Áudios do golpe revelados após denúncia viram desculpa e munição de defesas
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Advogados dos denunciados por tentativa de golpe de Estado veem um cerceamento das defesas com a apresentação só agora da perícia no celular de um agente da PF que foi preso. Há também quem veja como arma para demonstrar a inocência do cliente. Na quarta, foram reveladas mensagens sobre um plano para "matar meio mundo" para manter o ex-presidente Jair Bolsonaro no poder.
O que aconteceu
A PF concluiu somente em maio a perícia no celular do policial federal Wladimir Matos Soares. Ele foi preso em novembro do ano passado, na operação da PF contra os suspeitos de participar de um plano para matar o presidente Lula. Como a PF havia apresentado o relatório final da investigação naquela época e indiciado os suspeitos, a PGR (Procuradoria-Geral da República) já apresentou denúncia contra os envolvidos mesmo sem que todos os materiais apreendidos na operação fossem periciados e tivessem seus conteúdos analisados.
Os investigadores da PF podem ainda apresentar novos fatos e informações que surjam do material apreendido no ano passado. Para os advogados que representam os denunciados, porém, esse descompasso pode levar a um cerceamento das defesas, que não tiveram acesso a tudo o que foi encontrado na investigação e que, inclusive, poderia ser usado para refutar alguma tese da acusação.
Defesas já vinham reclamando de falta de acesso à íntegra do material apreendido. Diante das reivindicações dos advogados, a Polícia Federal disponibilizou um link para todas as defesas poderem acessar a íntegra de tudo o que foi apreendido e periciado pelas autoridades. A defesa de Wladimir, por exemplo, pediu o adiamento do julgamento após os áudios serem revelados, mas teve esse pedido negado ontem por Moraes.
O próprio Bolsonaro afirmou em entrevista ao canal UOL que sua defesa não teve acesso à íntegra das mensagens do celular de Mauro Cid. O material foi revelado por uma série de reportagens do UOL e, segundo o ex-presidente, ainda não foi disponibilizado para sua defesa. Advogados de vários denunciados também questionaram o STF sobre a falta de acesso ao material da investigação.
Agente da PF que mandou as mensagens será julgado na semana que vem. A Primeira Turma do STF vai decidir se aceita denúncia sobre ele e outros 11 militares envolvidos no plano de golpe de Estado na próxima terça.
Para criminalista, o episódio desta semana prova tese das defesas. Eduardo Kuntz, que defende o ex-auxiliar de Bolsonaro Marcelo Câmara, lembra que há recursos na Turma questionando a falta de acesso aos materiais que ainda não foram julgados. "Isso apenas reforça o que as defesas estão dizendo há meses: tem coisa faltando".
Advogado de coronel denunciado diz ver com "preocupação" apresentação do material só neste momento. Para Guilherme Favetti, que defende o coronel Márcio Nunes, se as defesas tivessem total acesso antes, elas poderiam usar essas provas até para, eventualmente, tentar evitar o recebimento das denúncias.
Defesa de militar preso diz que acusação está "perdida". Para Jefrey Chiquini, que defende o tenente-coronel Rodrigo Bezerra de Azevedo, acusado de tentar matar Moraes, o conteúdo dos áudios contraria a tese da acusação de que havia um plano para tentar assassinar Moraes no dia 15 de dezembro. "Meu cliente está preso porque, supostamente, no dia 15 iria atentar contra o ministro, mas o áudio diz que haveria atentado no dia 22. Esse dia 15 é uma ficção", afirmou o advogado.
Para o advogado, deveria ser reaberto o prazo para as defesas se manifestarem sobre o conteúdo. Chiquini entende que, por se tratar de um novo elemento que foi juntado no processo, as sessões de julgamento no STF para analisar a denúncia deveriam ser remarcadas. Também deveria ser dado um prazo novo para todos os advogados se manifestarem sobre o material, já que a denúncia contra todos os núcleos é a mesma.
Agente da PF faz parte do núcleo 3 da trama golpista. Ao todo, são 12 denunciados neste núcleo, que, além de Wladimir Soares, é formado por 11 militares. O grupo é acusado pela PGR de planejar as "ações táticas" para efetivar o plano "Punhal Verde Amarelo", que previa o assassinato de autoridades, incluindo o presidente Lula, para manter Bolsonaro na Presidência mesmo após a derrota eleitoral.
Bolsonaro e mais 20 são réus. Já há 21 réus no STF sob a acusação de envolvimento no plano para manter o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no poder após a derrota para Lula, em 2022. Os ministros já analisaram 3 de 5 denúncias. Na terça, será julgado um quarto grupo. O quinto julgamento não tem data marcada.
Muito embora em relação a Marcio Nunes Resende a própria conclusão do inquérito já demonstre que ele não participou de qualquer intento golpista, na condição de advogado vejo com muita preocupação essa disponibilização de provas durante o curso do processo. Isso porque as defesas já apresentaram suas respostas com base naquilo que fora disponibilizado quando do oferecimento da denúncia, e a disponibilização agora, depois de apresentadas as defesas, de eventual prova que seja útil aos acusados, somente poderia ser apreciada no momento do julgamento do mérito da ação penal, fazendo com que uma importante etapa do processo criminal, que é o do recebimento da denúncia, fosse desprezado em relação àquela prova.
Guilherme Favetti, advogado de Márcio Nunes
Trata-se de um claro cerceamento de defesa. Já tem denúncia oferecida, como vai trazer um relatório extemporâneo? Ainda que demonstre que a acusação está perdida, isso deveria levar a uma reabertura dos prazos para as defesas.
Jeffrey Chiquini, advogado de Rodrigo Bezerra de Azevedo
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