Sonhando com Planalto, Motta transforma redes sociais em segunda pele

Há uma estratégia e um investimento milimetricamente calculados nas redes sociais de Hugo Motta (Republicanos-PB). Presidente da Câmara, ele tem planos ainda mais audaciosos do que comandar os deputados pelos próximos dois anos.

O que aconteceu

Postagens com apuro e qualidade técnica. Por trás do conteúdo, existe um trabalho de construção da imagem e um esmero na produção, com edição de arte, som impecável e cuidado nos cortes. Antes comedido, agora Hugo Motta aprova todo o conteúdo, que é tratado como uma tarefa sistemática e mirando o futuro.

A equipe de Hugo Motta discorda da máxima de que a Presidência seja um destino ou missão. Seu time considera a política como mais uma carreira, com a faixa presidencial ao alcance de quem se preparar. Mas cada profissão tem suas particularidades.

A sobrevivência política depende de popularidade ou, em outras palavras, de votos. Principalmente nos cargos de prefeito, governador e presidente, em que há só uma vaga em disputa. Além de qualidades técnicas, esta carreira singular exige credibilidade, empatia e carisma.

Receber um like representa ser depositário destes predicados. Por este motivo, a equipe do paraibano trata suas redes sociais como seu maior produto.

Os perfis são mais importantes do que as aparições em televisão, rádio e jornais. Um assessor descreveu os perfis como "a segunda pele" do deputado.

Consciente, o parlamentar reserva tempo para produzir conteúdos. Nada vai ao ar sem aval dele. Também não há espaço para tentativas e experimentações. Sempre existe uma pauta orientando o que será produzido e publicado.

As redes sociais também têm cálculos políticos embutidos. Há três anos, Hugo Motta apareceu com influencers e participou de lives. Era o começo da estratégia de ficar mais conhecido e se cacifar a disputar o Senado ou o governo da Paraíba.

Uma eventual Presidência seria o auge da carreira. Até chegar a esta etapa, há avaliações frequentes, que são as eleições —ferramenta inquestionável da política para medir o sucesso de alguém.

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As redes sociais são cada vez mais decisivas para vitórias ou derrotas. A equipe do deputado diz acreditar que só existe chance de sucesso se for apresentado um produto genuíno.

O perfil precisa ter o mesmo DNA que Hugo Motta, resumem assessores. Agir de outra maneira pode render muitos likes no primeiro momento, mas manter um personagem que não existe é insustentável.

De 'carne e osso'

Os 20 maiores perfis do mundo são de pessoas, por isso entregar postagens de 'carne e osso' funciona melhor. As publicações dos perfis refletem valores, visões econômicas e filosofias de vida.

Antes de a primeira câmera ser ligada, muita conversa foi feita. Assessores falaram com o deputado sobre suas origens e qual sua rotina. Formatos e conteúdos foram pensados na sequência, levando em conta a essência do parlamentar e a forma como ele quer se apresentar.

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Um trocadilho ajuda a espalhar a imagem de um Hugo Motta com conteúdo. A ideia é ampliar a compreensão do trabalho do Legislativo. Os assessores criaram um quadro chamado Hoogle. Com o logo imitando as cores do Google, ele explica conceitos do Parlamento.

Família e autopromoção

Mostrar o Hugo Motta real significa permitir que o cotidiano familiar vire conteúdo. Em fevereiro, o presidente da Câmara surgiu como um homem comum falando com o filho que insistia em adotar um cachorro.

Ele chamou a conversa de 'debate'. Ressaltou que ter um animal de estimação resultava em assumir responsabilidades. O uso de palavras do vocabulário político e apontamento dos deveres também serve para transmitir mensagens.

O acontecimento doméstico reflete como ele quer ser visto: um homem atento às consequências de suas atitudes, com capacidade de diálogo e equilibrado. O post embala estes conceitos no afeto de pai com o filho e sugere que o deputado possui as qualidades políticas e emocionais para cuidar das coisas públicas e das pessoas.

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A autopromoção também inclui depoimentos enaltecendo o deputado. Ferramenta muito usada na política, gravações da população agradecendo à entrega de obras aparecem nas redes dele. A intenção é mostrar o parlamentar fazendo a diferença na vida dos cidadãos.

Tudo é registrado por uma equipe de dez pessoas. Há fotógrafos, videomakers, editores e marqueteiros. Existe uma preferência por pessoas que tenham conhecimento pelo menos básico de política e assim possam captar e escolher as melhores cenas.

Hugo Motta acredita que a polarização vai acabar e será a vez dos políticos de centro
Hugo Motta acredita que a polarização vai acabar e será a vez dos políticos de centro Imagem: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

Desejos futuros

Às vezes são publicados vídeos citando aspirações futuras. De forma sutil, tentam acostumar o ouvido das pessoas a cargos que Hugo Motta deseja ocupar. Um eventual vídeo dele entrando num recinto e alguém gritando "presidente" não é postado à toa.

Assessores apostam no fim da polarização. Lula (PT) disputaria a eleição derradeira em 2026. Jair Bolsonaro (PL) está inelegível até 2030. A percepção é que novos nomes terão espaço.

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Hugo Motta se posiciona como de centro. O perfil será a bola da vez em um futuro bastante próximo, apostam aliados.

Hugo Motta exibe a Constituição durante discurso de posse na presidência da Câmara
Hugo Motta exibe a Constituição durante discurso de posse na presidência da Câmara Imagem: Wilton Junior - 1º.fev.2025/Estadão Conteúdo

Simbolismo durante a posse

Hugo Motta era mais tímido quando começou a investir nas redes sociais. Com os anos de prática, adquiriu desenvoltura e ampliou as possibilidades dos criadores de conteúdo.

Os assessores também valorizam o entendimento do meio de comunicação. Ter maior discernimento sobre as redes sociais permite ao deputado tomar decisões com mais propriedade.

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Na posse da presidência da Câmara, ele queria mostrar que admira a Constituição. Ele cresceu ouvindo histórias do avô constituinte, que pertencia ao mesmo MDB de Ulysses Guimarães. Também aprendeu a respeitar os ritos do Parlamento.

Foi este passado que homenageou ao repetir Ulysses. Ele se levantou da cadeira de presidente e exibiu a Constituição ao plenário como se fosse um troféu. O gesto virou post.

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