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Disputa em MG tem flerte de Kalil com Lula, e Zema mais longe de Bolsonaro

Alexandre Kalil (PSD) e Romeu Zema (Novo) disputam território em MG em meio a polarização política - Reprodução/YouTube
Alexandre Kalil (PSD) e Romeu Zema (Novo) disputam território em MG em meio a polarização política Imagem: Reprodução/YouTube

Juliana Arreguy e Nathan Lopes

Do UOL, em São Paulo

12/12/2021 04h00

A polarização que se desenha para a eleição a presidente deve ter peso na disputa pelo governo de Minas Gerais no ano que vem. Enquanto o atual governador, Romeu Zema (Novo), tenta se distanciar do bolsonarismo —imagem que ficou colada a ele no começo do mandato—, o prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD), articula a possibilidade de ter o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em seu palanque.

Esse movimento, olhando para o cenário nacional, começou antes mesmo até das coligações locais serem definidas.

Ao longo do mandato, Zema esteve próximo a Jair Bolsonaro (PL), mas, nos últimos meses, tem ficado mais distante —inclusive, passou a ser criticado por bolsonaristas por ter se encontrado com o ex-juiz Sergio Moro, presidenciável do Podemos.

Já Kalil é cogitado para dividir o palanque com Lula em Minas Gerais. Adalclever Lopes (PSD), ex-secretário de governo do prefeito e ex-deputado estadual, encontrou-se com o ex-presidente petista em São Paulo na semana passada.

Zema tem liderado as pesquisas para o governo de Minas Gerais. Levantamento do Paraná Pesquisas no início de novembro apontou que o governador tem 46,5% das intenções de voto. Enquanto isso, Kalil teve a preferência de 22,5% dos eleitores entrevistados. Com esses números, Zema poderia até vencer a disputa já no primeiro turno. Eles também podem ser reflexo do momento que cada um deles vive em seus cargos neste momento.

Kalil perdeu força política ao ganhar forte oposição na Câmara Municipal e ver a prefeitura ser investigada em três CPIs (Comissões Parlamentares de Inquérito). Zema surfa com o equilíbrio das contas públicas a partir de um acordo de R$ 11 bilhões com a Vale, na qual a mineradora se compromete a reparar danos provocados pela tragédia ambiental de Brumadinho.

Kalil vê chance em aliança com presidenciável

Pessoas próximas a Kalil afirmam que a virada negativa para o prefeito, reeleito no primeiro turno, em 2020, com 66,36% dos votos, veio da escolha de Lopes para a secretaria de governo. O vereador Irlan Melo (PSD), ex-líder do partido na Câmara e antigo aliado de Kalil, diz que o ex-secretário fez promessas infundadas e isolou o prefeito das decisões.

"Ele assumiu uma posição de articulador com vereadores e anunciou decisões que não se concretizavam porque Kalil sequer sabia sobre elas", explicou Melo.

Além disso, Kalil enfrenta o desgaste de lidar com três CPIs simultâneas:

  • a da Covid-19, que investiga gastos com a pandemia;
  • a da Máquina Pública, que apura casos de nepotismo;
  • a da BHTrans, sobre contratos com a empresa responsável pelo transporte público na capital; esta é a mais cara ao prefeito, porque tem depoimentos de ex-aliados e coloca em xeque a promessa de campanha de "abrir a caixa preta" da empresa.

"Zema crescente, e Kalil preocupado com as suas cercanias trouxe uma vantagem para o atual governador", diz Malco Camargos, professor da PUC-MG e diretor do Instituto Ver, de pesquisas eleitorais.

Para ele, isso faz o prefeito perder um tempo que poderia utilizar para se fazer conhecer no interior mineiro. As pesquisas apontam que, para fora da capital, ele tem dificuldade de se sobressair contra Zema. "Historicamente, quem decide a eleição para o governo não é capital, mas, sim, o interior", diz Melo.

"Você tem indícios para fora de Belo Horizonte que dão uma sobrevida ao Zema", diz Cristiano Rodrigues, professor de Ciência Política da UFMG. Ele ainda avalia que "as condições têm sido mais favoráveis" ao governador neste momento porque "não tem oposição boa o suficiente para fazer com que se crie descontentamento à gestão dele".

As condições incluem o equilíbrio de contas, que permitiu ao governo iniciar obras no interior e firmar alianças com prefeitos de cidades menores. Zema também ganhou notoriedade ao vender a folha de pagamento dos servidores e pagar os salários em dia, dando fim a uma prática de parcelamentos que ocorria há cinco anos.

Ex-outsiders

Quando conquistaram seus cargos, em 2016 e 2018, Kalil e Zema, respectivamente, eram os "outsiders", pessoas que entraram no jogo político no momento em que atores tradicionais estavam em baixa. Hoje, estes continuam fora do páreo —PT e PSDB estão sem forças para ter candidaturas competitivas no estado, governado por eles entre 2003 e 2018.

Aproveitando a onda da antipolítica, os dois surgiram para a vida pública como empresários —o prefeito também foi presidente do Atlético-MG. Mas, nos últimos anos, Kalil e Zema perderam o discurso de outsiders. O governador, por exemplo, já tem adotado práticas da velha política, como aproveitar as viagens ao interior para inaugurar obras e fazer palanque junto a prefeitos.

"A pessoa entra falando que não quer ser política, mas vira política. Isso aconteceu com o Kalil e a gente vê agora com o Zema", diz Melo.

Presidente nacional do Novo, Eduardo Ribeiro rejeita a comparação de Zema com a "velha política". "Não sei se a gente pode chamar uma política republicana —sobretudo a relação dos entes federativos, do governador com os prefeitos— de velha política", diz. "Isso é diplomático. O governador sempre foi muito diplomático."

Zema bolsonarista?

Ribeiro afasta a associação de Zema ao bolsonarismo e fala que o governador se comportou como "chefe de um estado" na relação com o presidente. "O governador sabe que tem responsabilidade com todos os mineiros e que tem que respeitar e receber todas as autoridades", diz.

"A longo prazo, isso vai ser percebido como maturidade por parte do governador, que trabalhou o tempo todo sem abrir mão de seus princípios." O presidente do Novo reforça que o partido faz parte de um grupo que busca uma "alternativa a Lula e Bolsonaro."

PT se divide sobre Kalil

No PT, porém, o nome de Kalil já não tem a mesma força por não ter "emplacado no interior" ainda. Os petistas avaliam lançar o deputado federal Reginaldo Lopes na disputa pelo governo —o mais provável, porém, é que o deputado entre na disputa pelo Senado.

Outro problema para Kalil é que ele está em um partido ainda em estruturação, o PSD. Hoje, o partido tem sua força em Minas Gerais em políticos que fizeram seus nomes em outras agremiações, como os senadores Antonio Anastasia (ex-PSDB) e Rodrigo Pacheco (ex-PSDB). "O PSD não é exatamente um partido de muita força no interior", avalia Rodrigues.

Para Melo, Kalil deve seguir a orientação partidária e dividir o palanque nacional com Pacheco, presidenciável do PSD, por "lealdade" ao partido. A preferência do prefeito, segundo Melo, é por Ciro Gomes (PDT).

Para Rodrigues, o cenário estadual "muda completamente" caso Kalil se alie a uma candidatura presidencial que seja competitiva. "Essa é a grande aposta de Kalil", concorda Camargos.

Cabo eleitoral

Se Kalil precisa de um empurrão no cenário estadual, essa tem sido a missão de Zema com outras candidaturas do Novo. O governador tem atuado como cabo eleitoral tanto do presidenciável do Novo, Luiz Felipe d'Avila, como do deputado federal Vinicius Poit, pré-candidato ao governo paulista.

"Ter o Zema andando aqui em São Paulo é essencial para mostrar como vai ser o estilo do nosso governo", diz Poit, que tem recebido em Zema em eventos sobre a sua candidatura no estado.

Vento a favor de Zema

O cenário hoje, na opinião dos analistas políticos, é favorável ao governador. "O momento político é mais de referendo sobre esses sujeitos que já estão no governo. E o Zema tem vantagem nisso", diz Rodrigues.

Camargos acrescenta: enquanto o governador já está consolidado na disputa, o prefeito precisa vencer algumas etapas: "tornar-se conhecido, depois tornar-se ouvido e tornar-se o escolhido". "A campanha do Kalil precisa cumprir essas três fases. A campanha do Zema, hoje, é só a última fase."