e políticas públicas que permitam facilitar o acesso ao tratamento terapêutico, que é caro e restrito e, principalmente, amenizar o sofrimento de milhares de pessoas que dependem dele no controle de transtornos e doenças diversas, como convulsões gravíssimas."
Sergio Victor, deputado estadual (Novo), coordenador da frente

Deputados estaduais Walter Vicioni (MDB-SP), Sérgio Victor (Novo-SP) e Paulo Fiorillo (PT-SP) e o fundador do Ipsec, Bruno Pegoraro, compõe a "Frente Parlamentar em Defesa da Cannabis Medicinal e Cânhamo Industrial" - Reprodução/Alesp - Reprodução/Alesp
Deputados estaduais Walter Vicioni (MDB-SP), Sérgio Victor (Novo-SP) e Paulo Fiorillo (PT-SP) e o fundador do Ipsec, Bruno Pegoraro, compõe a "Frente Parlamentar em Defesa da Cannabis Medicinal e Cânhamo Industrial"
Imagem: Reprodução/Alesp

O primeiro projeto a ser debatido deverá ser o PL nº 1180/2019, dos deputados Caio França (PSB), membro da frente, Erica Malunguinho (PSOL), Marina Helou (Rede) e Patricia Bezerra (PSDB), que prevê a distribuição gratuita de medicamentos à base de canabidiol pelo SUS.

Desde 2015, a Anvisa já libera caso a caso a importação de medicamentos derivados da cannabis. O Brasil não tem, no entanto, produção local para qualquer que seja o fim —o que invariavelmente aumenta os custos. O plantio da maconha no país depende do Projeto de Lei (PL) 399/15, que foi aprovado em junho por uma comissão especial da Câmara dos Deputados e segue, em caráter conclusivo, para aprovação no Senado Federal.

"A liberação foi um passo. Mas, hoje, 30 ml [de soluções para uso oral] custam R$ 2.500, R$ 3.000. É caro, né? Não é todo mundo que pode pagar, pelo contrário", argumenta o deputado Walter Vicioni (MDB), que participa da frente. "Imagina a gente conseguir discutir, criar uma massa crítica, para apoiar uma legislação sobre o tema?", questiona.

Além dos benefícios para as pessoas, os deputados pretendem avaliar também os impactos econômicos da flexibilização de um mercado em franco crescimento, que já está atraindo startups.

De acordo com a Anvisa, entre 2015 e 2021, o número de autorizações para importação de produtos para uso medicinal à base de cannabis passou de 850 para mais de 22.000, até setembro.

Segundo o Ipsec (Instituto de Pesquisas Sociais e Econômicas da Cannabis), que ajudou a formar a frente, é um mercado que pode gerar até R$ 4,7 bilhões para o país em três anos.

"Temos que discutir a exploração econômica de um produto que tem uso industrial e medicinal. Um país que tem tradição no agro não pode perder essa onda internacional, como estamos perdendo", defende Vicioni.

"Acho fundamental trazer [este debate] para o Legislativo. Avançam as pesquisas médicas e científicas sobre a importância dos tratamentos à base da cannabis medicinal e, portanto, as legislações precisam estar sintonizadas com estas iniciativas permitindo o acesso da população aos tratamentos de saúde", concorda Paulo Fiorillo (PT), que também compõe a frente.

O grupo realizará pelo menos oito eventos até junho de 2022, para debater questões médicas, jurídicas, impacto em pacientes e até o desenvolvimento tecnológico e industrial na área.

Frente suprapartidária

Coordenada por Victor, do Novo, os outros membros oficiais da frente são Fiorillo, França e Vicioni, mas outros 17 deputados assinaram apoio ao grupo. Ao todo, 12 partidos assinam a frente, incluindo Novo, PSOL, PSDB, PT, PSB e Patriotas.

Entre os grupos da Alesp, só não constam representantes da ala dos bolsonaristas, mas os parlamentares falaram que não houve oposição para a criação da frente.

"É a importância do tema. A gente tem notícia das dificuldades que as pessoas portadoras de doenças têm para conseguir usar a cannabis medicinalmente. Então isso acaba se sobrepondo a partido, mesmo que discordem em alguns pontos, concordam que é benéfico", pontua Vicioni.