Dino faz voto mais duro que Moraes em caso Ramagem e manda recados à Câmara

O ministro Flávio Dino, do STF (Supremo Tribunal Federal), concordou com o relator, Alexandre de Moraes, sobre derrubar a manobra do deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ) para suspender a ação contra ele e aproveitou seu voto para mandar recados para a Câmara dos Deputados, que aprovou a medida.

O que aconteceu

O ministro falou em 'tiranias' e defendeu autonomia do Supremo. Ele seguiu Moraes em seu voto, contra a decisão da Câmara que queria suspender processo no STF envolvendo Ramagem e que poderia beneficiar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no processo sobre a tentativa de golpe de Estado.

Voto duro. Dino escreveu que "somente em tiranias" o Legislativo poderia ter o poder de suspender totalmente uma ação penal, prerrogativa que ele coloca sob a responsabilidade do Judiciário. Também disse que não é papel do STF só homologar a decisão da Câmara nos casos envolvendo parlamentares. Ainda segundo Dino, em nenhum país do mundo o Legislativo teria a função de adentrar na aplicação do direito penal.

Dino cita o orçamento feito pelos parlamentares e a necessidade de controle jurídico. Ele é o relator de ações no STF sobre emendas parlamentares. O ministro tem suspendido o pagamento das emendas em diversos casos, quando há indícios de irregularidades, falta de transparência ou de rastreamento do uso de dinheiro público. Ele tem cobrado do Congresso e do Executivo toda a documentação referente ao destino de verbas milionárias, que saem do orçamento federal e vão alimentar cofres de estados e municípios.

Exceções precisam ser ainda mais restritas, defendeu Dino. Em seu voto, o ministro afirmou que "as funções típicas de cada Poder devem ser prestigiadas, enquanto que funções atípicas - em face da nota de excepcionalidade - exigem sempre interpretação restritiva".

Ministro apontou que "não faria sentido" querer suspender a ação para as pessoas sem mandato parlamentar. Ele lembrou que a prerrogativa dos parlamentares de suspender ações penais contra eles faz parte justamente do 'Estatuto dos Congressistas' previsto na Constituição e que ele se aplica tão somente a parlamentares com mandato.

A Câmara aprovou a proposta para sustar a ação contra Ramagem por tentativa de golpe. O texto genérico aprovado, genérico propositalmente, indicava que toda a ação penal, que envolve também Bolsonaro, ex-ministros e militares, estaria suspensa. A Casa, porém, só tem atribuição de suspender processos que envolvam parlamentares no exercício de seu mandato. No caso desta ação, há ainda acusações contra Ramagem anteriores a ele ser diplomado como deputado.

Na Câmara, o tema foi aprovado com folga: 315 votos favoráveis a suspensão e 143 contrários. O pedido foi apresentado pelo PL, partido de Jair Bolsonaro, com o argumento de que a lei proíbe investigações contra parlamentares após a diplomação.

STF discute medida no plenário virtual. A sessão extraordinária na Primeira Turma, onde está sendo julgada também a ação penal envolvendo Ramagem, vai até o dia 13. Já há maioria contra a medida da Câmara. Faltam dois ministros votarem: Luiz Fux e Cármen Lúcia.

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Supremo foi contra Câmara. Para o STF, só pode ficar suspensa a parte da ação penal contra Ramagem envolvendo os crimes de dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado da União. Dino sugere inclusive separar esta parte do processo contra Ramagem para retomá-lo a partir de 2027, quando acabar esta legislatura. O resto seria julgado agora, com os outros denunciados.

Ex-diretor da Abin, Ramagem é acusado de fazer parte do "núcleo crucial" da tentativa de golpe. O deputado dirigiu a Agência Brasileira de Inteligência no governo Bolsonaro e teria usado a estrutura da instituição para desacreditar o sistema eleitoral, segundo a denúncia da Procuradoria-Geral da República.

O exercício do mandato parlamentar pressupõe a diplomação, de modo que, antes dela, não há o que assegurar em termos de direitos e prerrogativas. O contrário resultaria na insustentável e ilógica conclusão de que o 'Estatuto dos Congressistas' - que, repiso, destina-se a criar condições para o exercício da atividade parlamentar - se aplica a não parlamentares.

O artigo 53, parágrafo 3º, da Constituição Federal, não atribui às Casas Legislativas a competência para decidir, em caráter terminativo, pela sustação da ação penal. Isso porque está em causa processo judicial, sendo certo que, nessa conjuntura, a decisão final constitui ato típico e exclusivo do órgão competente do Poder Judiciário. A deliberação do Poder Legislativo não é imune ao controle jurisdicional.

Somente em tiranias um ramo estatal pode concentrar em suas mãos o poder de aprovar leis, elaborar o orçamento e executá-lo diretamente, efetuar julgamentos de índole criminal ou paralisá-los arbitrariamente - tudo isso supostamente sem nenhum tipo de controle jurídico. Maiorias ocasionais podem muito em um sistema democrático, mas certamente não podem dilacerar o coração do regime constitucional.
Trechos do voto do ministro Flávio Dino, do STF, contra manobra para paralisar ação contra Ramagem

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