PT abandona Marina a ataques da bancada ruralista em comissão na Câmara

Graças à omissão do PT, a ministra Marina Silva (Meio Ambiente) se tornou o principal alvo dos deputados ruralistas que dominam a Comissão de Agricultura. Em um mês, ela foi convocada duas vezes a se explicar na Câmara.

O que aconteceu

Convocação mais recente ocorreu na última quarta. Os petistas presentes na sessão não demonstraram nenhuma disposição para defender a ministra do Meio Ambiente da intenção dos ruralistas de atacá-la. Ela é filiada à Rede.

O deputado Marcon (PT-RS) usou o tempo de fala para saudar vereadores de sua cidade que visitavam a comissão. Ele enalteceu o crescimento econômico de Nova Santa Rita (RS). "Quero aqui dar os parabéns para os nossos vereadores que estão aqui participando da marcha dos vereadores", disse.

Na sequência, parlamentares da oposição fizeram discursos com críticas a Marina. Era uma repetição do que ocorre nas sessões da Comissão de Agricultura sempre que a ministra é citada. Ela já chegou a ser chamada de "câncer do Brasil".

A segunda chance de o PT defender Marina naquele dia também foi desperdiçada. O deputado Padre João (PT-MG) teve oportunidade de discursar por três minutos. O presidente da Comissão de Agricultura costuma conceder mais tempo se houver solicitação.

O parlamentar dedicou somente 27 segundos à ministra. Ele se limitou a lamentar que tivesse ocorrido a convocação em vez de um convite. Não havia indignação ou espírito de embate na sua fala.

Em seguida, o deputado manifestou sua tristeza com a morte do papa Francisco. Padre João também reclamou da oposição. O deputado dedicou bastante tempo a estes dois tópicos.

Governo escolhe Fávaro

A liderança de governo também ignorou Marina. Na quarta-feira, havia requerimentos para convocar a ministra do Meio Ambiente e o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro.

Continua após a publicidade

Um emissário da liderança do governo foi até a comissão e só tratou do caso de Fávaro. A articulação deu resultado, com a convocação se transformando em convite. Na diplomacia do Congresso, há uma substancial diferença entre os dois termos:

  • Convite: solicitação amistosa, com presença opcional;
  • Convocação: Ordem para comparecer, prognóstico de perguntas hostis e disposição para embates.

Marina vai encarar a tropa de choque do ruralismo sem deputados para defendê-la. A Comissão de Agricultura é um lugar de exaltação de Ricardo Salles (Novo), ministro do Meio Ambiente no governo Jair Bolsonaro (PL). O presidente, deputado Rodolfo Nogueira (PL-MS), tem orgulho de ser chamado de "terror do MST".

As queimadas no Pantanal servirão de munição contra Marina
As queimadas no Pantanal servirão de munição contra Marina Imagem: Ueslei Marcelino - 1.jun.2024/Reuters

Fileiras cerradas contra Marina

A falta de defensores permitiu a montagem de um cerco a Marina. Ela foi convocada pela primeira vez em 9 de abril. O requerimento previa abordar o desmatamento e os preparativos para a COP30, em Belém.

Continua após a publicidade

Passada uma semana, os ruralistas perceberam que os assuntos eram muito restritos. Os parlamentares ficaram receosos de que Marina usasse a limitação de temas para não responder à maioria das perguntas.

Um novo requerimento de convocação foi elaborado. Apresentado pelo presidente da comissão desta vez, ele permitia perguntas sobre:

  • Manifestação indígena que entrou em confronto com a polícia do Congresso;
  • Desmatamento;
  • Queimadas;
  • Atuação do Ibama.

O leque de perguntas aumentou, mas se manteve o descaso do PT com Marina. Na primeira convocação, em 9 de abril, havia pedidos de comparecimento dela e do ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira.

A liderança de governo enviou um emissário, mas ele defendeu somente Teixeira. A convocação do ministro foi transformada em convite depois de reiterada insistência.

Os ruralistas sinalizaram que eram contrários a fazer o mesmo por Marina. O representante da liderança do governo fez o pedido uma única vez. Diante da negativa inicial dos deputados da oposição, ele abandonou o assunto.

Continua após a publicidade

Na última quarta, foi parecido. O representante da liderança de governo livrou Fávaro da convocação, mas nem sequer houve solicitação para converter a convocação de Marina em convite.

O Ministério do Meio Ambiente informou que nem sempre há êxito nas negociações com a comissão. Por intermédio de uma nota enviada no dia seguinte a publicação da matéria, foi alegado que os deputados petistas tomaram as medidas possíveis. O texto ainda defende a atuação da liderança de governo que trabalharia para defender os interesses do Planalto.

As atuais composição e dinâmica da comissão nem sempre permitem uma interlocução construtiva e a busca pelas melhores soluções.
Trecho da nota do Ministério do Meio Ambiente

Na Comissão de Agricultura, Ricardo Salles é considerado ministro modelo
Na Comissão de Agricultura, Ricardo Salles é considerado ministro modelo Imagem: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Ruralistas vão emparedar Marina

A expectativa é de uma sessão bastante dura. A ministra é vista como um alvo abandonado pelo governo e pelo PT, por isso os ruralistas preparam perguntas difíceis. A linha geral dos questionamentos já é conhecida. Recorde de queimadas, problemas na organização da COP e burocracia que atrapalha o crescimento nacional.

Continua após a publicidade

Eles também mostram disposição para embates. Marina deve ser ouvida no começo de maio.

A situação dela é diferente em relação aos demais ministros. Carlos Fávaro (Agricultura) deverá encontrar um ambiente menos carregado. Em relação a Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário), haverá munição para ataques, mas os ruralistas preveem engrossar o discurso só caso o ministro seja provocador ou agressivo.

Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima

Os parlamentares do PT e da base do governo que integram a Comissão de Agricultura, Pecuária e Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara dos Deputados têm sido firmes defensores das pautas socioambientais, em permanente diálogo com o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e com a ministra Marina Silva.

É importante ressaltar, no entanto, que as atuais composição e dinâmica da Comissão nem sempre permitem uma interlocução construtiva e a busca pelas melhores soluções diante dos temas em discussão no colegiado.

No último comparecimento da ministra à Comissão, em outubro de 2024, os parlamentares do PT e da base participaram ativamente da audiência e defenderam de forma firme as políticas e os compromissos socioambientais do governo. Do mesmo modo, os parlamentares do PT e da base do governo presentes às duas reuniões mencionadas na reportagem do UOL fizeram os encaminhamentos necessários e possíveis, sempre em diálogo com o MMA.

Continua após a publicidade

Quem acompanha as dinâmicas do trabalho dos líderes do governo e dos partidos sabe que o trabalho das lideranças, sobretudo dos governos e partidos progressistas, é feito de forma coletiva. Os líderes, de acordo com as questões em discussão, delegam aos membros de suas bancadas a incumbência de articular e debater determinadas questões. É assim que parlamentares da base, tanto do PT quanto dos partidos que a compõem, atuam dando suporte aos diversos ministérios.

Basta lembrar as intervenções dos deputados Bohn Gass (PT/RS), Pedro Uczai (PT/SC), Airton Faleiro (PT/PA), Padre João (PT/MG), Marcon (PT/RS) e Elton Welter (PT/PR) - para citar alguns dos presentes à sessão que se pronunciaram ou vêm apoiando sistematicamente a pauta. É descabida, portanto, qualquer pretensão de difundir a ideia de que falta apoio à pasta e, sobretudo, com a agenda socioambiental do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Deixe seu comentário

O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.