Novo ministro de Lula empregou primo da esposa na Telebras e é réu em ação

O novo ministro das Comunicações, Frederico de Siqueira Filho, é réu em uma ação sob acusação de improbidade administrativa. Ex-presidente da Telebras, ele empregou o primo da esposa como seu chefe de gabinete na estatal, com salário de R$ 30 mil mensais.

O processo por suposta fraude à licitação corre na Justiça de Pernambuco desde 2020. Uma empresa da qual Siqueira Filho é sócio recebeu R$ 12 mil —valor da ação— para prestar serviços de engenharia à Prefeitura de Paulista (PE).

A pasta das Comunicações vivia um vácuo desde a saída do ex-ministro Juscelino Filho (União-MA), denunciado pela PGR (Procuradoria-Geral da República) por corrupção, desvio de recursos públicos, fraude em licitação e organização criminosa. Os fatos investigados são anteriores à ida de Juscelino para o ministério.

Siqueira Filho é a segunda indicação do União Brasil para chefiar o ministério —o nome dele teve o apoio do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP). O partido havia indicado primeiramente o líder da sigla na Câmara, deputado Pedro Lucas, que acabou recusando o cargo e constrangendo o governo.

Engenheiro de formação, Siqueira Filho trabalhou por 21 anos em diversos postos na operadora Oi —um deles na diretoria de Relações Institucionais. Saiu em maio de 2023, quando era diretor de Vendas Corporativas, para presidir a Telebras.

Ficou na estatal até ontem à noite. Chamada internamente de "República do Amapá", a empresa pública é zona de influência de Alcolumbre. O presidente do Senado tem indicados na cúpula e em cargos de assessoria e abriu espaço para aliados emplacarem nomes de confiança.

Na gestão de Siqueira Filho, a estatal deu uma "pedalada fiscal" milionária. A empresa usou uma ferramenta orçamentária denominada DEA (Despesas de Exercícios Anteriores) para rolar compromissos de 2023 para o orçamento de 2024.

O TCU (Tribunal de Contas da União) investiga o caso, revelado pelo UOL. Em 2025, a empresa fez a mesma manobra, em um total de R$ 31 milhões até o momento.

Nos dois últimos anos, a Telebras acumulou cobranças de fornecedores e chegou a ser incluída em órgão de proteção ao crédito.

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O relatório com resultados financeiros de 2024, publicado em março deste ano, apontou um aumento de 125,8% no prejuízo líquido ajustado da Telebras. Passou de R$ 111 milhões, em 2023, para R$ 252,1 milhões no ano passado.

A estatal afirmou que o prejuízo estava relacionado à diminuição dos recursos enviados pelo governo para a empresa, aumento dos custos e despesas operacionais e crescimento do resultado financeiro negativo e da depreciação e amortização.

O Ebitda (Lucros antes de Juros, Impostos, Depreciação e Amortização) teve uma queda de 50%. Este indicador é usado para medir a saúde operacional de uma empresa. A estatal também justificou o resultado pela diminuição das verbas federais e pelo aumento dos custos e despesas.

A receita operacional líquida de 2024 (R$ 414,3 milhões) ficou estável em relação ao ano anterior (R$ 416,8 milhões). Este índice mostra o que entrou em caixa após deduções com impostos e taxas, por exemplo.

No dia 17 de abril, a Telebras propôs um aumento salarial para 17 integrantes do corpo diretivo (direção da estatal, conselho de administração e conselho fiscal). O valor, em dezembro de 2024, era de R$ 3,5 milhões em um ano. A sugestão, que precisa ser aprovada pelos acionistas, é aumentar para R$ 6,1 milhões.

Procurada pelo UOL, a estatal não se manifestou. Siqueira Filho afirmou que "nunca foi condenado em qualquer processo judicial e possui uma trajetória profissional íntegra, construída majoritariamente na iniciativa privada". Também informou que não há nepotismo nem irregularidade na nomeação do primo de sua esposa e a indicação "baseou-se exclusivamente na capacidade técnica do nomeado". (Leia mais abaixo)

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O que diz a ação de improbidade

O Ministério Público de Pernambuco afirmou, em ação apresentada à Justiça do estado, em 2020, que houve fraude à licitação na contratação da empresa Cabo Branco Engenharia e Serviços pela Prefeitura de Paulista (PE). Siqueira Filho e outro primo de sua esposa são sócios da Cabo Branco.

A prefeitura havia contratado a empresa para fazer serviços de engenharia em uma escola, em 2015. Segundo o MP, o irmão de Siqueira Filho era secretário de Finanças de Paulista, ordenou despesas e assinou empenhos em favor da Cabo Branco. A assessoria do atual ministro diz que irmão dele nunca foi sócio da empresa e queera secretário de Turismo de Paulista na época do processo de contratação.

"A dispensa de licitação foi direcionada em benefício da empresa Cabo Branco Engenharia e Serviços LTDA, mediante uma série de artifícios utilizados na própria apresentação das propostas, fraudando a licitação, para assegurar a finalidade precípua perseguida pelos demandados, que é a de perpetuar a situação irregular de contratação direta, em benefício da empresa demandada, cujo um dos sócios é irmão do secretário de Finanças", apontou o Ministério Público.

A Promotoria ofereceu um acordo aos sete réus, incluindo Siqueira Filho: o pagamento de R$ 12 mil, solidariamente, e a proibição de contratar com o município de Paulista por dois anos (para pessoas física e jurídicas), inclusive com nomeação de cargo público comissionado.

Em resposta à Justiça, a defesa de Siqueira Filho e da Cabo Branco afirmou que a empresa prestou o serviço e que não houve danos aos cofres públicos. Propôs que o pagamento e a proibição de contratar recaíssem apenas sobre a Cabo Branco, e não sobre Siqueira Filho.

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O processo continua em aberto, à espera de um acordo entre o Ministério Público e os réus.

O que diz o novo ministro

Frederico Siqueira Filho afirmou ao UOL que o processo de improbidade é "de pequeno valor", está em fase inicial e é a única ação em seu nome. Declarou estar "convicto de sua inocência" e não ver "motivo para aceitar o acordo proposto, mesmo tratando-se de um processo de pequenas causas".

Registrou que o irmão nunca foi sócio da empresa e era secretário de Turismo de Paulista na época do processo de contratação. Afirmou confiar "plenamente na condução isenta do Poder Judiciário" e acreditar "que, ao final, a acusação será reconhecida como injusta".

O ministro também informou que não há nepotismo nem irregularidade na nomeação do primo de sua esposa. Registrou que a indicação "baseou-se exclusivamente na capacidade técnica do nomeado e observa rigorosamente a legislação vigente".

Segundo Siqueira Filho, "a atual gestão da Telebras assumiu a companhia em estado crítico —herança da administração anterior, que a sucateou para incluí-la no programa de privatizações e a tornou dependente do orçamento da União — gerando severas restrições operacionais e financeiras".

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Declarou que a empresa passa "por um processo consistente de reestruturação, com efeitos que se consolidam a médio e longo prazo" desde 2023. Apontou que "a análise do cenário completo, e não apenas de recortes isolados, evidencia uma trajetória de recuperação e crescimento".

Afirmou que em 2024:

  • o Ebitda recorrente atingiu R$ 288 milhões, representando um aumento de 55% em relação ao ano anterior;
  • o resultado do exercício teve alta de 47,7%, enquanto a capacidade de caixa frente às obrigações financeiras cresceu 57,6%, "comprovando o avanço da empresa".

Ao UOL Siqueira Filho alegou ainda que, se comparados os anos de 2022 e 2024, a Telebras teve aumento de caixa de 20,6%; redução do prejuízo em 60,5%; e aumento de 66% no Ebitda.

"Destaque para a receita operacional bruta que cresceu 29,9% na comparação entre primeiro trimestre de 2023 e o quarto trimestre de 2024, com excelentes perspectivas para 2025. Outro avanço relevante é a resolução da dependência orçamentária junto à União, que até então bloqueava cerca de R$ 1 bilhão do caixa da empresa. Com a superação desse entrave, a Telebras avança rumo à independência financeira, iniciando uma nova fase de investimentos em políticas públicas de conectividade — missão central da estatal", disse.

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