Centenas de pessoas se põem em fila todos os dias diante de uma tenda no Largo São Francisco, centro de SP. A linha de gente dobra a esquina e se espicha pela avenida Brigadeiro Luiz Antônio. A mesma cena é vista diariamente no miolo da favela do Jacarezinho, zona norte do Rio, a apenas 20 km da Praia de Copacabana.
Todos estão ali pelo mesmo motivo: um prato de comida.
Cada vez mais longas durante a pandemia do coronavírus, as chamadas "filas da fome" expõem nas duas maiores cidades do país um problema que nunca deixou de existir. Relatório da ONG Oxfam classificou o Brasil como o "epicentro emergente" da fome extrema em razão do aumento da pobreza agravada pela pandemia.
Para se alimentar, milhares de pessoas sem renda dependem de refeições distribuídas por ONGs, poder público e grupos religiosos. Muitos relataram ao UOL o temor de que, com a flexibilização da quarentena, essas ações cheguem ao fim.
O coronavírus é um grande problema para muitas pessoas, mas para mim é a solução para não passar fome
Vera Arlindo, 64, moradora do Jacarezinho
Para o padre Júlio Lancelotti, da Pastoral do Povo da Rua, o fim do estado de calamidade em São Paulo, estendido até 30 de setembro, pode ser a "inauguração da calamidade". Isso porque os serviços municipais e estaduais criados no período correm o risco de serem extintos.
"Uma das possibilidades para que a covid-19 não tenha tido letalidade maior entre a população de rua foi a manutenção da alimentação por meio de todos esses esforços", diz, citando também a mobilização de voluntários.
O UOL acompanhou distribuições de refeições no Rio e em São Paulo e relata a seguir histórias de moradores de rua, trabalhadores informais que viram sua renda desaparecer e de quem perdeu o emprego antes e durante a pandemia.