'Não falei em golpe': o que Cid diz em áudios que advogado enviou ao STF
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Áudios atribuídos ao tenente-coronel Mauro Cid, e encaminhados ao STF (Supremo Tribunal Federal) pelo advogado Eduardo Kuntz, mostram desabafos do ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL) sobre sua situação jurídica e pessoal.
Nas conversas com o advogado, Cid critica a condução da delação premiada pela Polícia Federal, revela medo de voltar à cadeia se denunciasse possíveis irregularidades no acordo e diz se sentir abandonado pelo entorno do ex-presidente. "Quem se fodeu e perdeu tudo fui eu", desabafa o tenente-coronel em um dos áudios.
'Não falei uma vez a palavra golpe'
Cara, vou te dizer. Esse troço tá entalado. Você vê que o cara colocou a palavra golpe. Eu não falei uma vez a palavra golpe. Quer dizer. Foi erro, foi, sei lá, até condição psicológica que eu tava na hora. Porra, mas coisa de palavra golpe, que ele colocou, eu não falei golpe uma vez. Em todo o meu depoimento.
Em áudio enviado a Eduardo Kuntz em março do ano passado, Cid faz críticas à forma como sua delação premiada foi conduzida pela Polícia Federal. Afirmou, por exemplo, não ter usado a expressão "golpe" durante os depoimentos e sugeriu que o termo foi atribuído a ele pelos próprios investigadores.
Kuntz é advogado de Marcelo Câmara, réu pela tentativa de golpe, e foi quem apresentou ao STF as mensagens e áudios de conversas que mantinha com Cid por meio do perfil falso @gabrielar702, no Instagram. Com base nas conversas, Kuntz pediu ao ministro Alexandre de Moraes a anulação da delação de Cid, usada como fonte de prova na denúncia da PGR (Procuradoria-Geral da República) contra os acusados de participar da intentona golpista.
Ex-assessor de Jair Bolsonaro (PL), Câmara faz parte do chamado "núcleo 2" do golpe, enquanto Cid é parte do grupo 1, o "núcleo crucial" da suposta organização criminosa que teria tentado impedir a posse do presidente Lula (PT).
Cid já depôs ao ministro do STF Alexandre de Moraes, em março do ano passado, sobre áudios vazados pela revista Veja em que aparece dizendo ter sido pressionado pela Polícia Federal a confirmar na delação informações que não seriam verdadeiras. Na época, ele negou a Moraes irregularidades no acordo e disse que os áudios foram apenas um "desabafo".
Ao depor como réu na ação sobre a tentativa de golpe, na semana passada, Cid foi novamente questionado por Moraes sobre a regularidade de sua colaboração premiada. O ex-ajudante de ordens reiterou que não houve ilegalidade por parte da PF.
Cid revela medo de ser preso por criticar delação
A mídia já está comprada com a narrativa, o STF está comprado com a narrativa, a liderança do Congresso já está amarrada com a narrativa. Se fosse uma ação, 'tudo pronto com Rodrigo Pacheco (então presidente do Senado), vamos entrar com impeachment, vamos arrebentar e acabar com eles?' Pô, vamos para a guerra. Mas eu puxar uma bandeira sozinho, eu, que não tenho força de nada. Sou o que mais apanha.
Nos áudios, Cid afirma a Kuntz que não adiantaria fazer uma "grande coletiva" de imprensa para apresentar a versão dele dos fatos sobre o acordo de delação porque seria desacreditado.
Ele demonstrou receio de ser preso novamente, caso questionasse publicamente a condução das investigações. O tenente-coronel foi preso por ordem de Moraes em março de 2024, após depor no STF sobre os áudios vazados pela Veja em que critica a conduta da PF no caso.
A Polícia Federal vai dizer que é mentira, o STF vai dizer que é mentira, e acabou. Eu vou voltar pra cadeia, vou ser preso e acabou.
'Quem foi me visitar, mandar um bolo?': Cid revela sentimento de abandono
Em tom de desabafo, Cid demonstrou se sentir abandonado pelo entorno do ex-presidente Jair Bolsonaro. Disse ter "amigos" --citou, entre eles, Kuntz, que posteriormente enviaria as conversas ao STF, o que pode provocar a anulação dos benefícios do acordo de delação do tenente-coronel--, mas se sentiu "isolado".
Ele se descreveu como o único prejudicado e afirmou ter perdido a carreira militar, além de enfrentar problemas financeiros na família por causa de despesas com advogados.
Quem se fodeu e perdeu tudo fui eu, eu ainda inventei de pegar um advogado por fora, Tô acabando com a vida financeira da família.
É complicado você se sentir isolado. Tenho amigos. Tenho você, tenho o Paulo, tenho amigos que a gente pode desabafar, conversar, mas que não têm força para fazer nada. Quem tem força pra fazer alguma coisa está com as mãos amarradas.
As pessoas que eu ajudei na campanha, que queriam sempre estar comigo para falar com o presidente? Cadê esse pessoal? Quais deputados e senadores foram me visitar? Foram mandar um bolo, uma Coca-Cola.
Ouça a íntegra dos áudios de Cid enviados ao STF:
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