Parlamentares ignoram audiências com Gilmar Mendes sobre marco temporal

Deputados federais e senadores indicados para participar da conciliação sobre o marco temporal das terras indígenas faltaram na maioria das audiências no Supremo Tribunal Federal (STF).

O que aconteceu

Ministro Gilmar Mendes, do STF, determinou a instauração de processo de conciliação em abril de 2024. A Câmara e Senado indicaram quatro representantes cada, sendo dois titulares e dois suplentes.

Foram realizadas 19 audiências no total. Os deputados e senadores não compareceram à maioria delas. O levantamento foi feito pelo UOL com base nas atas das reuniões, disponibilizadas pelo STF.

Conciliação ocorre em meio a um impasse entre Legislativo e Judiciário. O marco temporal prevê que os povos indígenas só tenham direito às áreas que estavam ocupadas por eles em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. O STF considerou essa tese inconstitucional, mas logo depois o Congresso aprovou um projeto de lei que estabeleceu o marco temporal.

Defensor do marco temporal, Pedro Lupion (PP-PR), presidente da bancada ruralista, faltou em 17 encontros. Já a suplente dele na comissão, deputada Bia Kicis (PL-DF), só participou de uma reunião.

Senadores faltaram em 16 reuniões. Tereza Cristina (PP-MS), vice-presidente da bancada ruralista, e Jaques Wagner (PT-BA), líder do governo Lula no Senado, são titulares na comissão e participaram de apenas três audiências cada. A frequência dos suplentes também é baixa — Hiran Gonçalves (PP-RR) esteve em quatro encontros, e Jader Barbalho (MDB-PA) não participou de nenhum.

Deputadas indígenas são exceções. Célia Xakriabá (PSOL-MG), que ocupa uma vaga como suplente, esteve em 13 das 19 audiências. A deputada Silvia Waiãpi (PL-RO) substituiu o deputado Lúcio Mosquini (MDB-RR) e foi a todas as três audiências desde então.

O que dizem os parlamentares

A Assessoria da Frente Parlamentar da Agropecuária contestou a apuração do UOL. A alegação é que Pedro Lupion participou de "inúmeras reuniões" remotamente. "Em diversas ocasiões, o parlamentar esteve presente de forma virtual. Uma apuração minuciosa das reuniões da comissão demonstraria isso", afirmou a assessoria. Lúcio Mosquini também disse que participou das reuniões por videochamada.

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Atas não mostram participação de Lupion e Mosquini em ambiente virtual. Procurado pela reportagem, o gabinete do ministro Gilmar Mendes reforçou que todas as presenças virtuais constam nas atas.

Tereza Cristina diz que assessor jurídico de seu gabinete acompanhou reuniões. Segundo a assessoria, ele mantém a senadora informada das discussões quando há problemas de agenda. "Ela já se reuniu em várias outras audiências, além das semanais, com o ministro Gilmar Mendes e outros envolvidos na conciliação do marco temporal."

Jaques Wagner justifica faltas com "agenda intensa de compromissos" como líder do governo. "O acompanhamento segue de forma ativa e permanente, seja através de suplente, dos consultores do Senado Federal que acompanham as discussões e dos demais órgãos do Governo Federal representados neste fórum."

Suplente de Jaques Wagner não participou de nenhuma reunião. Assessoria do senador Jader Barbalho diz que ele não recebeu "convocação oficial" para participar das audiências. "Ou seja, não foi oficiado a exercer a suplência."

Hiran Gonçalves confirmou que participou de apenas quatro reuniões. Ele disse que os trabalhos são relevantes, mas que há "uma grande intransigência" por parte de uma entidade que se apresentava como representante de todos os povos indígenas do Brasil". Também afirmou que as comunidades indígenas já dispõem de uma quantidade significativa de terras.

Ele se refere à Apib (Articulação Nacional dos Povos Indígenas do Brasil). A entidade anunciou sua saída da comissão na segunda audiência com a justificativa de que os direitos dos povos indígenas são inegociáveis. Após a retirada da Apib, o Ministério dos Povos Indígenas indicou outras lideranças indígenas para participar da conciliação.

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A deputada Bia Kicis foi procurada, mas não se manifestou. O espaço segue aberto.

Outros participantes

A comissão de conciliação também é composta por representantes do governo federal, dos estados e municípios. A ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, foi a três reuniões, e a presidente da Funai, a duas. No entanto, outros servidores das pastas acompanharam todas as reuniões

Ministério dos Povos Indígenas diz que acompanha as discussões. Embora não seja representante na mesa, a ministra dos Povos Indígenas esteve presente em mais de uma sessão da Comissão Especial. Representam a pasta o secretário-executivo do MPI, Eloy Terena, e a Consultoria Jurídica do MPI. Também participam técnicos do ministério, que contribuem para o debate em suas áreas.

Dois governadores representaram os estados. Jorginho Mello (PL), de Santa Catarina, e Eduardo Riedel (PSDB), de Mato Grosso do Sul, se revezaram e participaram de sete audiências no total.

Integrantes pediram prorrogação. No início de abril, a União, a Câmara e o Senado pediram que o fim da discussão seja adiado. Caso o ministro Gilmar Mendes acate o pedido, será a terceira prorrogação dos trabalhos.

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