PF indicia 8 por fraudes na intervenção do Rio comandada por Braga Netto

A Polícia Federal indiciou oito pessoas por envolvimento em um esquema de fraude a uma licitação de R$ 36 milhões no Gabinete da Intervenção Federal no Rio de Janeiro em 2018, comandada por Braga Netto. O general e ex-ministro de Jair Bolsonaro comandava o gabinete na época, mas não figura na lista. O UOL teve acesso ao relatório, que está sob sigilo.

O que aconteceu

A PF no Rio concluiu a investigação e apontou indícios de quatro crimes. São eles: fraude a licitação, organização criminosa, advocacia administrativa (defesa dos interesses de uma empresa dentro do poder público) e evasão de divisas. O que levantou a suspeita foi a contratação, assinada por Braga Netto, para a aquisição de coletes para a polícia do Rio feita no último dia da intervenção, em 31 de dezembro de 2018, no valor de cerca de R$ 36 milhões, com a empresa norte-americana CTU Security. A contratação foi feita sem licitação.

O contrato acabou sendo suspenso após o próprio Braga Netto constatar que a empresa havia apresentado certificados falsos. Ainda assim, lobistas que atuavam para a CTU contrataram militares para tentar regularizar a situação. Para a PF, a suspensão do contrato não significa que não existiram os crimes. Isso apenas evitou um prejuízo maior aos cofres públicos.

Cabe ao Ministério Público Federal decidir se denuncia os envolvidos. O relatório final, de 132 páginas, foi apresentado pela PF em 7 de março à Justiça Federal no Rio.

Entre os indiciados, está um então assessor do chefe de gabinete de Braga Netto. Segundo a PF, o coronel da reserva e assessor Robson Queiroz Mota foi contratado pela CTU em 2019 para defender os interesses da empresa junto aos militares. A investigação aponta que ele recebeu dinheiro da CTU enquanto estava no cargo de assessor do general Sérgio José Pereira, que foi chefe de gabinete de Braga Netto na intervenção.

Em 2018, o ex-ministro acumulava a função de interventor com a chefia do Comando Militar do Leste, que fica no Rio e é onde atualmente ele está preso. Ele deixou o posto de interventor no fim daquele ano, mas a estrutura do Gabinete de Intervenção foi mantida com alguns cargos até junho de 2023.

General da reserva disse ter almoçado com Braga Netto e foi contratado pela CTU para ajudar na contratação do serviço, segundo a PF. Paulo Roberto Correia Assis teria vendido influência junto a Braga Netto. Ele morreu em maio do ano passado, então não está na lista dos indiciados.

A investigação chegou a localizar um email do general afirmando que, após se encontrar com Braga Netto em 2019, "daria uma força" ao pedido da CTU. O material aparece no relatório final da PF, que não faz nenhuma acusação contra Braga Netto. Ele nem sequer foi ouvido no inquérito.

General Paulo Assis vendeu influência junto a Braga Netto, segundo email encontrado pela PF
General Paulo Assis vendeu influência junto a Braga Netto, segundo email encontrado pela PF Imagem: Reprodução
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Mota e Correia Assis receberam pagamentos de doleiros no exterior para prestar consultoria. Uma cláusula do contrato citava que eles receberiam R$ 50 mil de entrada, R$ 300 mil se retomassem o contrato da CTU e 1% do valor total do serviço depois que o último pagamento fosse feito à CTU. A investigação identificou que cada um recebeu R$ 25 mil de um doleiro por meio de suas empresas de consultoria.

General Paulo Assis vendeu influência junto a Braga Netto
General Paulo Assis vendeu influência junto a Braga Netto Imagem: Reprodução

Para a PF, ficou provado que eles estavam, de fato, vendendo influência junto aos militares. Investigação porém, não chegou a avançar sobre o ex-ministro de Bolsonaro que suspendeu o contrato e comunicou às autoridades após constatar irregularidades na documentação apresentada pela CTU.

Como se observa, o objetivo da contratação do Cel. QUEIROZ e do Gen. PAULO ASSIS nunca foi a eventual expertise na atividade de consultoria de cada um, mas sim no poder de influência para que algum ato seja praticado por servidor público na organização criminosa.

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Após análises, a documentação apreendida permitiu a conclusão de forte participação de ROBSON na articulação e advocacia administrativa para empresa CTU SECURITY junto ao GIFRJ. ROBSON é da mesma turma que o Gen. Braga Netto. ROBSON foi contratado pela empresa CTU para assessoria no período em que estava trabalhando no Comando Militar no Leste. Destaca-se que o Comando Militar do Leste e o Gabinete de Intervenção Federal no Rio de Janeiro [ficam] no mesmo edifício, ainda que em salas/andares distintos.
Bernardo Adame Abrahão, delegado da PF, em relatório final apresentado à Justiça Federal no Rio

O que dizem os envolvidos

Procurada, a defesa de Braga Netto disse que não iria se manifestar a respeito. O advogado Marcolino Alves Rocha, que atuou como procurador da CTU não quis comentar o episódio. Reportagem tenta contato com os demais envolvidos. O espaço está aberto para manifestações.

Defesa de Alex Meyefreund diz que ele "prestou longo e minucioso depoimento". Também "juntou uma série de documentos comprovando a sua atuação na qualidade de investidor em um contrato já em andamento. Sua relação comercial com outras pessoas envolvidas no Inquérito Policial foi também explicada. Seu prematuro indiciamento é ilegal e desnecessário. Confiamos que o Ministério Público Federal, após atenta análise da investigação, arquivará o Inquérito Policial em relação a ele".

A lista dos indiciados pela PF

  • GLAUCIO OCTAVIANO GUERRA - indiciado por fraude à licitação, advocacia administrativa, organização criminosa e evasão de divisas;
  • GLAUCO OCTAVIANO GUERRA (irmão de Glaucio) - indiciado por fraude à licitação, advocacia administrativa, organização criminosa e evasão de divisas
  • ANTONIO INTRIAGO - indiciado por fraude à licitação, advocacia administrativa, organização criminosa e evasão de divisas
  • MARCOLINO ALVES ROCHA - indiciado por fraude à licitação, advocacia administrativa e organização criminosa;
  • DIOGENES DANTAS FILHO - indiciado por fraude à licitação, advocacia administrativa e organização criminosa;
  • SEBASTIÃO MIGUEL VIEIRA - indiciado por fraude à licitação, advocacia administrativa, organização criminosa e evasão de divisas;
  • ROBSON QUEIROZ MOTA - indiciado por fraude à licitação, advocacia administrativa, organização criminosa e evasão de divisas;
  • ALEX MEYEFREUND - indiciado por organização criminosa e evasão de divisas.