De forró ao bolsonarismo, Gilson Machado enfrenta maior desafio da carreira

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Preso no Recife (PE) por menos de 24 horas na sexta-feira (13), o ex-ministro do Turismo do governo Bolsonaro, Gilson Machado (PL), é figura política em ascensão no segundo estado mais populoso do Nordeste. Em 2024, disputou a prefeitura da capital pernambucana e aparece como provável candidato ao Senado em 2026.
Líder de uma banda de forró de razoável sucesso em Pernambuco na década de 1990, Machado tenta consolidar sua liderança política em meio a uma rebordosa: virou alvo da Polícia Federal após a suspeita de tentar emitir passaporte português para o ex-ajudante de ordens Mauro Cid, em um possível plano de fuga. O político nega.
Ao deixar a prisão, no Cotel (Centro de Observação Criminológica Professor Everardo Luna), em Abreu e Lima, Grande Recife, no fim da noite da sexta, o ex-ministro disse que foi alvo de um "mal-entendido". Machado está em liberdade provisória após revogação da prisão a pedido da Procuradoria-Geral da República, atendida pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), e tem que seguir uma série de orientações para não ser preso novamente.
Religioso, o bolsonarista agradece a Deus que, segundo ele, "iluminou mais uma vez a Justiça brasileira". Esse tom fez o sanfoneiro ficar famoso em 2020 ao tocar uma Ave-Maria ao lado do então presidente Jair Bolsonaro (PL) durante uma live na pandemia de Covid-19. No final daquele mesmo ano, Gilson assumiria o Ministério do Turismo, cargo no qual ficou até março de 2022, quando deixou a pasta para disputar o Senado em Pernambuco, sem sucesso.
Empresário, veterinário e sanfoneiro
Natural de Recife e com 55 anos de idade, Gilson Machado é veterinário e vem de uma família com proximidade ao setor agrícola e afinidade com a política. Ele é sobrinho de Gílson Machado Guimarães Filho, liderança dos usineiros, um dos grupos mais poderosos da economia pernambucana até o século 20.
O tio de Machado foi presidente do Sindicato da Indústria do Açúcar em Pernambuco, de 1977 até 1986, quando foi eleito deputado constituinte pelo PFL. Reeleito em 1990, foi um dos 38 deputados que votaram contra o impeachment de Fernando Collor de Mello, em 1992. Dois anos depois, o usineiro deixou a carreira política. Faleceu em 2018.
Já Gilson Machado, o ex-ministro de Bolsonaro, caminhou por outros meandros até chegar nos palanques e aparecer na urna eletrônica. Empresário e produtor rural com patrimônio estimado em mais de R$ 3,5 milhões, ele é sanfoneiro e ganhou notoriedade na efervescente cena do forró pernambucano na década de 1990 com a banda Brucelose, que segue liderada por ele.
Fundado em 1993, o grupo já lançou 15 álbuns e alcançou sucesso no fim da década, chegando a vender mais de 300 mil cópias e emplacou o hit "Te amo demais". Brucelose é uma doença que afeta os bovinos, além de uma zoonose, que também pode acometer os humanos. O nome da banda é curioso justamente por Gilson Machado ser veterinário.
O grupo tem apresentação confirmada em Caruaru, no Agreste pernambucano, em plena noite de São João (24 de junho). A festa é conhecida por ser a maior comemoração junina do estado e uma das maiores do país. A reportagem perguntou à prefeitura de Caruaru se o show está mantido, mas ainda não obteve resposta.
O sucesso político de Gilson vem na esteira do bolsonarismo, com a eleição de Jair Bolsonaro para a Presidência em 2018. Nos dois últimos pleitos realizados em Pernambuco, Gilson foi o nome mais forte da direita. Em 2022, ficou em segundo lugar na disputa por uma vaga ao Senado, com 1,3 milhão de votos, o equivalente a 29% dos votos válidos. A eleita foi Teresa Leitão (PT), com 46%.
Em 2024, ficou em segundo lugar, com 13,90% dos votos válidos na disputa pela prefeitura do Recife, conquistada no 1º turno pelo amplo favorito João Campos (PSB), reeleito com mais de 78%. O bolsonarista, no entanto, saiu fortalecido ao obter uma votação quatro vezes maior do que o candidato da centro-direita tradicional da cidade, Daniel Coelho (PSD), que ficou em quarto lugar com 3,21% mesmo com o apoio da governadora Raquel Lyra (PSD).
Gilson Machado foi um dos primeiros empresários que investiu na campanha de Bolsonaro ainda em 2018, o que o deixou muito próximo do futuro presidente. O cientista político Bhreno Vieira aponta que o pernambucano conquistou um espaço de relevo: "Ele virou uma espécie de embaixador cultural do bolsonarismo, que sempre trazia para si a questão de enfatizar valores mais conservadores e religiosos da cultura popular", explica.
O crescimento de Gilson ofuscou a direita tradicional do estado, com o declínio de nomes como ex-governador e atual deputado federal Mendonça Filho (União) e a rivalidade com o ex-prefeito de Jaboatão dos Guararapes, no Grande Recife, Anderson Ferreira, com quem passou a disputar o comando do PL no estado. Candidato ao Governo de Pernambuco em 2022, Ferreira ficou em terceiro lugar com 18,15% dos votos válidos e teve 430 mil votos a menos que Machado, que disputou o Senado na mesma chapa.
Em 2024, mesmo derrotado para a prefeitura, o sanfoneiro foi fundamental para a eleição de seu filho, Gilson Filho (PL), como o segundo vereador mais votado do Recife, gerando atritos com o clã de Anderson Ferreira, presidente do partido no estado. Nesta quebra de braço, a proximidade de Gilson com Bolsonaro, de quem é amigo, é relevante.
"A família Ferreira vai usar essa prisão de Gilson Machado para obter mais poder (...) e desconfigurar a imagem política que Gilson Machado construiu. Por outro lado, Gilson Machado vai tentar se vitimizar, realmente, apontar que tudo isso segue como um grande plano das instituições políticas brasileiras", avalia o cientista político. Em 2026, os nomes de Machado e Ferreira são os mais cotados como palanque bolsonarista em Pernambuco.
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