Topo

1 de 8 cidades deve perder recursos federais com recontagem da população

Comunicado da Prefeitura de Rondon do Pará (PA) sobre o Censo 2022; cidade teve redução da população - Reprodução/Instagram da Prefeitura de Rondon do Pará
Comunicado da Prefeitura de Rondon do Pará (PA) sobre o Censo 2022; cidade teve redução da população Imagem: Reprodução/Instagram da Prefeitura de Rondon do Pará

Do UOL, em São Paulo

05/01/2023 04h00

A prévia do Censo 2022 apontou que a maioria das cidades brasileiras é menor do que se pensava. Isso interfere na distribuição do FPM (Fundo de Participação dos Municípios), pago pelo governo federal de acordo com o porte do município.

Neste ano, uma a cada oito cidades deve perder recursos — no total, R$ 3 bilhões. Por outro lado, um grupo menor de prefeituras vai receber mais. Calculado pelo TCU (Tribunal de Contas da União) com base em dados do IBGE, o FPM é uma das principais fontes de receita dos municípios pequenos.

O que muda na distribuição do FPM em 2023:

  • 702 cidades caíram de porte e vão receber menos recursos;
  • 331 cidades subiram de porte e vão receber mais;
  • as demais 4.537 cidades devem continuar recebendo como nos anos anteriores -- a maioria delas também é menor do se estimava, mas se manteve na mesma faixa populacional, não impactando os repasses, que são feitos por porte da cidade e não pelo número de habitantes.

Cidades contestam o uso da prévia do Censo 2022

Em reação, prefeitos das cidades que vão perder recursos estão se mobilizando contra o uso dos novos dados do IBGE. A orientação da Confederação Nacional dos Municípios é que ingressem com ações na Justiça Federal.

O objetivo é que o governo federal desconsidere a prévia do Censo 2022, uma vez que o recenseamento não foi concluído — a previsão é que isso ocorra até janeiro, com divulgação em março.

Os dados estão defasados porque a União não cumpre a lei. Deveria ter feito o Censo em 2020 e, ainda antes, uma recontagem da população em 2015. Mas não fez nenhum dos dois"
Paulo Ziulkoski, presidente da Confederação Nacional dos Municípios

Em 2023, o FPM vai dividir R$ 188 bilhões entre as cidades brasileiras. A primeira parcela está programada para ser paga na próxima semana, em 10 de janeiro.

O TCU, que estabelece quanto cada cidade vai receber do FPM, afirmou que vai avaliar eventuais questionamentos dos prefeitos sobre o cálculo da distribuição, mas não em relação aos dados do IBGE. Não ficou claro se pode ser revisto o uso da prévia do Censo 2022. O Tesouro, que paga o recurso, não se manifestou até a publicação desta reportagem.

Municípios estão falando em entrar na Justiça para questionar os dados do IBGE, mas não há o que fazer. Os dados mostram a mudança estrutural pela qual o Brasil vem passando e isso é irreversível. Gestores públicos têm que colocar na cabeça que a população não vai crescer infinitamente. Não adianta contar com isso para aumentar a cota no FPM"
Ricardo Ojima, professor de demografia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte

A cidade que mais vai perder:

Ipixuna do Pará (PA) tinha uma população estimada em 62 mil habitantes, em 2018. Já a prévia do Censo 2022 atualizou o número para 29 mil habitantes. Com isso, a cidade pode receber 70% menos do FPM.

Ipixuna do Pará tem quase 11 mil alunos no ensino básico. É impossível que quase metade da população seja de estudantes. O FPM é a segunda principal fonte de receita da cidade. O corte vai impactar o pagamento de funcionários e fornecedores"
Isaac Farias, procurador-geral de Ipixuna do Pará

A terceira cidade que mais vai ganhar:

Extremoz (RN) tinha uma população estimada em 28 mil habitantes, em 2018. Mas o ajuste da população elevou o número para 61 mil habitantes em 2022. Isso pode fazer o recurso do FPM aumentar cerca de 70%.

Devido a esse atraso no Censo, nós vínhamos passando por grandes dificuldades. Por conta de programas habitacionais, Extremoz teve um crescimento exorbitante nos últimos anos, mas a arrecadação não acompanhou isso. O governo federal precisa rever esses valores que ficaram para trás"
Jussara Sales (Pros-RN), prefeita de Extremoz

Como é feita a distribuição dos recursos federais

A divisão dos recursos do FPM se baseia em dados do IBGE. Como a população só é recenseada a cada dez anos, entre um censo e outro o órgão estatístico faz estimativas considerando o último dado disponível.

Essas estimativas são imperfeitas, porque desconsideram mudanças que podem ter acontecido entre um censo e outro — por exemplo, uma cidade pequena que cresce muito devido à instalação de uma grande fábrica ou mesmo a pandemia de covid-19.

No caso das estimativas mais recentes, os problemas são ainda maiores. O ideal é que haja uma recontagem da população no meio da década para calibrar os cálculos — o que não ocorreu em 2015. Além disso, o censo começou com dois anos de atraso — deveria ter ocorrido em 2020.

Até o ano passado, o FPM foi distribuído usando como parâmetro a estimativa da população feita pelo IBGE em 2018 —a partir de dados com oito anos de defasagem, do censo de 2010. Era esperado, portanto, que essas estimativas tivessem muitas divergências da realidade.

Já neste ano, o IBGE pretendia mandar para o TCU o resultado final do Censo 2022 — extremamente preciso, porque conta toda a população em vez de fazer estimativas. Mas a conclusão do recenseamento foi adiada para março de 2023.

Por isso, o IBGE optou por usar as informações coletadas pelo censo até o final do ano passado (179 milhões de pessoas, o que equivale a 86% do total estimado) e realizar operações estatísticas para estimar o restante. O resultado é a prévia do Censo 2022.

No geral, a prévia do Censo 2022 é muito mais precisa do que as estimativas anteriores. Ainda assim, não é o resultado final.

O IBGE, porém, acredita que os dados das cidades com até 170 mil habitantes (que ficam com mais de 80% do FPM) vão mudar pouco na versão final do Censo 2022, porque nesses locais o recenseamento está mais avançado. É nas grandes cidades, como São Paulo, que o censo está mais atrasado.

Divulgamos os dados para atender ao TCU. Esse é o melhor número que temos à mão, baseado em um Censo praticamente concluído. A parte não concluída do censo é mínima. Além disso, priorizamos municípios com menos de 170 mil habitantes [que são mais impactados pelo cálculo do FPM]"
Cimar Azeredo, presidente interino e diretor de pesquisas do IBGE

O IBGE diz também que as cidades podem entrar em contato diretamente com o órgão para pedir revisão dos dados.

Os recenseadores do IBGE continuam em campo. Quem não foi recenseado, pode ligar para o Disque-Censo (137), de forma gratuita, e agendar um horário para a entrevista.