Cid: Bolsonaro cobrou mudança em relatório que não apontava fraude em urnas
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O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) cobrou o então ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira que se apresentasse uma fraude nas urnas eletrônicas, embora não tenha sido encontrada nenhuma, afirmou o tenente-coronel Mauro Cid em delação.
O que aconteceu
"Por mais que a busca tenha sido incessante, não foi encontrada fraude nas urnas", disse o ex-ajudante de ordens. Cid afirmou que Bolsonaro exigia uma resposta "dura" de Nogueira no relatório que seria apresentado pelo Ministério da Defesa sobre as urnas eletrônicas.
Bolsonaro não aceitou a conclusão dada pelas Forças Armadas sobre o processo eleitoral, disse Cid. A Defesa decidiu realizar uma auditoria paralela a fiscalização do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Na época, o presidente do TSE, Alexandre de Moraes, cobrou uma resposta da pasta após o primeiro turno. "As notícias de realização de auditoria das urnas pelas Forças Armadas, mediante entrega de relatório ao candidato à reeleição, parecem demonstrar a intenção de satisfazer a vontade eleitoral manifestada pelo chefe do Executivo, podendo caracterizar, em tese, desvio de finalidade e abuso de poder", disse Moraes.
Cid disse que Bolsonaro mandou o então ministro alterar a conclusão do relatório. Segundo ele, o presidente queria o relatório final do Ministério da Defesa relatasse que havia fraude nas urnas. "(...) não poderia se comprovar [fraude], porque não era possível auditar", explicou Cid em sua delação sobre a conclusão da pasta. Optou-se, então, por "um meio termo entre o que o presidente queria e o que general Paulo Sergio fez com o trabalho técnico dele", afirmou o ex-ajudante de ordens.
O relatório foi enviado no dia 9 de novembro de 2022 ao TSE. No texto, os militares disseram que "não é possível afirmar que o sistema eletrônico de votação está isento da influência de um eventual código malicioso que possa alterar o seu funcionamento". A urna eletrônica é usada no Brasil desde 1996 sem nenhuma comprovação de fraude ou adulteração de resultado. Elas são auditáveis e passam por teste de integridade.
O sigilo da delação de Cid foi retirado pelo ministro do STF Alexandre de Moraes nesta quarta (19). A decisão ocorre um dia após a PGR (Procuradoria-Geral da República) apresentar uma denúncia contra o ex-presidente Bolsonaro e outras 33 pessoas por tentativa de golpe de Estado.
Ex-ministro da Defesa chamou Bolsonaro de "ingrato" após os atos antidemocráticos. As mensagens trocadas por Nogueira e Cid, obtidas pela Polícia Federal e divulgadas em novembro do ano passado, mostram o general reclamando do ex-presidente por não responder suas mensagens. "Mando mensagem pro PR [presidente da República], mas ele não fala nada, apenas encaminha o de sempre. Chega a ser ingrato, mas tudo bem... Vamos em frente!", afirmou.
Mensagem foi enviada em 19 de janeiro de 2023, após aos atos antidemocráticos. Na época, o ex-presidente estava isolado na Flórida (EUA), para onde foi em 30 de dezembro, às vésperas da posse de Lula. "Vamos em frente. Quais são os planos dele, volta quando? Estamos aqui, acompanhando tudo e defendendo sempre o PR. Abraço! Selva!", completou Nogueira na mensagem.
Ele [Paulo Sergio Nogueira] queria ouvir mais a equipe técnica dele. Ele até tinha medo, ele falou: "pô, daqui a pouco esses garotos aí tão... vão tá preso", alguma coisa. Então ele tinha muito medo disso. Só que o presidente queria que ele fosse assertivo, que ele dissesse que teve fraude (...) nos documentos deles.
Mauro Cid em delação
Benefícios que Cid pediu pela delação
Cid pediu perdão judicial ou máximo de dois anos de prisão, segundo os documentos do STF. O ex-ajudante de ordens também queria a restituição de bens e valores apreendidos, e que esses benefícios se estendessem ao pai, esposa e filha dele.
Solicitação para que a PF garantisse a segurança dele e da família. A delação foi homologada em setembro de 2023, e a concessão dos benefícios cabe à Justiça, no julgamento da ação penal.
Cid depôs à PF sobre ao menos sete investigações que envolvem o ex-presidente Jair Bolsonaro. São elas:
- tentativa de golpe de Estado;
- desvio das joias recebidas por autoridades estrangeiras para enriquecimento ilícito;
- fraude no cartão de vacinação contra covid-19;
- uso da estrutura do Estado para atacar opositores, por meio do chamado "gabinete do ódio";
- ataques às vacinas contra covid-19 e medidas sanitárias na pandemia;
- ataques à urna eletrônica e ao processo eleitoral brasileiro, e
- uso de cartões corporativos para pagamento de despesas pessoais.
O UOL procurou a defesa de Bolsonaro para se manifestar sobre a delação de Cid. Se houver resposta, o texto será atualizado. Ontem (19), os advogados do ex-presidente afirmaram que a denúncia da PGR (Procuradoria-Geral da República) é "precária e incoerente" e que não foram encontradas provas que o ligassem aos crimes mencionados na acusação.
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