Justiça para George Floyd

Como a morte de um homem negro nas mãos de um policial inspira a luta antirracista no mundo hoje

Do UOL, em São Paulo Reuters
Stephen Maturen/Getty Images/AFP

Conhecido pelos amigos como um homem grande, George Floyd tinha 1,90 m e era descrito como alguém a favor da paz, do esporte e voltado a Deus — apesar de ter tido alguns problemas com a lei nos Estados Unidos. Hoje, seu nome virou sinônimo da luta antirracismo e contra a violência policial em todo o mundo.

Sufocado sob o joelho de um ex-policial branco por mais de 9 minutos, o ex-motorista e ex-segurança de bar de 46 anos foi assassinado em maio do ano passado. "Não consigo respirar", foi a frase que repetiu de novo e de novo nos seus últimos momentos até dar seu último suspiro. A cena foi filmada por quem ali passava, como uma jovem adolescente que tinha seu celular nas mãos e o usou para fazer a denúncia.

Papai mudou o mundo", diz hoje sua filha, Gianna (foto), de apenas 6 anos, mas já ciente do legado deixado por ele.

Drew Angerer/AFP Drew Angerer/AFP
Reprodução

Derek Chauvin culpado de todas as acusações

A condenação unânime do júri popular do ex-policial Derek Chauvin hoje nos Estados Unidos se torna mais um capítulo histórico do caso que impulsionou protestos e debates antirracistas e contra a violência policial por todo o mundo. A deliberação durou menos de 11 horas.

Chauvin foi considerado culpado em todas as três acusações de homicídio contra Floyd. No tribunal, Chauvin, vestindo terno e gravata e solto sob fiança, foi algemado depois que o juiz Peter Cahill leu as decisões unânimes do júri multirracial formado por sete mulheres e cinco homens.

Divulgação/ Gabinete do xerife do condado de Hennepin
O ex-policial Derek Chauvin

O ex-policial estava de máscara e não demonstrou qualquer emoção ao ser escoltado para fora da sala do tribunal, enquanto o irmão de George Floyd, Philonise Floyd, abraçava os promotores.

A sentença de Derek Chauvin deve ser anunciada em oito semanas. Segundo o juiz Peter Cahill, os argumentos do ex-policial serão analisados "dentro de uma semana", e será feitos relatórios de investigação pré-sentença.

Somadas as condenações, Chauvin pode ficar preso por até 75 anos. Só a condenação por homicídio não intencional em segundo grau tem pena máxima de até 40 anos, segundo informações da CNN dos EUA.

O veredicto de culpa não trará George de volta. Este pode ser um passo gigante em direção à justiça na América. [...] Foi um assassinato à luz do dia que arrancou as cortinas para que todos pudessem ver todas as injustiças desse sistema. Mostrou o joelho no pescoço de todos os americanos e a dor que todos os negros enfrentam todos os dias. O assassinato gerou um protesto que não víamos desde os anos 60, protestos que uniram as pessoas de diversas gerações e raças para dizer: 'Chega, é o bastante!' Chega desses assassinatos sem sentido.

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Jeenah Moon/Reuters Jeenah Moon/Reuters

Do lado de fora do tribunal, uma multidão reunida celebrou de alegria quando o veredicto foi anunciado ao final de um julgamento de três semanas. Muitos se abraçavam e choravam de emoção.

Minneapolis tem sido cenário de protestos noturnos desde que Daunte Wright, um jovem negro de 20 anos, foi morto a tiros em um subúrbio desta cidade de Minnesota em 11 de abril por uma policial branca.

Cerca de 400 manifestantes marcharam na cidade na segunda-feira pedindo a condenação de Chauvin, repetindo em coro:

O mundo está olhando, nós estamos olhando, façam o certo."

CARLOS BARRIA

Lei George Floyd

Ao comentar o veredicto, a vice-presidente norte-americana Kamala Harris insistiu para que o Senado aprove a Lei George Floyd de Justiça no Policiamento, de agosto do ano passado. O texto proíbe táticas policiais controversas e facilita o caminho para ações judiciais contra agentes que violarem direitos constitucionais dos suspeitos.

Precisamos reforçar o sistema. Essa lei é parte do legado de George Floyd. Somos todos parte do legado de George Floyd, é nosso dever honrá-lo".
Kamala Harris, vice-presidente americana

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Black Lives Matter

AFP

A morte de Floyd foi o estopim para uma onda de protestos que não se limitou aos Estados Unidos. Pelas redes sociais, o vídeo que mostra a abordagem que resultou na morte de Floyd viralizou, e países como Brasil, Bélgica, Inglaterra e Austrália também registraram manifestações, apesar das restrições da pandemia do coronavírus.

Tamanha foi a mobilização diante da Casa Branca, que o então presidente Donald Trump montou uma estrutura gradeada de metal para tentar conter as multidões.

Em praticamente todos os continentes, manifestantes foram às ruas para protestar contra o racismo e a violência policial. Estátuas erguidas em homenagem a personalidades históricas consideradas escravocratas ou colonialistas viraram alvo comum desses protestos.

O veredicto de hoje vai muito além desta cidade e tem implicações significativas para o país e até mesmo para o mundo. Este caso é um ponto de virada na história americana e envia uma mensagem clara que esperamos que seja ouvida com clareza em todas as cidades e todos os estados.

Comunicado da família de George Floyd

O julgamento

Chandan Khanna/AFP

"Acreditem nos seus olhos, isso foi um homicídio", disse o promotor Jerry W. Blackwell aos jurados, logo no início do julgamento, ao exibir o vídeo que traz as cenas da ação policial que resultou na morte de Floyd.

Nas primeiras semanas do julgamento, os promotores do caso convocaram quase 40 testemunhas, incluindo peritos médicos, policiais da ativa e aposentados e o funcionário da loja que recebeu a nota de 20 dólares que seria falsa de Floyd.

Muitas das testemunhas se emocionaram ao dar suas declarações ao júri. Darnella Frazier, adolescente que gravou o vídeo que viralizou pelo mundo inteiro ao mostrar Floyd dizendo que não conseguia respirar, disse que não consegue dormir em algumas noites por pensar que poderia ter feito mais para ajudar o ex-segurança.

Um dos paramédicos que atendeu Floyd disse que, quando chegou ao local da abordagem policial, ele já estava morto. O caixa da loja que recebeu de Floyd a nota que seria falsa também lamentou o ocorrido e disse que, se ele simplesmente não tivesse aceitado o dinheiro, "isso não teria acontecido".

A defesa de Chauvin, por outro lado, sustentou a tese de que ele seguiu as orientações de treinamento da polícia e afirmou que Floyd poderia ter morrido por overdose ou problemas cardíacos, e não pelo asfixiamento causado pelo ex-policial.

Os agentes são orientados a tomar cuidado com o pescoço e mirar nos ombros.

Johnny Mercil, Instrutor da Polícia de Minneapolis, testemunhou que Chauvin não agiu de acordo com o treinamento para deter suspeitos

Não sei que tipo de postura ele improvisou, mas não é algo que ensinamos.

Katie Blackwell, Ex-diretora da Academia de Polícia de Minneapolis

O fato de manter tal nível de força em alguém que já está com o rosto contra o chão e algemado pelas costas não corresponde à nossa política, nosso treinamento e certamente também não está de acordo com nossa ética ou nossos valores. A inviolabilidade da vida deve continuar sendo um pilar de nossa ação.

Medaria Arradondo, Chefe da polícia de Minneapolis, durante o julgamento de Chavin

Agradecemos ao procurador-geral de Minnesota, Keith Ellison e sua equipe por sua intensa dedicação à justiça por George. Mas não termina aqui. Não esquecemos que os outros três oficiais que desempenharam seus próprios papéis na morte de George Floyd ainda devem ser responsabilizados por suas ações, também.

Comunicado da família de George Floyd

Ato comemora condenação de policial: "nós podemos finalmente respirar"

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