Quando começou a trabalhar na casa dos Milagres Rigueira, uma família tradicional de Minas, Madalena Gordiano tinha apenas 8 anos, idade em que crianças ainda brincam de boneca. Não teve tempo para isso. Acordava às 2h para trabalhar e só parava às 20h, comia o que os patrões deixavam para trás. Ao longo de quase quatro décadas, sua servidão foi explorada pelos Milagres Rigueira, primeiro na casa da matriarca Maria das Graças e depois na do filho dela, o professor universitário Dalton César.
Após ser libertada no fim do ano passado de uma condição análoga à escravidão em que viveu 38 anos, Madalena enfim reencontra um pouco da infância perdida.
É a Madá. Eu coloquei meu nome porque ela é a minha filhinha. Ela parece comigo, é uma vida nova
A boneca Madá representa ainda os sonhos de Madalena, que tenta recuperar o tempo perdido. Só que, por trás do olhar puro, do jeito ingênuo e do sorriso de criança, está uma mulher de 47 anos com várias marcas e cicatrizes não fechadas.
Além de um casamento arranjado e uma pensão de R$ 8 mil a que jamais teve direito, mas que, segundo os auditores fiscais do trabalho, custeou os gastos da família Milagres Rigueira, ela foi sentenciada a uma vida de desejos não saciados e de uma solidão silenciosa. Madá, com quem Madalena dorme abraçada todos os dias, é uma companhia que ela jamais teve ao longo da vida.
Ela é moreninha, vestido amarelo e de croché. É igualzinha eu. Acho [bonito ter uma boneca parecida comigo]. Acho sim